REVISTA ÉPOCA | NOTÍCIAS
Natália Portinari
Antes endeusados, responsáveis por marketing da campanha presidencial penam para se manter importantes na era das redes sociais
Por volta do meio-dia de uma sexta-feira recente, o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles chegou a uma casa espaçosa no Lago Sul, bairro nobre de Brasília, para gravar programas de televisão para sua campanha à Presidência pelo MDB. Sorridente, com um elegante terno azul-marinho, cumprimentou todos os presentes com um aperto de mão e se enclausurou com seus dois marqueteiros em uma sala no segundo andar. Criadores do slogan “Chama o Meirelles”, os marqueteiros são Chico Mendez, que se tornou conhecido pelo trabalho bem-sucedido na eleição do petista Fernando Pimentel para o governo de Minas Gerais em 2014, e Paulo Vasconcelos, que trabalhou nas campanhas presidenciais de Lula, em 2002, e de Aécio Neves, em 2014.
Por três horas e meia, Meirelles revisou o texto para a gravação do dia, sempre interrompido por ligações e mensagens. Nesse intervalo, dezenas de funcionários aproveitaram para almoçar panqueca, salada e peixe frito. Era um time de cerca de 70 pessoas, entre assessores, publicitários, fotógrafos, editores de imagem, cinegrafistas, designers e músicos. “Hoje não tem mais agenda, então o Henrique aproveita, fica conversando com o pessoal o dia inteiro”, disse um deles. Alguns tocavam guitarra para passar o tempo. Um militante do MDB lamentou não poder usar como piscina o espelho d’água que ocupa boa parte do quintal da casa alugada.
Meirelles ainda respondia a mensagens quando, já no estúdio, recebeu várias camadas de pó para evitar o brilho na careca e nas bochechas. Com uma camisa recémpassada, corretivo nos olhos e os pequenos tufos de cabelo escovados para não aparecerem no filme, leu a fala no TelePrompTer com uma pronúncia espaçada, diferentemente de quando anunciava o aumento da Selic. “Conhece aquele ditado ‘falar é fácil, difícil é fazer’? A eleição é um momento perfeito para as pessoas se lembrarem dele porque, de uma hora para outra, surge solução para tudo”, disse encarando a câmera.
Foi alertado para não franzir a testa — logo antes de receber mais pó entre as sobrancelhas — e incentivado a gesticular para ganhar ênfase. O mérito da dicção mais escorreita é da fonoaudióloga Leny Kyrillos, que também atende Marina Silva. Ainda há deslizes, porém. Meirelles pronunciou uma pergunta como afirmação e trocou “mundos e fundos” por “muitos e fundos”. Paciente, repetiu as falas a pedido dos diretores e reclamou, brincando, por não poder falar com sotaque goiano.
O candidato ainda teve tempo para chamar Mendez de lado e cochichar os últimos palpites no texto. “Não gosto desta referência aos Estados Unidos. Lá é uma coisa, aqui é outra. Vamos tirar?” Seu tom foi calmo e discreto. Disse que só fala no programa o que “realmente acredita”. “É apaixonante trabalhar com ele”, comentou Paulo Vasconcelos. “Ele nunca te repreende em público. Quando discorda de algo, te chama numa sala para conversar. Nunca trabalhamos com ninguém assim.”
Meirelles já tirou do bolso mais de R$ 40 milhões para propaganda, produção de TV e comunicação. Ainda assim, tem 2% de intenções de voto do eleitorado, apesar de contar com o terceiro maior tempo de televisão entre os candidatos: um minuto e 55 segundos. É o maior investimento entre todos os candidatos à Presidência. Cada um deles poderá gastar no primeiro turno, no máximo, R$ 70 milhões. Quando foi criado o fundo especial para financiamento eleitoral, em 2017, a lei previa também um teto para o autofinanciamento, que foi vetado pelo presidente Michel Temer. A nova regra “permite independência”, na opinião de Meirelles. “Posso fazer uma campanha sem assumir compromisso com ninguém, só com o eleitor. É resultado de minha carreira, de fazer as coisas bem feitas, ter tido sucesso, trabalhado duro a vida inteira. Optei por investir no que eu considero ser um benefício para o povo brasileiro.”
Com doações empresariais proibidas desde 2015, agora os candidatos dependem do Fundo Eleitoral, mais graúdo quanto maior for a bancada da coligação no Congresso Nacional, e de doações de pessoas físicas. O novo cenário levou a uma queda generalizada nas receitas dos marqueteiros. Se, em 2014, o gasto total dos presidenciáveis foi de R$ 652 milhões — sendo que R$ 350 milhões foram gastos por Dilma Rousseff, e R$ 227 milhões por Aécio —, neste ano fo-
Os gastos com marketing somam, até agora, R$ 123 milhões — um quinto das despesas de eleições presidenciais anteriores ram contratados até agora R$ 123 milhões, apenas 20% do valor das eleições anteriores, considerando o reajuste da inflação.
Na campanha petista de 2018, financiada quase integralmente com R$ 20 milhões do Fundo Público Eleitoral, os programas são gravados em uma produtora de São Paulo, a M. Romano Comunicações. Com 200 funcionários para fazer peças para a internet e a televisão, foi contratada por R$ 7,4 milhões, um décimo do que se cobrou nas eleições passadas. À frente dos programas estão os publicitários Raul Rabelo, que já trabalhou com Sidônio Palmeira, marqueteiro baiano, e Otávio Antunes, coordenador de marketing da campanha. São os autores do jingle-forró “Chama, chama que o homem dá jeito”, adaptado depois para “O 13 dá jeito” e, finalmente, “O Haddad dá jeito”. O slogan “É o Brasil feliz de novo” tenta embalar a campanha com a nostalgia pelos tempos de crescimento econômico do governo Lula. A estratégia foi associar Haddad a Lula o máximo possível.
Apesar de a campanha ser tocada quase inteiramente por militantes, no início de setembro um atraso nos pagamentos de cerca de 30 pessoas levou alguns funcionários da produtora a cruzarem os braços por dois dias. A campanha teve de mudar de CNPJ para transferir a prestação de contas de Lula para Haddad, o que causou uma confusão nas transferências. As alterações constantes nos programas devido às restrições impostas pela Justiça eleitoral à figura de Lula imprimiram um ritmo frenético de trabalho nas primeiras semanas. “Mas a gente é muito militante, então faz com muito amor”, disse-me um integrante da equipe.
O baiano Sidônio Palmeira, último nome conhecido do marketