Kenneth Rogoff, ex-economista-chefe do FMI, é professor de Economia e Política Pública na Universidade de Harvard
É preciso encontrar formas de regular as Big Tech para oxigenar o setor e permitir o surgimento de concorrência e inovações
As gigantes da tecnologia - Amazon, Apple, Facebook, Google e Microsoft - terão se tornado grandes, ricas e poderosas demais para que autoridades reguladores e políticos possam controlá-las? A comunidade internacional de investidores parece crer que sim, pelo menos se considerarmos como indicadores a supervalorização das ações tecnológicas. Mas, embora isso possa soar como uma boa notícia para os oligarcas da tecnologia, se é bom para a economia ainda não está claro.
Para sermos justos, o setor de tecnologia tem sido o orgulho econômico dos Estados Unidos nas últimas décadas, uma fonte aparentemente interminável de inovação. A velocidade e o poder do mecanismo de buscas do Google é de tirar o fôlego, colocando sob nossos dedos um conhecimento extraordinário. A telefonia via internet permite que amigos, parentes e colegas de trabalho interajam face a face desde o outro lado do mundo, por um custo extremamente modesto.
E, no entanto, apesar de toda essa inovação, o ritmo do crescimento da produtividade na economia real permanece fraco. Muitos economistas descrevem a situação atual como o 'segundo movimento de Solow', referindo-se à frase do legendário economista do MIT Robert Solow: 'Pode-se ver a era da computação em tudo, menos nas estatísticas de produtividade'.
Há muitas razões para o lento crescimento da produtividade, inclusive uma década de baixos investimentos a partir da crise financeira global de 2008. Mesmo assim, é razão de preocupação que as cinco grandes firmas de tecnologia tenham se tornado tão dominantes, tão lucrativas e tão abrangentes, que se tornou difícil às startups desafiá-las, asfixiando assim a inovação. Claro, os ex-novatos Facebook e Google esmagaram Myspace e Yahoo!. Mas isso foi antes de a valorização das ações das tecnológicas terem disparado para a estratosfera, dando a esses atores uma grande vantagem de financiamento.
Graças a seus bolsos repletos, as chamadas Big Tech podem devorar ou reprimir qualquer nova empresa que ameace suas principais linhas de lucro, independentemente do quão indiretamente isso ocorra. Um jovem e intrépido empreendedor, é claro, ainda pode rejeitar uma tentativa de aquisição, mas isso é mais fácil dizer do que fazer. São poucos aqueles corajosos o suficiente (ou tolos o suficiente) para rejeitar bilhões de dólares hoje em dia na esperança de obterem um lucro maior mais tarde. E ainda há o risco de que as gigantes da tecnologia usem seus amplos exércitos de programadores para desenvolver um produto praticamente idêntico e seus aparatos legais para defendê-lo.
As grandes empresas de tecnologia podem argumentar que todo o capital que colocam em novos produtos e serviços está impulsionando a inovação. Pode-se suspeitar, no entanto, que em vários aspectos o objetivo é conter pela raiz um concorrente potencial. É notável que as Big Tech ainda obtenham o grosso de seu lucro dos produtos básicos que produzem - por exemplo, o iPhone da Apple, o Microsoft Office e o mecanismo de buscas do Google. Assim, na prática, novas tecnologias potencialmente ameaçadoras podem ser tanto alimentadas quanto enterradas.
É verdade, há casos de sucesso. A firma britânica de inteligência artificial DeepMind, comprada pela Google por US$ 400 milhões em 2014, parece estar avançando. DeepMind é famosa por desenvolver o primeiro programa de linguagem Go de sucesso, um momento decisivo, que levou as Forças Armadas chinesas a buscar um esforço total para liderar no campo da inteligência artificial. Mas, de todo modo, o DeepMind parece ser uma exceção.
O problema para os reguladores é que as estruturas convencionais antimonopólio não se aplicam num mundo onde o custo para os clientes (em boa parte na forma de dados e privacidade) não é de modo algum transparente. Porém, isso é uma frágil desculpa para não confrontar movimentações claramente anticompetitivas, como quando o Facebook adquiriu o Instagram (com sua vertiginosa e crescente rede social) ou quando a Google comprou seu rival na área de mapas, o Waze.
Talvez, a mais urgente intervenção necessária seja enfraquecer o domínio das Big Tech sobre nossos dados pessoais, um domínio que permite a Google e Facebook desenvolverem ferramentas de publicidade direcionada que estão tomando conta do negócio de marketing. Os reguladores europeus estão mostrando um caminho possível adiante, apesar de as autoridades americanas continuarem sentadas sobre o assunto. A nova Regulação de Proteção de Dados Gerais da União Europeia exige que as empresas permitam aos consumidores - ainda que apenas no bloco europeu - carregar seus dados.
Os economistas Glen Weyl e Eric Posner, em seu recente livro 'Radical Markets' ('Mercados radicais'), vão mais longe e argumentam que as Big Tech deveriam ter que pagar por nossos dados, em vez de reivindicá-los para seu próprio uso. Enquanto a prática disso continua em discussão, é evidente que os consumidores individuais deveriam ter o direito de saber quais dados pessoais estão sendo coletados e como estão sendo usados.
É claro, o Congresso e reguladores americanos precisam controlar as Big Tech em muitas outras áreas cruciais. Por exemplo, o Congresso atualmente dá às firmas de internet um verdadeiro passe livre na divulgação de fake news. A não ser que as plataformas das Big Tech sejam obrigadas a seguir os padrões que se aplicam a impressos, rádio e televisão, reportagens profundas e a verificação de dados continuarão uma arte fadada a morrer. Isto é ruim para a democracia e para a economia.
Reguladores e políticos no país das Big Tech precisam acordar. A prosperidade dos EUA sempre dependeu de sua capacidade de alavancar o crescimento econômico a partir da inovação puxada pela tecnologia. Mas, atualmente, as Big Tech são tanto parte do problema como parte da solução.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.