terça-feira, 29 de maio de 2018

Defesa nacional e garantia da lei e da ordem (Mario Cesar Flores)

Ninguém questiona o emprego das Forças Armadas no controle das fronteiras, do mar costeiro e do espaço aéreo, atividade que no Brasil tem de ser, parcial ou totalmente, da alçada militar. Tampouco na segurança de áreas críticas, em eventos do tipo Olimpíada e na solução de problema operacional além da capacidade da polícia. À margem do adjetivo “armadas”, também na defesa civil em catástrofes. O que este artigo comenta é o uso das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem, na segurança pública – no controle da ordem em favelas do Rio de Janeiro por meses, na inspeção de viaturas em estradas, e por aí vai –, atividades rotineiras tipicamente da alçada policial.

O emprego frequente das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem, embora constitucional, é um desvio da função militar básica. Tende a estimular a ideia de que em país como o Brasil, pacifista e não pressionado por problemas de defesa nacional – sem envolvimento protagônico em guerra há 150 anos (Guerra do Paraguai) –, é exatamente esse desvio de função o papel de destaque hoje no rol das atribuições das Forças. Esse tropeço cultural e o sufoco fiscal que cerceia o cumprimento dos encargos da União sugerem naturalmente as perguntas: se não temos ameaça clássica, efetiva ou ao menos verossímil, que possa exigir o emprego das Forças Armadas, por que empenhar recursos escassos em submarinos, aviões e carros de combato modernos, na defesa antiaérea...? Se o nosso problema é a criminalidade, a violência e a desordem epidêmicas, por que não direcioná-los para o preparo coerente com ele, de custo muito menor, até mesmo apoiando os Estados, em crise fiscal tão ou mais grave do que a federal, no preparo e modernização de suas polícias?

Compreensível no povo, o desvario também acontece em setores bem informados e da mídia, por convicção equivocada, mas sincera, ou porque ainda vivem o rescaldo do período autoritário – um contrassenso, já que os militares dedicados à a defesa nacional foram menos envolvidos na heterodoxia daquele período. No mundo político, as opiniões se estendem dos que veem a atuação militar na garantia da lei e da ordem como aviltamento da Federação aos que veem com simpatia a assunção de responsabilidade estadual pelo governo federal.

Não se pode menoscabar a garantia da lei e da ordem, mas enfatizá-la acima da defesa nacional é desafiar irresponsavelmente o futuro: a dinâmica da História não assegura perpetuidade à segurança sentida hoje, muito menos num mundo integrado e de interdependência crescente, com suas atribulações e conflitos de toda ordem; e Forças Armadas modernas não se constroem de um dia para o outro, seu preparo é caro, convindo estendê-lo criteriosamente no tempo. Já se foi a época em que se organizava rapidamente um Exército via mobilização e treinamento dos recrutas para o uso de armas e táticas simples.

Não há como fugir dessa realidade: nossa condução política, aquém dos desafios brasileiros (razão maior do déficit social), e nosso paradigma cultural propenso à tolerância trouxeram o Brasil ao cenário de insegurança pública dramático, que exige atuação militarpolicial expressiva e frequente na garantia da lei e da ordem. Essa atuação constitucional é heterodoxa sob a perspectiva da finalidade básica clássica das Forças Armadas e seria desnecessária se os governos estaduais tivessem preparado corretamente seus sistemas policiais – preparo material e humano, profissional e ético. A necessidade da cirurgia federal, paliativo transitório, vai continuar se repetindo enquanto persistir a fragilidade do quadro estadual.

Sem a concomitante redução de nosso dramático déficit social, o sucesso das interveniências milibares na garantia da lei e da ordem tende a ficar (tem ficado) abaixo do propalado pelo otimismo publicitário. Consequência natural: corremos o risco de queda na já cética simpatia do povo pela presença militar no seu cotidiano e de comprometimento da credibilidade das Forças Armadas – risco tanto maior quanto maior for a dimensão da intervenção. Pior ainda se em conflitos entre delinquentes e forças federais “balas perdidas” vierem a matar inocentes: elas serão imediatamente atribuídas aos militares-policiais, como vêm comumente sendo aos policiais-miltares. Esse risco existe hoje no Rio de Janeiro, onde a insegurança pública chegou ao nível apocalíptico e a intervenção vem sendo enaltecida como redentora. Ela trará com certeza algum alívio, mas será um alívio parcial e provavelmente transitório, que só terá continuidade se o Estado exercer com competência sua responsabilidade – e os municípios, no tocante às suas, basicamente sociais.

Enfim e resumindo: no Brasil de propensão cultural pacifista e hoje tumultuado por graves problemas internos de criminalidade, violência e desordem, aumenta no povo a indiferença (já grande) pela defesa nacional e a ideia da desimportância das Forças Armadas, ao menos para essa finalidade. Bastarnos-ia uma Marinha, um Exército e uma Aeronáutica com as feições de uma guarda costeira, uma guarda nacional (ou força nacional de segurança) e uma guarda nacional aérea, preparadas para as atribuições inerentes a essas instituições e para apoiar os sistemas policiais na segurança pública!

Essa cultura de indiferença pela defesa fragiliza o País no futuro incerto, na sua inserção na ordem internacional. Convém conter a presença militar na garantia da lei e da ordem nos limites da imprescindibilidade temporária. E para que a imprescindibilidade temporária não continue frequente é preciso – além de medidas sociais, fora do foco deste artigo – que os Estados preparem seus sistemas policiais em coerência com a realidade.

Federação é o modelo adequado ao Brasil, grande, complexo e heterogêneo, desde que praticada com competência e responsabilidade.

Se Estados preparassem suas polícias, ação dos militares na segurança não seria necessária

MARIO CESAR FLORES ALMIRANTE


@Brasil @política

O Brasil e a venezuelização (Marcus André Melo, Folha de São Paulo)

O colapso da democracia na Venezuela, que ostentava a mais elevada renda per capita da América Latina, é anômalo. Não há golpes ou grande retrocesso democrático em países ricos. Embora a renda alta não engendre democracia, aumenta sua resiliência onde ela já se instalou, como Przeworski e Limongi demonstraram. 

Por outro lado, Robert Dahl nos ensina que os países que transitaram para a democracia via regimes oligárquicos competitivos (ex. Inglaterra no século 19) são menos propensos a sofrer reversões: as elites políticas são socializadas em regras institucionais antes da extensão da participação política, via sufrágio universal. Quando a participação se estende a toda a população, as instituições já estão enraizadas. Não é o caso da Venezuela. 

Entre 1908 e 1935, o país foi controlado pelo caudilho Juan Gómez. Desde então, autoritarismo e nacionalismo se mesclaram de forma tóxica.

 O nacionalismo foi alimentado pelo conflito com a Inglaterra —que chegou a bombardear Caracas—, devido ao não pagamento da dívida externa, e exacerbou-se após a descoberta do petróleo no país, em 1918, com as transações feitas por Gómez com a Standard Oil que o converteram no “homem mais rico da América Latina”. 

“El Bagre” deixou 84 filhos e encarnou, como poucos na região, a “maldição dos recursos naturais”, inaugurando um ciclo de governos autoritários que durou até o pacto de Punto Fijo, em 1958. O país “pulou etapas”: não teve nem governos oligárquicos semicompetitivos (ex. República Velha) nem regimes populistas nacionalistas (Varguismo). 

O Pacto funcionou bem durante três décadas. Os dois partidos principais concordaram em alternar-se no poder e estabelecer cotas partidárias na máquina pública. 

O colapso das rendas petrolíferas, ao final dos anos 1980, e a insatisfação social com o que parecia ser um conluio oligárquico —em que pese o país ter o Gini mais baixo da região —minaram as bases do pacto. O boom de commodities reviveu o autoritarismo militarista com o coronel Chávez. Regressão à média?

Se Dahl estiver certo, as chances de venezuelização por aqui são mínimas devido ao nosso legado de pesos e contrapesos. Além do fato de que “é a tradição parlamentar, transmitida de geração a geração, desde 1823, e sempre subsistente apesar das poucas interrupções que faz o Brasil tão diferente dos vizinhos da América Latina” (Afonso Arinos). 

Esse legado, é certo, não impediu o regime militar (mas explica o fato de que aqui o Congresso permaneceu ativo). Mas essa visão otimista perde força à luz da maré populista no mundo. Mesmo sem autoritarismo aberto, populistas podem fazer grandes estragos. 


Marcus André Melo

Professor de ciência política da universidade Federal de Pernambuco.
28/5/18 Escreve às segundas

@política @Brasil

domingo, 27 de maio de 2018

Vídeo: homenagem a Senna (Violão)


ronco do motor no violão
@pop @Senna

Vídeo: Brasileiro entre os top 10 da educação básica


Esse diretor, de uma escola do interior de São Paulo, está entre os 10 finalistas que concorrem ao prêmio de melhor professor do mundo. A premiação  ocorrerá  no mês de março em Dubai.


@educação @política @Brasil

quinta-feira, 24 de maio de 2018

Paradigma Digital: 4.0 Reflexões (David Kupfer, Valor Econômico)

COLUNISTAS  Valor 14 5 18
O advento do paradigma digital tem suscitado um intenso debate. Concretizado nas noções de Manufatura Avançada ou de Indústria 4.0, no que se refere à indústria o paradigma engloba novos métodos de produção mediante os quais são promovidas a integração entre o real e o virtual por meio de sistemas ciberfísicos, a automação por meio de soluções de comunicação Máquina-Máquina e a interconexão ativa entre sistemas de gestão e rotinas de aprendizado que propicia a tomada de decisão sem intervenção humana, dentre outras aplicações. Adiante, são apresentadas quatro reflexões sobre as implicações desse novo paradigma sobre o futuro da indústria.

A primeira reflexão é sobre, afinal, qual é a essência dessa nova onda digital. A rigor, o que se está vivenciando é mais uma ramificação da trajetória de evolução das tecnologias de informação e comunicação (TICs). Essa trajetória começou com o uso pontual de recursos computacionais, por exemplo, na contabilidade ou na gestão de estoques nos sistemas de produção rígida, ditos fordistas, que tiveram seu auge nos anos 1960 e 1970.

Sobreveio então uma segunda geração digital, a exemplo do CAD-CAM, que forneceu a base técnica da produção flexível (toyotismo ou enxuta) dominante nos anos 1980, na qual o uso das TICs se disseminou por todas as atividades empresariais, mas ainda sem integração ou com integração apenas parcial entre si. Em seguida, com a explosão da indústria de software nos anos 1990, a disponibilidade de pacotes de informática extremamente poderosos deu lugar uma nova ramificação caracterizada pela integração em tempo real de todos os sistemas de produção e gestão empresariais.

Transformação digital penalizará empresas acomodadas, que não poderão recorrer mais a soluções imitativas

A atual geração digital é a da "produção conectada e inteligente". Envolve acompanhamento em tempo real de logística de fornecedores por meio de serviços Web; desenvolvimento de produtos com uso de modelagem virtual, monitoramento online do ciclo de vida de clientes etc. Assim como as ramificações anteriores, representa uma descontinuidade. Trata-se do uso de redes de comunicação, internet, computação em nuvem (Conexão) para transmitir e processar grandes massas de dados (Inteligência). Assim, se essa reflexão faz sentido, está-se diante de algo realmente novo, que não pode ser alcançado pela simples extensão ou intensificação da onda anterior.

A segunda reflexão é por que o paradigma digital deve ser considerado disruptivo? Certamente, não é por ser baseado em inovações radicais. Ao contrário, o paradigma digital está sendo portado pela emergência de uma miríade de inovações incrementais em pipeline, recém-introduzidas ou já em difusão. O paradigma digital é disruptivo porque a convergência dessas tecnologias leva a novidades que transformam as transações de mercado, redefinem relações de trabalho, contestam empresas líderes, abrem espaços para empresas entrantes, quer dizer, reestruturam os sistemas produtivos.

É, portanto, um fenômeno econômico-social mais do que científico-tecnológico. Por isso, dependendo do ponto de vista, inovações disruptivas são ameaças para empresas consolidadas e oportunidades para entrantes. Se essa segunda reflexão faz sentido, a questão central é de que lado a empresa quer - ou pode - se posicionar.

A terceira reflexão diz respeito à temporalidade da difusão do paradigma digital, isto é, quando o processo terá atingido um ponto limite a partir do qual as empresas que se mantiverem alijadas correrão risco de eliminação. Os estudos no âmbito do projeto Indústria 2027, realizado sob coordenação dos Institutos de Economia da UFRJ e da Unicamp para o IEL/CNI, sugerem que boa parte dos impactos disruptivos ainda estão por vir. No horizonte de dez anos à frente enfocado pela pesquisa são poucos os setores da indústria em que aplicações das novas tecnologias digitais já são hoje efetivamente revolucionárias.

À exceção de alguns casos, como, por exemplo, o uso de inteligência artificial na indústria de bens de capital, cujos impactos já são disruptivos hoje, na maior parte das atividades industriais as transformações deverão se manifestar mais fortemente apenas a partir da segunda metade da próxima década. Se a reflexão é válida, significa que há tempo para experimentação e seleção de estratégias eficazes de entrada no paradigma digital, fato certamente positivo ao menos para as empresas que planejam.

A implicação negativa relaciona-se à quarta reflexão. A entrada no paradigma digital está longe de ser trivial porque requer ajustes simultâneos na manufatura, na organização da produção e na gestão do negócio. Isso exige arquiteturas empresariais muito bem estruturadas, ações transversais coerentes envolvendo todas as áreas da empresa e planos de ação claros e de execução muito bem sincronizada.

São, portanto, ajustes muito específicos de cada empresa. Quer dizer, ao menos por enquanto não há "receita de bolo" para guiar as empresas nesse percurso. Se essa reflexão é correta, aqui reside o maior problema para a indústria brasileira. O estudo acima mencionado também revelou que a maioria das empresas brasileiras está em estágio muito inicial de adoção das tecnologias mais avançadas. E pior, não estão praticando qualquer ação visando progredir nessa direção.

Em síntese: a indústria brasileira está desafiada a um grande esforço de modernização tecnológica. Atitudes empresariais defensivas dificilmente serão bem-sucedidas. Porém, há tempo para planejar e construir estratégias. Mas é necessário começar imediatamente. Os aspectos idiossincráticos da transformação digital penalizarão as empresas acomodadas pois dessa vez não poderão pura e simplesmente recorrer a soluções imitativas como em outros momentos do passado.

David Kupfer é diretor do Instituto de Economia da UFRJ e pesquisador do Grupo de Indústria e Competitividade (GIC-IE/UFRJ). Escreve mensalmente às segundas-feiras. E-mail: gic@ie.ufrj.br. As opiniões aqui expressas são do autor e não da instituição.


domingo, 20 de maio de 2018

Um país de analfabetos financeiros (Ricardo Amorim)

ISTO É, 18/5/18

Em um país com tantos analfabetos funcionais, o analfabetismo financeiro não surpreende. Segundo o exame PISA realizado em 15 países, com estudantes de 15 anos, os brasileiros são os mais ignorantes em finanças. Até os peruanos estão à nossa frente. Os chineses lideram a pesquisa. Será coincidência que a renda per capita deles era apenas 6% da brasileira em 1980 e hoje é maior que a nossa?

O estudo confirma que bons alunos em leitura, matemática e ciências sabem mais sobre finanças. Países com renda per capita mais alta, melhor distribuição de renda ou um percentual maior da população com conta em bancos apresentam melhores resultados em finanças. O que chama a atenção é que os estudantes brasileiros sabem ainda menos de finanças do que estes indicadores sugeririam. Há um problema específico no ensino de finanças aqui.

Ignorância financeira não é exclusividade dos jovens. Uma pesquisa do Sebrae aponta que 77% dos empreendedores autônomos que faturam até R$ 81.000 por ano nunca fizeram um curso ou treinamento de finanças; 48% não fazem previsão de gastos, 50% ainda usam o caderno para anotar gastos, 39% não registram todas as receitas e 34% acompanham o saldo de caixa no máximo uma vez ao mês.

No Brasil, cultura cigana e química orgânica fazem parte do currículo escolar obrigatório; finanças básicas, não. Juros e porcentagem são grego para a maioria dos brasileiros.

À luz da ignorância financeira, é fácil compreender como tanta gente assume dívidas impagáveis, comprometendo seu futuro financeiro. A maioria ignora o efeito brutal dos juros compostos. Por exemplo, considerando-se juros de 400% a.a. — próximos aos praticados no cheque especial ou no cartão de crédito — uma divida de R$ 3.000 contraída para a compra de uma televisão em maio de 2015, se transformaria em R$ 15.000 um ano depois, em R$ 75.000 em dois anos, ou em R$ 375.000 hoje. Quem comprou essa TV há três anos, deve hoje um apartamento. Sabendo disso, será que tanta gente teria assumido dívidas?

Nossos políticos exploram esta ignorância financeira, levando as contas públicas ao caos em benefício próprio. Urge colocar educação financeira no currículo escolar obrigatório. As empresas têm de investir para que seus funcionários tenham melhores conhecimentos de finanças, o que é bom para suas vidas pessoais e para as próprias empresas. Individualmente, cada um precisa buscar fontes de educação financeira para si próprio, e para seus filhos.


https://istoe.com.br/um-pais-de-analfabetos-financeiros/

@economia @finanças

Vídeo: redes de robots na internet (DW)



@política @tecnologia

sábado, 19 de maio de 2018

Trump pensa como um mercantilista do século 17 (Mitsubishi UFJ Financial Group)

Trump pensa como um mercantilista do século 17, diz banco

Folha de São Paulo  9/5/18

Uma guerra comercial poderá reduzir o crescimento da economia global e, a depender da severidade da crise, levar o mundo a uma recessão. A avaliação é do MUFG (Mitsubishi UFJ Financial Group), o maior banco privado do mundo.

Uma projeção do Produto Interno Bruto mundial do ano passado cairia de uma estimativa de 3,7% para 0,4%, caso as tarifas globais tivessem um aumento médio de dez pontos percentuais para todos os produtos, primários ou manufaturados —cenário considerado “não trivial”, porém tampouco o mais pessimista possível, afirma o economista chinês Cliff Tan, chefe de pesquisa de mercado para Ásia do banco japonês.

Para ele, o presidente americano, Donald Trump, pensa como um “mercantilista do século 17” —perspectiva que ajuda a entender suas decisões, diz o economista.

“Para um mercantilista, qualquer déficit bilateral é ruim. Para Trump, olhar o déficit com a China, o México, o Canadá, é ruim. Mas se a balança comercial total do país não vai mudar, os déficits bilaterais vão apenas se transferir para outros países.”

No entanto, a projeção é que os Estados Unidos não seriam tão afetados quanto outras economias por uma guerra comercial.

“O dólar americano poderia ficar mais forte. 0 mundo é estruturado de forma que a economia americana, apesar de ter se aberto muito nos últimos anos, ainda é relativamente insular em comparação com o mundo. Ela se afeta, mas não tanto quanto outros mercados”, diz Tan.

Já a China teria um impacto bastante mais significativo: no cenário de alta de dez pontos percentuais das tarifas globais, PIB chinês desaceleraria de 6,8% para 4,5%.

A redução das taxas de crescimento seria preocupante para o país, que hoje tem de lidar com uma dívida equivalente a cerca de 300% de seu PIB.

“Se a economia chinesa de-sacelerasse em 2,5 pontos percentuais, o problema da dívida poderia até mesmo se tornar catastrófico”, afirma.

Outros países, como lapão, Canadá, México, Reino Unido e os membros da União Européia seriam ainda mais afetados e chegariam a uma recessão dentro desse cenário.

O Brasil, diz ele, tampouco deve se animar: “se entrarmos em uma guerra comercial, haverá uma recessão global. E ninguém vence em uma recessão desse gênero.”

Em relação às negociações entre Estados Unidos e China, Tan se mostra pouco otimista quanto às exigências feitas por parte do governo americano na semana passada — uma delegação liderada pelo secretário do Tesouro Steve Mnuchin entregou uma lista de demandas que incluía uma redução de US$ 200 bilhões do déficit comercial entre os países, além do fim de subsídios estatais a indústrias estratégicas na China.

Para o economista, Trump está basicamente pedindo que o presidente Xi Jinping abandone totalmente o programa “Made in China 2025” — plano estatal para promover a liderança chinesa em setores estratégicos, como energias renováveis, carros elétricos e tecnologia da informação.

“Isso mostra uma falta de entendimento completa da política chinesa. Para Xi Jinping, o plano é central para manter o partido comunista no poder”, afirma.

Brasil e mais 40 países pedem que OMC evite guerra comercial

Diogo Bercito

Madri

Em um contexto de crescente preocupação quanto à escalada da tensão entre Estados Unidos e China, um grupo de 41 países —incluindo o Brasil— apresentou um manifesto à OMC (Organização Mundial do Comércio) pedindo que essa entidade impeça uma guerra comercial.

O texto circulou por impresso na segunda (7) durante um encontro informal das delegações em Genebra, antecedendo a reunião oficial do Conselho Geral nesta terça-feira (8). Os signatários incluem Argentina, Chile, Coreia do Sul e Turquia. Poucos países europeus, com a exceção de Suíça e Islândia, participaram.

“Estamos preocupados com as crescentes tensões comerciais e com os riscos relacionados a elas para os sistemas multilaterais de troca”, diz o texto. “Encorajamos os membros da OMC a se abster de adotar medidas protecionistas e resolver as diferenças por meio de diálogo.”

O Brasil foi abordado pelos coordenadores do manifesto e avaliou que o texto refletia as preocupações do país —que se concentram principalmente nas sobretaxas impostas pelos EUA sobre o aço.

Em outras ocasiões, a OMC emitiu alertas sobre os riscos desse tipo de embate para o crescimento global. Em discurso na OMC na segunda (7), em uma manifestação individual paralela ao manifesto, o embaixador brasileiro Evandro Didonet pediu que os países-membros evitem novas fricções comerciais.


@Trump @comércio @economia internacional

quinta-feira, 17 de maio de 2018

Meu encontro (e desencontro) com Marx (Fernando Cardim, Valor Econômico)


Meu encontro com Marx deu-se, de forma esporádica e fragmentada,
quando ainda era estudante de graduação em economia na USP.
Marx não era, é claro, um autor popular na FEA/USP daqueles anos. Poucos professores pareciam ter ideia de quem se tratava. Minha leitura do primeiro volume de “O Capital” foi solitária e, provavelmente, não deve ter rendido muito. Foi no mestrado na Unicamp, onde Marx era o autor dominante em meados dos anos 70, que passei a lê-lo em detalhe. Já era atraído pela economia keynesiana, que efervescia com a emergência dos pós-keynesianos.
Por isso, embora achasse muitos dos temas tratados entediantes, fui atraído pelas discussões acerca de quem chamavam, pejorativamente, de “jovem Marx”.
A teoria da alienação era aparentada, em muitos aspectos, à discussão de incerteza e tomada de decisões em Keynes. As obras do jovem Marx, complementadas por autores brilhantes como Isaac Rubin, István Mészáros (quando jovem também), dentre outros, me interessaram. O tema desses autores é a ação humana quando as relações de produção são coisificadas e você não reconhece sua produção como resultado de sua atividade.
O agente econômico age em um ambiente que lhe é estranho, mesmo tendo sido produzido por ele.
Esse é também o quadro em que o conceito de incerteza proposto por Keynes se define, isto é, um ambiente construído, mas não reconhecido pelo indivíduo. Até onde eu saiba, no entanto, essa literatura permaneceu periférica em relação ao núcleo da reflexão marxista.
Mas havia muito na literatura marxista — especialmente, coincidência ou não, a francesa — que me parecia pouco mais do que jogos vazios de palavras que os leitores deviam considerar cápsulas de grande sabedoria. Muito tempo perdido com raciocínios circulares, com o refraseamento em termos marxistas de teorias formuladas por outras escolas. Muito esforço destinado mais a provar que a teoria era praticamente invulnerável à crítica teórica ou empírica, mesmo nas suas partes mais frágeis.
Saí de Campinas já convencido de que o desencontro com Marx não demoraria a vir.
Essa separação se deu ao fim dos anos 70, início dos 80, e foi causada por fatores de atração e de repulsão. O fator de atração é óbvio para quem conhece alguma coisa do que publiquei nos últimos quase 40 anos, o trabalho com a “e s c o l a” pós- keynesiana. Os fatores de repulsão foram vários, que sintetizaria em dois grupos principais de argumentos.
O primeiro diz respeito a uma característica do marxismo que o distingue de praticamente todas as outras escolas de pensamento social: sua natureza totalizante. Você pode ser um keynesiano, um institucionalista, até um neoclássico, sem que isso influencie sua vida para além das suas convicções econômicas (e, parcialmente, políticas).
Mas ser marxista implica o compartilhamento de visão totalizante do papel
de indivíduos numa sociedade de classes. O marxismo molda sua vida e comportamento de modo que nenhuma outra teoria social o faz. Até sua escolha de amigos é influenciada pelo fato de que você acaba procurando aqueles que compartilham sua visão de mundo. Alguns se sentem confortáveis com isso, outros nem tanto. Eu me situo no segundo grupo.
Além disso, apesar de o próprio Marx não poder ser culpado por essa distorção, ser marxista, nesses termos, cria a expectativa de que você esteja disposto, quase que por definição, a estender sua simpatia a quem quer que se declare partidário da visão.
Vejo conhecidos meus defenderem, por exemplo, genocidas como Stálin ou Mao, porque se autodefiniram como marxistas, embora a leitura, mesmo rápida, de qualquer texto de sua autoria indique intenso desconhecimento da teoria social marxista. Isso se repete com relação à Venezuela, onde um grupo de militares corruptos e incompetentes, liderados por uma figura delirante como Maduro, buscam e recebem apoio político de gente que deveria saber melhor do que se trata.
Mas o principal fator de afastamento é a visão de ciência proposta por Marx, cujas consequências são problemáticas e têm impacto negativo sobre o modo como pesquisadores marxistas tratam a informação empírica.
É famosa a afirmação de Marx de que, se essência e aparência fossem a mesma coisa, a pesquisa científica seria desnecessária.
Essa afirmação revela desconhecimento do que as ciências naturais, pelo menos, efetivamente tratam. O trabalho científico não busca identificar ou explicar “essências”, por baixo ou por trás das aparências. As ciências naturais buscam identificar padrões nos dados que se observam, naquilo que aparece. É como olhar para um tabuleiro e buscar a ordem nas peças, separando aquelas que estão ali acidentalmente. A ciência moderna não olha embaixo do tabuleiro. Ela olha o que está em cima. A informação com que lida é sempre visível, e seu problema é separar o sistemático do acidental, não a essência da aparência.
Por que isso é importante? Porque enfatiza que a explicação científica do mundo deve ser buscada na informação empírica. Se a informação que se tem à disposição for insuficiente, busque-se mais. Ainda tenho na memória a ginástica intelectual que autores faziam para preservar a validade “essencial” de “leis” como a queda tendencial da taxa de lucro ou a miséria crescente dos trabalhadores ou o desaparecimento das classes médias (que Marx definia, em sentido mais restrito, como pequena burguesia) frente à evidência empírica de que nenhuma dessas “leis” realmente resistia ao exame empírico.
Algo semelhante ocorre com o conceito-chave de classes sociais. Classes sociais realmente existentes não exibem as características esperadas por Marx. O proletariado não se comporta como proletariado, por exemplo.
Proletários são tão diversos entre si quanto o são quando comparados com outras classes sociais. Isso importa quando se lida com uma teoria que, de certa forma, prevê o fim da história quando o proletariado assumir o poder.
O fato de que proletários empiricamente existentes não se comportam como espera a teoria não levou ao reexame da teoria, mas à definição de uma “e s s ê n c i a” proletária, encarnada não por proletários, mas por ativistas de classe média, organizados em partidos que, supostamente, deveriam agir como deveriam fazer os proletários, falar por eles, pensar por eles e decidir em seu lugar. Não importa se a teoria explica o mundo real, pois, caso não explique, o que é necessário fazer é adaptar a explicação para preservá-la face a qualquer inadequação empírica.
No fim, meu encontro com Marx durou relativamente pouco. Ainda leio com prazer marxistas como Hobsbawm e outros, especialmente ingleses. Raymond Williams permanece como um dos meus favoritos, que merece releituras mais ou menos frequentes. Trabalhos do próprio Marx me interessam ainda, especialmente os que tratam de problemas como a teoria da alienação. Mas a separação já foi consumada há algum tempo.


Fernando J. Cardim de Carvalho é professor emérito da UFRJ e “senior research scholar” do Levy Economics Institute, Bard College



http://www.valor.com.br/cultura/5486601/meu-encontro-e-desencontro-com-marx

@economia @marx

terça-feira, 15 de maio de 2018

Lição de Vida: Alexander Fleming

Um pobre fazendeiro escocês, enquanto tentava ganhar a vida para sua família, ouviu um grito de socorro vindo de um pântano próximo.

Ele largou as ferramentas e correu para o pântano.

Lá, ele encontrou um menino até a cintura no estrume negro e úmido, gritando e lutando para se libertar.

O agricultor salvou o menino do que poderia ser uma morte lenta e terrível.

No dia seguinte, uma carruagem elegante chegou à fazenda. Um nobre, elegantemente vestido, saiu e se apresentou como o pai do menino que o fazendeiro ajudou.

 "Eu quero recompensá-lo", disse o nobre.

"Você salvou a vida do meu filho."

Não, não posso aceitar um pagamento pelo que fiz ", respondeu o agricultor escocês.

Naquele instante, o filho do fazendeiro chegou à porta da cabana.

"É seu filho?" perguntou o nobre.

"Sim", o fazendeiro respondeu com orgulho.

- Eu proponho fazer um acordo. Permita-me fornecer a seu filho o mesmo nível de educação que meu filho irá gozar. Se o menino se parece com o pai, não duvido que ele cresça para se tornar o homem de que nós dois nos orgulharemos.

E o fazendeiro aceitou.

O filho do fazendeiro cursou as melhores escolas e com o tempo, formou-se pela Faculdade de Medicina do Hospital St. Mary, em Londres, ele passou a se tornar conhecido em todo o mundo como o renomado Dr. Alexander Fleming, o descobridor da penicilina.

Anos depois, o filho do mesmo nobre que foi salvo do pântano adoeceu com pneumonia ...

O que salvou sua vida dessa vez? ....

Penicilina!

E você sabe qual era o nome do nobre?

Sir Randolph Churchill.

E o nome do filho dele? !

 Sir Winston Churchill !!!

BONITA HISTÓRIA, PORÉM FAKE:

https://www.snopes.com/fact-check/what-goes-around/

@filosofia

sexta-feira, 11 de maio de 2018

As lições que a decadência da cidade de Troia pode dar à economia do século 21

Image caption Para pesquisador, a história de Troia nos lembra que toda civilização corre o risco de desmoronar

O enredo da decadência e queda da cidade de Troia nas mãos de um vingativo exército grego vem sendo contado há pelo menos três mil anos - ainda assim, essa é uma história que fala sobre um colapso global muito maior, com lições úteis inclusive para este século 21.

Em 1.300 a.C., no auge da Idade do Bronze, as grandes potências do Egito, do povo hitita (na área que corresponde hoje à região central da Turquia), os gregos, os babilônios e diversas cidades do Oriente Médio pareciam impenetráveis para qualquer um dos mercadores que navegassem pelo Mediterrâneo, uma rota de comércio importante da época.

O mesmo valia para a cidade murada de Troia, na costa da atual Turquia, na ponta do estreito de Dardanelos. Navios que tinham como destino o Mar Negro e o Mar de Mármara com frequência eram forçados a esperar nos portos troianos até que as condições do vento permitissem seguir viagem - localização privilegiada da qual a cidade tirava proveito, cobrando pelo deslocamento das embarcações pelo canal.


Direito de imagem Getty Images
Image caption No auge da Idade do Bronze, Troia conseguia usar sua localização provilegiada para taxar navios que iam do Mediterrâneo ao Mar Negro

Apenas cem anos depois, no entanto, por volta de 1.170 a.C., quase todas essas civilizações haviam entrado em colapso. Na era sombria que se iniciou naquele período, até a arte da escrita se perdeu.

Na mitologia grega, a história da queda de Troia foi contada em duas narrativas épicas - a Ilíada e a Odisséia -, tradicionalmente atribuídas ao poeta Homero, que as teria escrito 400 anos depois dos acontecimentos.

"Ele não estava escrevendo História, mas é evidente que Troia era um lugar fortificado e importante", diz J. Lesley Fitton, encarregado do departamento de Grécia e Roma no Museu Britânico, em Londres.
Mundo conectado

A Idade do Bronze é caracterizada pela presença de grandes Estados que interagiam entre si e eram parcialmente dependentes uns dos outros - organização similar à do mundo atual, marcado por economias interligadas pelos mercados financeiros, cadeias globais de valor e processos de produção orientados pela demanda, conhecidos como "just in time".

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Image caption O estreito de Dardanelos é até hoje um corredor imprescindível para o comércio global


A commodity-chave desse período foi o bronze, uma liga metálica formada por cobre e estanho que se tornaria extremamente importante para as civilizações que queriam construir grandes exércitos.

O cobre vinha da ilha mediterrânea de Chipre, mas o estanho viajava 4 mil km do Afeganistão, transportado por terra através da Síria e depois por navios ao longo da costa - e era tão valioso quanto o petróleo é hoje.

Carol Bell, da Universidade College London, afirma que obter estanho suficiente para produzir armas à base de cobre dominava o pensamento de governantes da época "da mesma forma que o fornecimento de gasolina a preços acessíveis para os americanos que dirigem SUVs (veículos utilitários esportivos) ocupa a mente do presidente dos Estados Unidos hoje".
Vulnerabilidade comercial

Mesmo no século 21, estamos vulneráveis a interrupções na corrente global de comércio.

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Image caption Navios iranianos no estreito de Hormuz: um quinto do fornecimento global de petróleo passa por aqui


Em 2012, os preços internacionais de petróleo tiveram um pico quando o Irã ameaçou fechar o estreito de Hormuz, através do qual 20% do fornecimento global da commodity transita. O Irã afirmou na ocasião que a medida causaria um choque nos mercados com o qual "nenhum país" conseguiria lidar.

No ano passado, um relatório do think tank (centro de pesquisas e debates) Chatman House advertiu os governos de que era preciso tomar medidas mais eficientes para proteger "pontos de estrangulamento" das rotas comerciais. O documento afirmava que os Estreitos Turcos - Bósforo e Dardanelos - eram "particulamente críticos para o trigo, já que um quinto das exportações globais do produto passam por eles todos os anos".

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Image caption As economias da Idade do Bronze eram dependentes de embarcações como essas para transportar artigos de luxo, vidro, estanho e cobre

"Uma ou mais interrupções desses pontos de estrangulamento poderiam levar a uma queda na oferta e aumentos súbitos de preços, com consequências sistêmicas que poderiam ir além do mercado de alimentos", acrescenta.

Na Idade do Bronze, não era preciso muito para que o caos econômico fosse instaurado. "Pequenas e esparsas interrupções ou problemas ambientais", exemplifica Andrew Shapland, curador de Idade do Bronze grega no Museu Britânico.
Mudanças climáticas

Assim como agora, as mudanças climáticas eram fatores-chave naquela época. "Sabemos que elas eram responsáveis por períodos de fome", afirma Eric Cline, professor de arqueologia na Universidade George Washington, em Washington.

De fato, análises polínicas e de isótopos de oxigênio mostram que o período foi marcado por 300 anos de longas secas. As temperaturas no Mediterrâneo caíram de forma expressiva, reduzindo os níveis pluviométricos e, por consequência, afetando as lavouras.


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Image caption Knossos, na ilha de Creta: economias baseadas em grandes Estados podiam ser bastante vulneráveis

As civilizações da Idade do Bronze sofreram o impacto de uma série de eventos. Não apenas secas prolongadas e fome, mas diversas erupções vulcânicas, terremotos, instabilidade social, migrações de refugiados, interrupções no comércio e guerras.

"Se só uma coisa acontece, você consegue sobreviver. A diferença no fim da Idade do Bronze foi o que chamamos de 'tempestade perfeita'. Com um, dois, três ou quatro eventos você está diante de efeitos multiplicadores - não se consegue sobreviver", ressalta o professor Cline.

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Image caption Em 2011, o tsunami e o terremoto em Fukushima afetaram a rede global de TI e a cadeira de fornecimento de peças de computador


Nosso mundo hoje pode ser mais resiliente, mas mesmo atualmente os terremotos têm força para gerar caos econômico. Quando o Japão foi atingido em 2011 pelo terremoto e tsunami que destruíram Fukushima, o impacto econômico do desastre se fez sentir em praticamente todo o continente asiático.
Múltiplos impactos

Por volta de 1.250 a.C., os problemas se acumulavam. Uma rainha hitita chegou a pedir ajuda ao Egito, argumentando que não tinha "qualquer grão" em suas terras. Um mercador sírio suplicou: "há fome em nossas casas, se vocês não chegarem rapidamente, nós todos morreremos".


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Image caption Sofrendo com a fome, os hititas pediram ajuda ao Egito

Para ajudar a aliviar a situação, os egípcios começaram a enviar remessas de alimentos para os vizinhos.

Mesmo nesse período, os governos tinham interesse em promover programas de ajuda internacional. Um faraó vangloriou-se por ter transportado grãos em navios "para manter viva a terra dos hititas".

A cooperação internacional, contudo, não foi suficiente.

Se a população que vivia no entorno dos palácios se voltou contra seus governantes porque não tinham acesso a comida ou porque não encontravam emprego é algo que ainda não está claro. Mas o fracasso das colheitas - e da economia - catalisou uma onda de guerras civis e de migrações em massa de refugiados.
Homero: verdade ou ficção?

Na narrativa de Homero, o romance entre o príncipe troiano Paris e a rainha dos gregos, Helena, é o pivô da guerra lendária entre os dois povos.

De fato, registros contemporâneos das terras vizinhas, à época habitadas pelos hititas, confirmam que a Grécia protagonizou "algumas campanhas militares na costa oeste na Anatólia (península que compreende parte da atual Turquia)", diz Spyros Bakas, da Koryvantes Association for Historical Studies, organização cultural dedicada a pesquisar a herança militar helênica da Idade do Bronze até o período Bizantino.

Os documentos relatam inclusive uma ocasião em que um governante grego "conduzia 100 carruagens e uma infantaria contra um príncipe hitita".

Os dois povos - os gregos e os hititas - certamente entraram em conflito por causa de Troia, que tinha língua e religião próprias, mas que chegou a ser aliada dos hititas. Em determinado momento, a família real de Troia foi deposta - e há, nesse sentido, uma carta dos hititas a um rei da Grécia sobre um acordo de paz em relação a Troia.

Nada disso prova a precisão da história contada por Homero, mas "Troia era claramente um lugar com capacidade para acumular grande riqueza, logo, sempre atrairia a atenção de saqueadores", destaca J Lesley Fitton.
Saqueamento de cidades

Historiadores afirmam que Troia foi seguramente saqueada por volta de 1.200 a.C., apesar de não haver indícios em documentos da região ou mesmo na Grécia (os registros gregos se resumiam a listas administrativas) para esclarecer o que aconteceu. Na região da atual Síria, contudo, é possível encontrar as vozes das vítimas de uma catástrofe ainda maior.

O governante de Ugarit, pego no contrapé por eventos inesperados, pediu ajuda dizendo: "Todas as minhas tropas e carruagens estão nas terras dos hititas e todos os meus navios, na terra dos lícios. Assim, a cidade está abandonada a si mesma".

Seu apelo parece ter ecoado no vazio; talvez seus vizinhos também estivessem passando por momentos difíceis. Se algum auxílio chegou, veio tarde demais, de acordo com um dos últimos documentos encontrados em Ugarit.

"Quando sua mensagem chegou, o exército havia sido subjugado e a cidade, saqueada. A comida que estava sobre a eira (espaço onde os cereais eram debulhados e limpos) foi queimada e os vinhedos foram destruídos."

"Nossa cidade foi saqueada. Que vocês saibam! Que vocês saibam!"

Aqueles que sobreviveram provavelmente foram vendidos como escravos ou engrossaram as fileiras de refugiados e de foras da lei que cresciam à medida que as civilizações da época entravam em decadência.
Culpando imigrantes

Os egípcios tinham uma resposta simples para o colapso de Estados durante a Idade do Bronze: a culpa era dos mais variados grupos que povoavam as margens do Mediterrâneo, a quem eles chamavam de "povos do mar".

"Os povos estrangeiros fizeram uma conspiração. De uma vez só, as terras foram separadas e espalhadas durante o combate. Nenhuma região resistia diante de suas armas", diz uma inscrição egípcia.

Image caption Graças ao rio Nilo, o Egito estava melhor preparado para períodos de seca | Foto: Tim Bowler

O Egito parece ter tido tempo, contudo, de se defender, e seu exército conseguiu derrotar os "povos do mar", diz o professor Cline, que cita a frase atribuída ao faraó Ramsés 3º: "Derrubei aqueles que nos invadiram... Ficaram como aqueles que não existem".

Andrew Shapland adverte que é preciso ter cuidado para interpretar as declarações de líderes dessa época: "Ramsés estava fazendo dos imigrantes os agressores".

"E se ele estivesse agindo como qualquer político conservador hoje em dia - buscando algum fator externo e culpando-o pelos problemas econômicos?"
Vitória de Pirro

Se os gregos realmente derrotaram os troianos, a sensação de vitória durou pouco. Muitos de seus palácios foram pouco tempo depois destruídos ou abandonados; os hititas, as cidades-estado sírias, os assírios e os babilônios também entraram em declínio. Apenas o Egito sobreviveu.

Diferentemente dos líderes da Idade do Bronze, que poderiam apenas rezar para o deus da tempestade para lhe pedir chuva se as colheitas fracassassem, nós estamos hoje muito mais conscientes dos problemas globais e temos muito mais recursos técnicos para lidar com eles, diz o professor Cline.

Mas a obra de Homero é uma história exemplar, ele argumenta.

"Toda civilização do mundo acabou por desmoronar. Seria de uma autoconfiança excessiva achar que a nossa é a única civilização que irá sobreviver."




http://www.bbc.com/portuguese/geral-43039176

@economia @história

quarta-feira, 9 de maio de 2018

Não sabemos o que ensinar aos jovens pela primeira vez na História (Yuval Harari)

Obama, Bill Gates e Mark Zuckerberg ficaram fascinados com o livro 'Sapiens' de Yuval Noah Harari. O historiador dá a sua primeira entrevista para Portugal aquando do seu novo trabalho: Homo Deus

O livro anterior de Yuval Harari, Sapiens: Uma Breve História da Humanidade, foi um sucesso mundial, tanto assim que o então Presidente Barack Obama disse que era o seu livro de mesa de cabeceira, Bill Gates repetiu, Mark Zuckerberg colocou-o no seu clube de leitura online e o Youtube encheu-se de vídeos das suas aulas. Em Portugal, o historiador israelita não passou despercebido e alguns milhares já leram as quatro edições do antecessor de Homo Deus - História Breve do Amanhã (editora Elsinore), o seu mais recente trabalho de investigação lançado seis anos após o primeiro.
Em quase 500 páginas, o professor do departamento de História da Universidade Hebraica de Jerusalém faz uma análise da evolução do Homem que se segue e questiona quais poderão ser os passos de gigante dos habitantes da Terra. Uma antevisão pouco agradável, onde a Inteligência Artificial e a biogenética destituirão em breve as regras que gerem as sociedades atuais. Nesta entrevista ao DN, a primeira para Portugal, Yuval Harari explica como os netos dos nossos netos só serão em parte humanos, que será o algoritmo a decidir os empréstimos de um banco, que as reivindicações dos excluídos serão ignoradas e que o que hoje se ensina nas escolas e universidades de pouco servirá dentro de no máximo duas décadas. Não pretende que seja uma perceção catastrófica, antes o resultado da evolução da tecnologia ao nosso dispor no século XXI e que será impossível de travar. Harari tornou-se uma celebridade mundial, gay, vive com o marido numa comunidade israelita, vegan e recusa-se a usar um smarthphone.


Olho para o seu livro e imagino o autor como um drone dotado de inteligência artificial a sobrevoar o planeta Terra. Revê-se nesta imagem?

Até certo ponto. Eu tento ser realmente como um drone que voa a grande altitude e observa tudo o que acontece na Terra sem tomar partidos. No entanto, ao contrário de um drone ou de uma inteligência artificial, eu não me foco apenas nos acontecimentos materiais. Tento compreender como as pessoas se sentem e dou um lugar central no meu livro às questões éticas e filosóficas. Não vale a pena escrever História se nos esquecermos da dimensão ética.

Começa o livro com uma grande pergunta: "Estamos a controlar a fome, as epidemias e a guerra. O que irá substituí-las?" Qual é o seu prognóstico?

No séc. XXI a principal ambição humana não será meramente o controlo da fome, das epidemias e da guerra, mas sim a de transformar os humanos em deuses. E digo isto no sentido literal. Os seres humanos esforçar-se-ão por adquirir capacidades que foram inicialmente pensadas como capacidades divinas. Em particular, a capacidade de manipular e criar vida. Assim como na Bíblia Deus criou animais, plantas e seres humanos de acordo com os seus desejos, também no séc. XXI iremos provavelmente aprender como projetar e fabricar animais e plantas e, até, seres humanos segundo os nosso desejos. Iremos usar a engenharia genética para criar novos tipos de seres orgânicos; usaremos interfaces diretas cérebro-computador com o objetivo de criar ciborgues (seres que combinam partes orgânicas com partes inorgânicas); e podemos até conseguir criar seres completamente inorgânicos. Os principais produtos da economia do séc. XXI não serão têxteis, veículos e armas, mas sim corpos, cérebros e mentes. Foi por isso que dei ao livro o título de Homo Deus (homem-deus).

Ao comentar o estado atual da humanidade diz: "Vejamos o que o dia de hoje nos reserva". Esta é uma questão para o mundo inteiro ou apenas para os menos afortunados?

Em 2010, a fome e a desnutrição combinadas mataram cerca de um milhão de pessoas, enquanto a obesidade matou três milhões

Ainda há milhares de milhões de pessoas pobres no mundo que sofrem de desnutrição e doenças, mas as fomes em massa estão a tornar-se raras. No passado, de tantos em tantos anos havia secas ou inundações, ou outro tipo qualquer de catástrofe natural, a produção de alimentos caía a pique e milhões de pessoas morriam à fome. Atualmente, a humanidade produz tanta comida e consegue transportá-la tão rapidamente e de forma tão barata que os desastres naturais nunca resultam, por si próprios, em fome em massa. Já não existe fome natural no mundo, há apenas fome de origem política. Se as pessoas ainda morrem de fome na Síria, no Sudão ou na Coreia do Norte é apenas porque alguns governos assim o desejam.

Vejamos a China, por exemplo. Há poucas décadas a China era ainda um paradigma de escassez de alimentos. Dezenas de milhões de chineses morreram de fome durante o Grande Salto em Frente e os especialistas previam rotineiramente que o problema só iria piorar. Em 1974 teve lugar em Roma a primeira Conferência Mundial da Alimentação e os delegados foram presentados com cenários apocalíticos. Foi-lhes dito que a China nunca conseguiria alimentar os seus mil milhões de pessoas e que o país mais populoso do mundo estava a caminho da catástrofe. Na verdade estava a caminho do maior milagre económico da história. Desde 1974 centenas de milhões de chineses saíram da pobreza e apesar de haver ainda centenas de milhões que sofrem muitíssimo de privações e desnutrição, a China está pela primeira vez nos seus registos históricos livre da fome.

De facto, na maioria dos países, hoje, comer demais tornou-se um problema muito pior do que a fome. No século XVIII, Maria Antonieta supostamente aconselhou as massas famintas a que, se ficassem sem pão, comessem bolos. Hoje, os pobres seguem este conselho à letra. Enquanto os habitantes ricos de Beverly Hills comem salada de alface e tofu cozido a vapor com quinoa, nos bairros da lata e guetos os pobres engolem bolos industriais, pacotes de aperitivos salgados, hambúrgueres e pizzas. Em 2014, mais de 2100 milhões de pessoas tinham excesso de peso, contra 850 milhões que sofriam de desnutrição. Calcula-se que em 2030 metade da humanidade sofra de excesso de peso. Em 2010, a fome e a desnutrição combinadas mataram cerca de um milhão de pessoas, enquanto a obesidade matou três milhões.

Afirma que as guerras estão a diminuir. Quando vê o Presidente Trump atirar uma super-bomba sobre o Afeganistão sente vontade de alterar o texto do livro?

Eu não disse que as guerras iriam inevitavelmente desaparecer. O que eu disse foi que nós transformámos as guerras de uma catástrofe inevitável além do controlo humano numa ameaça gerível. No passado, os seres humanos pensavam que as guerras eram uma parte natural do mundo e somente Deus poderia trazer a paz à Terra. Mas ao longo das últimas décadas, os seres humanos descobriram que têm o poder de trazer a paz à Terra por si mesmos, se tomarem as decisões certas.

Ainda há guerras em algumas partes do mundo, eu vivo em Israel por isso sei muito bem disso. Mas grandes partes do mundo estão completamente livres da guerra e muitos estados deixaram de usar a guerra como um instrumento padrão para promover os seus interesses. Nas sociedades agrícolas antigas, cerca de 15% de todas as mortes eram causadas pela violência humana. Hoje, em todo o mundo, as mortes causadas pela violência humana são menos de 1,5%. De facto, o número de suicídios é hoje maior do que o número de mortes violentas! São maiores as hipóteses de se morrer por suicídio do que de se ser morto por um qualquer soldado inimigo, um terrorista ou um criminoso. Da mesma forma, o número de pessoas que morrem por obesidade e doenças relacionadas é muito mais elevado do que o número de pessoas mortas por violência humana. O açúcar é hoje mais perigoso do que a pólvora.

O que originou esta nova era de paz? Existem duas causas principais. Em primeiro lugar, as armas nucleares transformaram a guerra entre superpotências em suicídio coletivo. Assim, as superpotências tiveram que mudar completamente o sistema internacional e encontrar maneiras de resolver conflitos sem grandes guerras. Em segundo lugar, as mudanças económicas transformaram o conhecimento no principal ativo económico. Anteriormente, a riqueza era principalmente riqueza material: campos de trigo, minas de ouro, escravos, gado. Isso encorajava a guerra, porque era relativamente fácil conquistar riqueza material através da guerra. Hoje, a riqueza está cada vez mais baseada no conhecimento. E não se pode conquistar o conhecimento através da guerra. Não se pode, por exemplo, conquistar a riqueza de Silicon Valley através da guerra, porque não há minas de silício no Vale do Silício - a riqueza vem do conhecimento dos engenheiros e técnicos. Consequentemente, hoje, a maioria das guerras está restrita àquelas partes do mundo - como o Médio Oriente - onde a riqueza é a riqueza material antiquada (principalmente campos de petróleo).

Foi fácil integrar a afirmação constante do terrorismo neste seu exame?

O terrorismo é em grande parte teatro. Os terroristas encenam um espetáculo de violência aterrorizador que domina a nossa imaginação e nos faz sentir como se estivéssemos a resvalar de novo para o caos medieval. Consequentemente os estados sentem-se muitas vezes obrigados a reagir ao teatro do terrorismo com um espetáculo de segurança, orquestrando enormes exibições de força, como a perseguição de populações inteiras ou a invasão de países estrangeiros. Na maior parte dos casos, essa reação exagerada ao terrorismo representa uma ameaça muito maior à nossa segurança do que os próprios terroristas.

Os terroristas são como uma mosca que tenta destruir uma loja de porcelanas. A mosca é tão fraca que não consegue mover nem uma chávena de chá. Assim, encontra um touro, entra para dentro do seu ouvido e começa a zumbir. O touro fica louco de medo e fúria e destrói a loja de porcelanas. Foi o que aconteceu no Médio Oriente na última década. Os fundamentalistas islâmicos nunca conseguiriam ter derrubado Saddam Hussein sozinhos. Em vez disso, eles enfureceram os EUA com os atentados de 11 de setembro e os EUA destruíram a loja de porcelanas do Médio Oriente por eles. Agora eles florescem nos destroços. Portanto, na verdade, o sucesso ou o fracasso do terrorismo dependem de nós. Se permitirmos que os terroristas dominem a nossa imaginação e, depois, reagirmos exageradamente aos nossos próprios medos, o terrorismo terá êxito. Se libertarmos a nossa imaginação dos terroristas e reagirmos de forma equilibrada e calma, o terrorismo fracassará.

No subcapítulo O Direito à Felicidade considera que este é o segundo grande projeto na agenda da humanidade. Mas, como dizia Epicuro, esta busca não continua a conduzir à infelicidade?

Sim, até agora a busca da humanidade pela felicidade não foi muito bem-sucedida. Nós somos hoje muito mais poderosos do que alguma vez fomos e a nossa vida é certamente mais confortável do que no passado, mas é duvidoso que sejamos muito mais felizes do que os nossos antepassados. Os americanos médios têm um carro, um telemóvel, um frigorífico cheio de comida e um armário cheio de medicamentos, coisas com que os seus antepassados dificilmente poderiam sonhar. No entanto, os americanos estão tão irritados e insatisfeitos com a sua situação, que elegeram Donald Trump como seu presidente. Aparentemente, não é fácil traduzir o poder em felicidade.

Uma explicação é que a felicidade depende menos de condições objetivas e mais das nossas próprias expectativas. As expectativas, no entanto, tendem a adaptar-se às condições. Quando as coisas melhoram, as expectativas aumentam e, consequentemente, mesmo melhorias drásticas nas condições podem deixar-nos tão insatisfeitos como antes.

 Ainda teremos netos, mas não tenho muita certeza de que os nossos netos terão netos. Pelo menos não humanos

Eu valorizo muito Marx. Até certo ponto, todos nós somos marxistas hoje. Podemos não aceitar o programa político de Marx, mas mesmo os capitalistas mais radicais analisam a história e a política usando o pensamento marxista. Por exemplo, quando tentamos entender a ascensão de Donald Trump, geralmente pensamos que as mudanças económicas, como a crescente desigualdade entre a classe operária americana e a classe alta, levam a convulsões políticas. Essa é uma análise marxista.

No entanto, no séc. XXI as teorias marxistas estão a perder relevância. O marxismo assume que a classe trabalhadora é vital para a economia e os pensadores marxistas tentaram ensinar ao proletariado como traduzir o seu imenso poder económico em força política. Esses ensinamentos podem tornar-se completamente irrelevantes no séc. XXI, pois a IA e os robôs substituem os seres humanos em mais e mais empregos e as massas perdem o seu valor económico. Na verdade, pode haver quem argumente que o brexit e Trump já demonstram uma trajetória oposta à que Marx imaginava. Em 2016, os britânicos e os americanos que perderam a sua utilidade económica, mas que ainda conservam o poder político, usaram esse poder para se revoltarem antes que seja tarde demais. Eles não se revoltam contra uma elite económica que os explora, mas contra uma elite económica que já não precisa deles.

Preocupa-o a certeza de que nos vamos confrontar em breve com uma raça de super-homens, o seu Homo Deus?

Sim, existe o perigo de a humanidade se dividir em castas biológicas. À medida que a biotecnologia se for desenvolvendo será possível prolongar o tempo da vida humana e melhorar as capacidades humanas, mas os novos tratamentos maravilha podem ser caros e podem não estar disponíveis gratuitamente para todos os milhares de milhões de seres humanos. Assim, a sociedade humana no séc. XXI pode ser a mais desigual da História. Pela primeira vez na História, a desigualdade económica será traduzida em desigualdade biológica. Pela primeira vez na História, as classes superiores não serão apenas mais ricas do que o resto da humanidade, mas também viverão muito mais tempo e terão muito mais talento.

A ascensão da inteligência artificial pode exacerbar este problema. Dentro de algumas décadas, a IA pode tornar a maioria de seres humanos inúteis. Estamos agora a desenvolver software para computadores e IA que superam os seres humanos em cada vez mais tarefas, desde conduzir carros até diagnosticar doenças. Como resultado, os especialistas calculam que dentro de algumas décadas, não serão só os empregos de taxistas e médicos, mas cerca de 50% de todos os postos de trabalho nas economias avançadas serão ocupados por computadores.

Podem aparecer muitos novos tipos de empregos, mas isso não irá necessariamente resolver o problema. Os seres humanos têm basicamente apenas dois tipos de capacidades - físicas e cognitivas - e se os computadores nos superarem em ambas, eles podem superar-nos nos novos empregos tal como o fizeram nos antigos. Então, qual será a utilidade de seres humanos nesse mundo? O que faremos com milhares de milhões de seres humanos economicamente inúteis? Não sabemos. Não temos qualquer modelo económico para tal situação. Esta pode ser a maior questão económica e política do século XXI.

Além disso, à medida que os algoritmos expulsam os seres humanos do mercado de trabalho, a riqueza pode concentrar-se nas mãos da pequena elite que possui os algoritmos todo-poderosos, criando desigualdades sociais e políticas sem precedentes. Hoje, milhões de motoristas de táxi, de autocarros e de camiões têm um peso económico e político significativo, cada um comandando uma pequena parcela do mercado de transportes. Se o governo faz alguma coisa de que não gostem, eles podem sindicalizar-se e entrar em greve. No futuro, todo esse poder económico e político pode ser monopolizado por alguns bilionários que possuem as empresas que detêm os algoritmos que dirigem todos os veículos.

O Homo sapiens foi apenas mais uma etapa da evolução do Homem e deixou de ser a referência?

Nós somos provavelmente uma das últimas gerações de Homo sapiens. Ainda teremos netos, mas não tenho muita certeza de que os nossos netos terão netos. Pelo menos não humanos. No próximo século ou dois, os seres humanos ou se destroem a eles mesmos ou evoluem para algo completamente diferente. Algo que será mais diferente de nós do que nós somos diferentes dos neandertais ou dos chimpanzés.

[citacao O algoritmo discrimina-o não porque você é mulher ou homossexual ou negro, mas porque você é você. Há algo específico sobre si de que o algoritmo não gosta]

Elege o algoritmo como um fator de discriminação. Como podem os mais fracos defenderem-se?

Ao reunir dados e poder de computação suficientes, empresas e governos poderão criar rapidamente algoritmos que me conhecem melhor do que eu próprio, e então a autoridade deslocar-se-á de mim para o algoritmo. O algoritmo poderá entender os meus desejos, prever as minhas decisões e fazer melhores escolhas em meu nome. Tais algoritmos contêm um grande potencial, mas também um grande perigo. À medida que os algoritmos nos começam a conhecer tão bem, os governos ditatoriais poderão obter um controlo absoluto sobre os seus cidadãos, ainda mais do que na Alemanha nazi, e a resistência a tais ditaduras poderá ser totalmente impossível. Mesmo em países democráticos, as pessoas podem tornar-se vítimas de novos tipos de opressão e discriminação. Hoje em dia, cada vez mais bancos, empresas e instituições estão a usar algoritmos para analisar dados e tomar decisões sobre nós. Quando pedimos um empréstimo a um banco é mais provável que o nosso pedido seja processado por um algoritmo de que por um ser humano. O algoritmo analisa muitos dados sobre nós e estatísticas sobre milhões de outras pessoas, e decide se somos suficientemente confiáveis para nos conceder um empréstimo. Muitas vezes, o algoritmo faz um trabalho melhor do que um banqueiro humano. Mas o problema é que, se o algoritmo discriminar algumas pessoas injustamente, é difícil saber isso. Se o banco se recusar a dar-nos um empréstimo e perguntarmos "porque não?", o banco responde "o algoritmo disse que não". Se perguntarmos "por que motivo o algoritmo disse que não?", o banco responde, "Nós não sabemos. Nenhum ser humano entende este algoritmo, porque é baseado na aprendizagem avançada da máquina. Mas nós confiamos no nosso algoritmo, por isso não lhe concederemos um empréstimo".

No passado, as pessoas discriminavam grupos inteiros como mulheres, homossexuais e negros. Assim, as mulheres, os homossexuais ou os negros, podiam organizar-se e protestar contra a sua discriminação coletiva. Mas agora o algoritmo pode discriminá-lo a si, e você não faz ideia da razão. Talvez o algoritmo tenha encontrado alguma coisa no seu ADN ou na sua história pessoal que não lhe agrada. O algoritmo discrimina-o não porque você é mulher ou homossexual ou negro, mas porque você é você. Há algo específico sobre si de que o algoritmo não gosta. Você não sabe o que é, e mesmo que soubesse, não se pode organizar com outras pessoas para protestar, porque não há outras pessoas. É apenas você. Em vez da discriminação coletiva como no século XX, talvez no século XXI tenhamos um grande problema de discriminação individual.

Quando aponta o Dataísmo como a próxima religião não está a ir longe de mais? Falando de religião, esta tem um prazo de validade?

Primeiro, devemos entender o que é a religião. A religião não é a crença em deuses. Em vez disso, a religião é qualquer sistema de normas e valores humanos que se baseia na crença em leis sobre-humanas. A religião diz-nos que devemos obedecer a certas leis que não foram inventadas pelos seres humanos e que os seres humanos não podem mudar à sua vontade. Algumas religiões, como o islão, o cristianismo e o hinduísmo, acreditam que essas leis sobre-humanas foram criadas pelos deuses. Outras religiões, como o budismo, o capitalismo e o nazismo, acreditam que essas leis sobre-humanas são leis naturais. Assim, os budistas acreditam nas leis naturais do carma, os nazis argumentaram que a sua ideologia refletia as leis da seleção natural, e os capitalistas acreditam que seguem as leis naturais da economia.

Não importa se acreditam em leis divinas ou em leis naturais, todas as religiões têm exatamente a mesma função: dar legitimidade às normas e valores humanos e dar estabilidade às instituições humanas, como estados e empresas. Sem algum tipo de religião é simplesmente impossível manter a ordem social. Durante a era moderna, as religiões que acreditam nas leis divinas entraram em declínio. Mas as religiões que acreditam nas leis naturais tornaram-se cada vez mais poderosas. No futuro, é provável que se tornem mais poderosos ainda. Silicon Valley, por exemplo, é hoje uma incubadora de novas tecno-religiões. Eles prometem todos os velhos prémios religiosos - felicidade, paz, prosperidade e vida eterna - mas aqui na terra com a ajuda da tecnologia e não depois da morte com a ajuda de seres sobrenaturais.

O seu livro anterior foi amplamente reconhecido. Alguém aprendeu a lição?

Não estou certo de que o objetivo do estudo da História seja aprender lições práticas. Na minha opinião, devemos estudar a História não para aprender com o passado, mas para nos libertarmos dele. Cada um de nós nasce num mundo particular, governado por um sistema particular de normas e valores, e uma determinada ordem económica e política. Como nascemos nele, tomamos a realidade circundante como natural e inevitável, e tendemos a pensar que a maneira como as pessoas hoje vivem as suas vidas é a única possível. Raramente nos damos conta de que o mundo que conhecemos é o resultado acidental de acontecimentos históricos aleatórios que condicionam não só a nossa tecnologia, política e economia, mas até mesmo a maneira como pensamos e sonhamos. É assim que o passado nos agarra pela parte de trás da cabeça, e vira o nosso olhar para um único futuro possível. Sentimos o aperto do passado desde que nascemos, por isso nem sequer nos apercebemos dele. O estudo da História visa reduzir esse aperto e permitir-nos virar a nossa cabeça mais livremente, pensar de maneira diferente e ver muitos mais futuros possíveis.

Se não conhecermos a História, facilmente confundimos os seus acidentes com a nossa verdadeira essência. Por exemplo, pensamos em nós mesmos como pertencendo a uma determinada nação, como Israel ou a Coreia; acreditamos numa certa religião; vemo-nos como indivíduos; acreditamos que temos certos direitos naturais. Então, quando me pergunto "quem sou eu?" posso responder que "sou israelita, sou judeu e sou um indivíduo que tem direitos inalienáveis ??à vida, à liberdade e à busca da felicidade".

No entanto, o nacionalismo, o individualismo, os direitos humanos e a maioria das religiões são desenvolvimentos recentes. Antes do séc. XVIII, o nacionalismo era uma força bastante fraca, e a maioria das nações de hoje não tem mais de um século de existência. O indivíduo foi criado pelo estado e pelo mercado modernos, na sua luta para quebrar o poder das famílias e comunidades tradicionais. Os direitos humanos são uma história inventada nos últimos três séculos, que não tem base na biologia. Não há direitos inscritos no nosso ADN. A maioria das religiões que conhecemos hoje nasceu apenas nos últimos dois ou três mil anos e sofreu profundas mudanças nos últimos séculos. O judaísmo ou o cristianismo de hoje são muito diferentes do que eram há 2000 anos. Não são verdades eternas, mas criações humanas. Algumas dessas criações podem ter sido muito benéficas, é claro, mas para conhecer a verdade sobre nós mesmos precisamos ir além de todas essas criações humanas. É por isso que a História me interessa tanto. Eu quero conhecer a História, para poder ir além dela e entender a verdade que não é o resultado de acontecimentos históricos aleatórios.

É sempre referido como um historiador israelita. Porquê sempre a qualificação da nacionalidade?

Eu não me classifico como "um historiador israelita". Eu não acho que a nacionalidade seja assim tão importante. Acho mesmo que os meus antecedentes judaicos têm muito menos influência na minha visão da História do que se poderia esperar. Eu sou judeu por etnia, mas não na minha religião e na minha visão do mundo. Sou muito mais influenciado por Buda e Darwin do que pela Bíblia. É claro que as minhas experiências como israelita moldaram a minha vida e a minha compreensão do mundo até certo ponto. O mundo parece diferente visto de Jerusalém, de Nova Iorque ou de Pequim, e se eu tivesse crescido em Nova Iorque ou Pequim, provavelmente teria escrito um livro diferente. Em particular, porque vivo no Médio Oriente, com todos os conflitos nacionalistas e religiosos, estou muito consciente do imenso poder das histórias imaginárias para controlar as nossas vidas. As pessoas estão a matar-se por todo o lado por puras ficções. É por isso que é tão importante para mim distinguir a realidade da ficção.

"Homo Deus" resulta de uma investigação complexa. Foi confrontado com caminhos sem saída?

O meu objetivo principal ao escrever Homo Deus não era profetizar o futuro, mas sim questionar o nosso futuro e explorar várias possibilidades. O livro foca-se na interação entre tecnologia, política, sociedade e religião. O que acontecerá com a política quando os algoritmos Big Data conhecerem os nossos desejos e opiniões melhor do que nós próprios os conhecemos? O que acontecerá com o mercado de trabalho quando os computadores superarem os seres humanos em cada vez mais tarefas, e a inteligência artificial substituir taxistas, médicos, professores e polícias? O que faremos com milhares de milhões de pessoas economicamente inúteis? Como irão lidar religiões como o cristianismo e o islão com a engenharia genética e o potencial de criar super-humanos e superar a velhice e a morte? Irá Silicon Valley acabar por produzir novas religiões, em vez de apenas novos gadgets?

Ao tentar responder a essas perguntas encontrei obviamente muitos becos sem saída. Ninguém sabe realmente como será o mundo dentro de 30 ou 60 anos. Na verdade, acho que a nossa capacidade de entender o mundo é hoje menor do que nunca. No passado, o conhecimento humano aumentava lentamente e a tecnologia demorava tempo a ser desenvolvida, de modo que a política e a economia também mudavam a um ritmo lento. Hoje, o nosso conhecimento está a aumentar a uma velocidade vertiginosa e, teoricamente, deveríamos entender o mundo cada vez melhor. Mas está a acontecer precisamente o contrário. Os nossos conhecimentos recém-adquiridos levam a mudanças económicas, sociais e políticas mais rápidas. Na tentativa de entender o que está a acontecer, aceleramos a acumulação de conhecimento, o que leva apenas a agitações mais rápidas e maiores. Consequentemente, estamos cada vez menos aptos a dar sentido ao presente ou a prever o futuro. Ninguém sabe realmente o que está a acontecer hoje no mundo, ou onde estaremos no futuro.

Há mil anos, em 1017, havia muitas coisas que as pessoas não sabiam sobre o futuro, mas podiam ter certeza sobre as características básicas da sociedade humana. Se você vivesse na Europa em 1017 sabia que em 1050 os Vikings poderiam invadir novamente, as dinastias poderiam cair e as pestes ou terramotos poderiam matar milhões. No entanto, era claro para si que mesmo em 1050 a maioria dos europeus ainda trabalharia na agricultura, os homens ainda dominariam as mulheres, a expectativa de vida seria de cerca de 40 anos e o corpo humano seria exatamente o mesmo. Hoje, pelo contrário, não fazemos ideia de como a Europa ou o resto do mundo vai ser em 2050. Não sabemos o que as pessoas farão como trabalho, não sabemos como serão as relações de género, as pessoas poderão viver muito mais do que hoje e o próprio corpo humano pode sofrer uma revolução sem precedentes graças à bioengenharia e a interfaces diretas entre cérebro e computador.

Consequentemente, pela primeira vez na história, não fazemos ideia do que ensinar às crianças na escola ou aos estudantes na faculdade. Em 1017, os pais ensinaram aos seus filhos como plantar trigo, como tecer lã, ou como ler a Bíblia e era óbvio que essas capacidades ainda seriam necessárias em 1050. Pelo contrário, a maior parte do que as crianças aprendem hoje na escola será irrelevante em 2050.

Sabemos que tecnologias como a IA e a bioengenharia mudarão o mundo, mas não temos certeza de como o farão, porque a tecnologia nunca é determinista. Podemos usar os mesmos avanços tecnológicos para criar tipos muito diferentes de sociedades e situações. Por exemplo, no séc. XX, as pessoas podiam usar a tecnologia da Revolução Industrial - comboios, eletricidade, rádio, telefone - para criar ditaduras comunistas, regimes fascistas ou democracias liberais. Basta pensar na Coreia do Sul e na Coreia do Norte: os dois países tiveram acesso exatamente à mesma tecnologia, mas eles optaram por empregá-la de maneiras muito diferentes.

No séc. XXI, a ascensão da IA ??e da biotecnologia irá certamente transformar o mundo, mas isso não implica um resultado determinista único. Podemos usá-las para criar tipos muito diferentes de sociedades. Como usá-las sabiamente é a questão mais importante que a humanidade enfrenta atualmente. É muito mais importante do que a crise económica mundial, as guerras no Médio Oriente ou a crise dos refugiados na Europa. O futuro, não só da humanidade, mas provavelmente da própria vida, depende de como escolhemos usar a IA e a biotecnologia.

Para dar um exemplo, consideremos o que a biotecnologia pode significar para a criação de animais. Atualmente, os seres humanos tratam os animais de criação, como vacas, porcos e galinhas, como se fossem apenas máquinas para a produção de carne, leite e ovos. Nós infligimos um sofrimento tremendo a biliões de seres sensíveis, que conseguem sentir dor, medo e solidão. Os avanços na biotecnologia dão-nos agora uma escolha. Por um lado, podemos usar a biotecnologia para criar vacas, porcos e galinhas que crescem mais rapidamente e produzem mais carne, sem pensar no sofrimento que infligimos a esses animais. Por outro lado, poderíamos usar a biotecnologia para criar o que é conhecido como "agricultura celular" ou "carne limpa" - carne que é produzida em laboratórios a partir de células animais, sem necessidade de criar e abater criaturas inteiras. Se quisermos um bife, poderemos limitar-nos a produzir um bife, em vez de criar e abater uma vaca inteira. Isso não é ficção científica. O primeiro "hambúrguer limpo" foi produzido em 2013. É verdade que custou 330 000 dólares, mas, hoje, produzir um hambúrguer desses custa apenas 11 dólares, e dentro de alguns anos é provável que custe menos do que um hambúrguer de "carne abatida". Com a investigação e o investimento certos, dentro de uma década ou duas poderíamos produzir carne limpa em escala industrial, que será mais barata, mais ecológica e mais ética do que criar vacas. A escolha depende de nós.

Homo Deus - História Breve do Amanhã

Yuval Noah Harari

Editora Elsinore

480 páginas

22 euros

Versão inglesa da entrevista a Yuval Noah Harari


I look at your book and I imagine the author as a drone endowed with artificial intelligence flying over the planet Earth. Is that an image you can identify yourself with?
To some extent. I do try to be like some high-flying drone, watching everything that happens on earth without taking sides. Yet unlike a drone or an artificial intelligence, I focus not just on material developments. I try to understand how people feel, and I give a central place in my book to ethical and philosophical questions. There is no point writing history if you forget about the ethical dimension.

You begin this book with a big question: "We are controlling famine, plague and war, what is going to replace them?" What is your prognosis?

In the twenty-first century the main human ambition will not be merely to control famine, plague and war, but to upgrade humans into gods. I mean this literally. Humans will strive to acquire abilities that traditionally were thought to be divine abilities. In particular, the ability to engineer and create life. Just as in the Bible God created animals and plants and humans according to his wishes, so in the twenty-first century we will probably learn how to design and manufacture animals and plants and even humans according to our wishes. We will use genetic engineering in order to create new kinds of organic beings; we will use direct brain-computer interfaces in order to create cyborgs (beings that combine organic parts with inorganic parts); and we may even succeed in creating completely inorganic beings. The main products of the twenty-first-century economy will not be textiles, vehicles and weapons, but rather bodies, brains and minds. This is why I gave the book the title Homo Deus - man-god.


When commenting on the current state of humanity you say: "Let"s see what"s on the agenda today." Is this a question for the whole world or only for the less fortunate?
It is a question for the whole world, from the most developed countries to the least developed. For we now live in a global world. There are no longer independent countries. All countries depend on one another. All our main problems are global in nature: global warming, global inequality, the rise of disruptive technologies. The development of AI and bioengineering will influence not just Japan and the USA, but also Congo and Afghanistan. Countries that take no interest in AI and bioengineering are likely to be subjugated and exploited, just as in the nineteenth century countries that took no interest in steam engines and machine guns were conquered by the industrial powers.

In some countries, overeating is a more serious problem than hunger. Is this an irrational situation or is it only human nature?
There are still billions of poor people in the world suffering from malnutrition and disease, but mass famines are becoming rare. In the past, every few years there was drought or flooding or some other natural catastrophe, food production sharply declined, and millions of people starved to death. Today, humankind produces so much food and can transport food so quickly and cheaply, that natural disasters by themselves never result in mass starvation. There are no longer natural famines in the world - there are only political famines. If people in Syria, Sudan or North Korea still starve to death, it is only because some government wants them to.
Take China, for example. A few decades ago China was still a byword for food shortages. Tens of millions of Chinese starved to death during the disastrous Great Leap Forward, and experts routinely predicted that the problem would only get worse. In 1974 the first World Food Conference was convened in Rome, and delegates were treated to apocalyptic scenarios. They were told that there was no way for China to feed its billion people, and that the world"s most populous country was heading towards catastrophe. In fact, it was heading towards the greatest economic miracle in history. Since 1974 hundreds of millions of Chinese have been lifted out of poverty, and though hundreds of millions more still suffer greatly from privation and malnutrition, for the first time in its recorded history China is now free from famine.
Indeed, in most countries today overeating has become a far worse problem than famine. In the eighteenth century Marie-Antoinette allegedly advised the starving masses that if they run out of bread, they should just eat cake instead. Today the poor are following this advice to the letter. Whereas the rich residents of Beverly Hills eat lettuce salad and steamed tofu with quinoa, in the slums and ghettos the poor gorge on Twinkie cakes, Cheetos, hamburgers and pizza. In 2014, more than 2.1 billion people were overweight, compared to 850 million who suffered from malnutrition. Half of humankind is expected to be overweight by 2030. In 2010, famine and malnutrition combined killed about 1 million people, whereas obesity killed 3 million.

You claim that wars are dwindling. When you see President Trump dropping a super bomb in Afghanistan do you feel like changing the text of this book?
I didn"t say that wars will inevitably disappear. What I said is that we have transformed wars from an inevitable catastrophe beyond human control into a manageable challenge. In the past, humans thought that wars were a natural part of the world, and only God could bring peace to earth. But over the last few decades, humans discovered that they have the power to bring peace to the world by themselves, if they make the right decisions.
There are still wars in some parts of the world - I live in Israel, so I know that perfectly well. But large parts of the world are completely free from war, and many states have stopped using war as a standard tool to advance their interests. In ancient agricultural societies, about 15% of all deaths were caused by human violence. Today, in the world as a whole, less than 1.5% of deaths are caused by human violence. In fact, the number of suicides is today greater than the number of violent deaths! You have more chance of killing yourself than being killed by some enemy soldier, terrorist or criminal. Similarly, the number of people who die from obesity and related diseases is far higher than the number of people killed by human violence. Sugar is today more dangerous than gunpowder.
What brought about this new era of peace? There are two main causes for that. First and foremost, nuclear weapons have turned war between superpowers into collective suicide. So the superpowers had to completely change the international system, and find ways of resolving conflicts without major wars. Secondly, economic changes have turned knowledge into the main economic asset. Previously, wealth was mainly material wealth: wheat fields, gold mines, slaves, cattle. This encouraged war, because it was relatively easy to conquer material wealth through war. Today, wealth is increasingly based on knowledge. And you cannot conquer knowledge through war. You cannot for example conquer the wealth of Silicon Valley through war, because there are no silicon mines in Silicon Valley - the wealth comes from the knowledge of the engineers and technicians. Consequently today most wars are restricted to those parts of the world - like the Middle East - where wealth is old-fashioned material wealth (primarily oil fields).
I don"t know whether this era of peace will last. But the past few decades have proven that when humans want to, they can bring war and violence under control. It is our responsibility to make sure they remain under our control. If a new World War begins, it will be the fault of irresponsible leaders such as Trump and Putin rather than of human nature.

Was it easy to integrate the constant statement of terrorism in this analysis of yours?
Terrorism is mostly theater. Terrorists stage a terrifying spectacle of violence that captures our imagination and makes us feel as if we are sliding back into medieval chaos. Consequently states often feel obliged to react to the theatre of terrorism with a show of security, orchestrating immense displays of force, such as the persecution of entire populations or the invasion of foreign countries. In most cases, this overreaction to terrorism poses a far greater threat to our security than the terrorists themselves.
Terrorists are like a fly that tries to destroy a china shop. The fly is so weak that it cannot budge even a single teacup. So it finds a bull, gets inside its ear, and starts buzzing. The bull goes wild with fear and anger, and destroys the china shop. This is what happened in the Middle East in the last decade. Islamic fundamentalists could never have toppled Saddam Hussein by themselves. Instead, they enraged the USA by the 9/11 attacks, and the USA destroyed the Middle Eastern china shop for them. Now they flourish in the wreckage.
Hence the success or failure of terrorism really depends on us. If we allow our imagination to be captured by the terrorists, and then overreact to our own fears - terrorism will succeed. If we free our imagination from the terrorists, and react in a balanced and cool way - terrorism will fail.

In the subchapter "The Right to Happiness", you consider this is the second major project on the agenda of humankind. But isn"t it true, as Epicurus said, that this search continues to lead to unhappiness?
Yes, so far humanity"s search for happiness was not very successful. We are today far more powerful than ever before, and our life is certainly more comfortable than in the past, yet it is doubtful whether we are much happier than our ancestors. Average Americans have a car, a smartphone, a refrigerator full of food and a cupboard full of medicines - things their ancestors could hardly dream about. Yet Americans are so angry and dissatisfied with their situation, that they elected Donald Trump as their president. Apparently, it is not easy to translate power into happiness.
One explanation is that happiness depends less on objective conditions and more on our own expectations. Expectations, however, tend to adapt to conditions. When things improve, expectations balloon, and consequently even dramatic improvements in conditions might leave us as dissatisfied as before.
At an even more fundamental level, the basic human reaction to pleasure is not satisfaction, but rather craving for more. Hence no matter what we achieve, it only increases our craving, not our satisfaction. This is why humankind has been so successful in conquering the world and acquiring immense power, but has not been successful in translating all that power into happiness. If we don"t change our basic mental patterns, than the power we will gain in the twenty-first century may well upgrade us into gods, but we will be very dissatisfied gods.

You mention that "Marx forgot that the capitalists knew how to read." To what extent do you value this thinker?
I value Marx very highly. To some extent, we are all Marxists today. We may not accept Marx"s political program, but even the most extreme capitalists analyze history and politics using Marxist thinking. For example, when we try to understand the rise of Donald Trump, we usually think that economic changes such as growing inequality between the American working class and the upper class lead to political upheavals. That"s a Marxist analysis.
However, in the twenty-first century Marxist theories are losing their relevance. Marxism assumes that the working class is vital for the economy, and Marxist thinkers have tried to teach the proletariat how to translate its immense economic power into political clout. These teachings might become utterly irrelevant in the twenty-first century, as AI and robots replace humans in more and more jobs, and as the masses lose their economic value. Indeed, some might argue that already Brexit and Trump demonstrate an opposite trajectory to what Marx envisioned. In 2016 Brits and Americans who have lost their economic usefulness but still retained political power have used that power to revolt before it is too late. They revolt not against an economic elite that exploits them, but against an economic elite that does not need them anymore.

Are you worried that we will soon face a race of supermen, your Homo Deus?
Yes, there is a danger that humankind will split into biological castes. As biotechnology improves, it will be possible to extend human life-spans and to upgrade human abilities, but the new wonder treatments might be expensive, and might not be freely available for all billions of humans. Hence human society in the 21st century may be the most unequal in history. For the first time in history, economic inequality will be translated into biological inequality. For the first time in history, the upper classes will be not only richer than the rest of humankind, but they will also live much longer and will be far more talented.
The rise of artificial intelligence might exacerbate this problem. Within a few decades, AI may make most humans useless. We are now developing computer software and AI that outperform humans in more and more tasks, from driving cars to diagnosing diseases. As a result, experts estimate that within a few decades, not only taxi drivers and doctors, but about 50% of all the jobs in advanced economies will be taken by computers.
Many new kinds of jobs might appear, but that won"t necessarily solve the problem. Humans have basically just two types of skills - physical and cognitive - and if computers outperform us in both, they might outperform us in the new jobs just like in the old ones. So what will be the use of humans in such a world? What will we do with billions of economically useless humans? We don"t know. We don"t have any economic model for such a situation. This may well be the greatest economic and political question of the twenty-first century.
In addition, as algorithms push humans out of the job market, wealth might become concentrated in the hands of the tiny elite that owns the all-powerful algorithms, creating unprecedented social and political inequality. Today millions of taxi drivers, bus drivers and truck drivers have significant economic and political clout, each commanding a small share of the transportation market. If the government does something they don"t like, they can unionize and go on strike. In the future, all that economic and political power might be monopolized by a few billionaires who own the corporations who own the algorithms that drive all the vehicles.

Was homo sapiens just one more step in the evolution of man and no longer the reference?
We are probably one of the last generations of Homo sapiens. We will still have grandchildren, but I am not so sure that our grandchildren will have grandchildren. At least not human ones. In the next century or two, humans will either destroy themselves or upgrade themselves into something completely different. Something that will be more different from us than we are different from Neanderthals or chimpanzees.

You pick the algorithm as a discriminating factor. How can the weakest defend themselves?
By bringing together enough data and enough computing power, corporations and governments could soon create algorithms that know me better than I know myself, and then authority will shift away from me to the algorithm. The algorithm could understand my desires, predict my decisions, and make better choices on my behalf.
Such algorithms have great potential, but also great danger. As algorithms come to know us so well, dictatorial governments could gain absolute control over their citizens, even more than in Nazi Germany, and resistance to such dictatorships might be utterly impossible. Even in democratic countries, people might become the victims of new kinds of oppression and discrimination. Already today more and more banks, corporations and institutions are using algorithms to analyze data and make decisions about us. When you apply to your bank for a loan, it is likely that your application is processed by an algorithm rather than by a human. The algorithm analyzes lots of data about you, and statistics about millions of other people, and decides whether you are reliable enough to give you a loan. Often, the algorithm does a better job than a human banker. But the problem is, that if the algorithm discriminates against some people unjustly, it is difficult to know that. If the bank refuses to give you a loan, and you ask "why not?", the bank replies "the algorithm said no." You ask "why did the algorithm say no?" and the bank replies "We don"t know. No human understands this algorithm, because it is based on advanced machine learning. But we trust our algorithm, so we won"t give you a loan".
In the past, people discriminated against entire groups such as women, gays, and blacks. So the women, or gays, or blacks, could organize and protest against their collective discrimination. But now the algorithm might discriminate against you, and you have no idea why. Maybe the algorithm found something in your DNA or your personal history that the algorithm does not like. The algorithm discriminates against you not because you are a woman, or gay, or black - but because you are you. There is something specific about you that the algorithm does not like. You don"t know what it is, and even if you knew, you cannot organize with other people to protest, because there are no other people. It is just you. Instead of collective discrimination like in the twentieth century, maybe in the twenty-first century we will have a big problem of individual discrimination.

When you point out Dataism as the next religion, aren"t you going too far?
Speaking of religion, does it have an expiration date?
First, we should understand what religion is. Religion is not belief in gods. Rather, religion is any system of human norms and values that is founded on a belief in superhuman laws. Religion tells us that we must obey certain laws that were not invented by humans, and that humans cannot change at will. Some religions, such as Islam, Christianity and Hinduism, believe that these super-human laws were created by the gods. Other religions, such as Buddhism, Capitalism and Nazism, believe that these super-human laws are natural laws. Thus Buddhists believe in the natural laws of karma, Nazis argued that their ideology reflected the laws of natural selection, and Capitalist believe that they follow the natural laws of economics.
No matter whether they believe in divine laws or in natural laws, all religions have exactly the same function: to give legitimacy to human norms and values, and to give stability to human institutions such as states and corporations. Without some kind of religion, it is simply impossible to maintain social order. During the modern era religions that believe in divine laws went into eclipse. But religions that believe in natural laws became ever more powerful. In the future, they are likely to become more powerful yet. Silicon Valley, for example, is today a hot-house of new techno-religions. They promise all the old religious prizes - happiness, peace, prosperity, and eternal life - but here on earth with the help of technology, rather than after death with the help of supernatural beings.

Your previous book was widely recognized. Did someone learn their lesson?
I am not sure that the aim of studying history is to learn practical lessons. In my view, we should study history not in order to learn from the past, but in order to be free of it. Each of us is born into a particular world, governed by a particular system of norms and values, and a particular economic and political order. Since we are born into it, we take the surrounding reality to be natural and inevitable, and we tend to think that the way people today live their lives is the only possible way. We seldom realize that the world we know is the accidental outcome of chance historical events, which condition not only our technology, politics and economics but even the way we think and dream. This is how the past grips us by the back of the head, and turn our eyes towards a single possible future. We have felt the grip of the past from the moment we were born, so we don"t even notice it. The study of history aims to loosen this grip, and to enable us to turn our head around more freely, to think in new ways, and to see many more possible futures.
If we don"t know history, we easily mistake the accidents of history for our real essence. For example, we think about ourselves as belonging to a certain nation such as Israel or Korea; we believe in a certain religion; we view ourselves as individuals; we believe that we have certain natural rights. So when I ask myself "who am I?" I might reply that "I am Israeli, I am Jewish, and I am an individual having inalienable rights to life, liberty and the pursuit of happiness".
Yet in fact, nationalism, individualism, human rights and most religions are recent developments. Prior to the 18th century nationalism was a rather weak force, and most nations today are hardly a century old. The individual was created by the modern state and the modern market, in their struggle to break up the power of traditional families and communities. Human rights are a story invented over the last three centuries, which has no basis in biology. There are no rights inscribed in our DNA. Most religions we know today were born only in the last two or three thousand years, and have undergone far-reaching changes in the last few centuries. The Judaism or Christianity of today are very different from what they were 2000 years ago. They are not eternal truths, but human creations. Some of these creations may have been very beneficial, of course, but in order to know the truth about ourselves, we need to go beyond all such human creations. This is why history interests me so much. I want to know history, so that I could go beyond it, and understand the truth which is not the outcome of chance historical events.

You are always referred to as an Israelite historian. Why always the qualification of nationality?
I don"t call myself "an Israeli historian". I don"t think nationality is so important. I similarly think my Jewish background has much less influence on my view of history than what one might expect. I am Jewish by ethnicity, but not in my religion and worldview. I am much more influenced by Buddha and Darwin than by the Bible. Of course my experiences as an Israeli have shaped my life and understanding of the world to some extent. The world looks different from Jerusalem than from New York or Beijing, and if I grew up in New York or Beijing I would probably have written a different book. In particular, because I live in the Middle East, with all the nationalist and religious conflicts, I am very much aware of the immense power of imaginary stories to control our lives. All around, people are killing each other for pure fictions. That"s why it is so important for me to distinguish reality from fiction.

"Homo Deus" results from a complex investigation. Have you been faced with dead ends? 
My main aim in writing Homo Deus was not to prophesize the future, but to raise questions about our future, and explore various possibilities. The book focuses on the interaction between technology, politics, society and religion. What will happen to politics when Big Data algorithms know our desires and opinions better than we know them ourselves? What will happen to the job market when computers outperform humans in more and more tasks, and artificial intelligence replaces taxi drivers, doctors, teachers and policemen? What will we do with billions of economically useless people? How will religions such as Christianity and Islam handle genetic engineering and the potential of creating superhumans and overcoming old age and death? Will Silicon Valley end up producing new religions, rather than just novel gadgets?
When trying to answer such questions, I obviously encountered many dead ends. Nobody really knows what the world would be like in 30 or 60 years. Indeed, I think that today our ability to understand the world is smaller than ever before. In the past, human knowledge increased slowly, and technology took time to develop, so politics and economics also changed at a leisurely pace. Today our knowledge is increasing at breakneck speed, and theoretically we should understand the world better and better. But the very opposite is happening. Our newfound knowledge leads to faster economic, social and political changes; in an attempt to understand what is happening, we accelerate the accumulation of knowledge; which leads only to faster and greater upheavals. Consequently we are less and less able to make sense of the present or to forecast the future. Nobody really knows what is happening today in the world, or where we will be in the future.
A thousand years ago, in 1017, there were many things people didn"t know about the future, but they could be quite certain about the basic features of human society. If you lived in Europe in 1017 you knew that by 1050 the Vikings might invade again, dynasties might fall, and plagues or earthquakes might kill millions. However, it was clear to you that even in 1050 most Europeans would still work as farmers, men would still dominate women, life expectancy would be about 40, and the human body would be exactly the same. In contrast, today we have no idea how Europe or the rest of the world will look in 2050. We don"t know what people will do for a living, we don"t know what gender relations will be like, people might live much longer than today, and the human body itself might undergo an unprecedented revolution thanks to bioengineering and direct brain-computer interfaces.
Consequently for the first time in history, we have no idea what to teach children in school or students in college. In 1017, parents taught their children how to plant wheat, how to weave wool, or how to read the Bible - it was obvious these skills would still be needed in 1050. In contrast, most of what kids learn in school today will be irrelevant by 2050.
We do know that technologies such as AI and bioengineering will change the world, but we are not sure how, because technology is never deterministic. We can use the same technological breakthroughs to create very different kinds of societies and situations. For example, in the twentieth century people could use the technology of the Industrial Revolution - trains, electricity, radio, telephone - in order to create communist dictatorships, fascist regimes or liberal democracies. Just think about South Korea and North Korea: They have had access to exactly the same technology, but they have chosen to employ it in very different ways.
In the twenty-first century the rise of AI and biotechnology will certainly transform the world, but it does not mandate a single deterministic outcome. We can use them to create very different kinds of societies. How to use them wisely is the most important question facing humankind today. It is far more important than the global economic crisis, the wars in the Middle East, or the refugee crisis in Europe. The future not only of humanity, but probably of life itself, depends on how we choose to use AI and biotechnology.
To give an example, consider what biotechnology might mean to farm animals. At present, humans treat farm animals such as cows, pigs and chickens as if they were just machines for producing meat, milk and eggs. We inflict tremendous suffering on billions of sentient beings, who can feel pain, fear and loneliness. Advances in biotechnology now give us a choice. On the one hand, we could use biotechnology to design cows, pigs and chickens that grow faster and produce more meat, without any thought about the suffering we inflict on these animals. On the other hand, we could use biotechnology to create what is known as "cellular agriculture" or "clean meat" - meat that is grown in laboratories from animal cells, without any need of raising and slaughtering entire creatures. If you want a steak, you could just grow a steak, instead of raising and slaughtering an entire cow. This isn"t science fiction. The first "clean hamburger" was produced in 2013. True, it cost $330,000, but today producing such a hamburger costs only $11, and within a few more years it is likely to cost less than a "slaughtered meat" hamburger. With proper research and investment, within a decade or two we could produce clean meat on an industrial scale which will be cheaper, more ecologic and more ethical than raising cows. The choice is up to us.



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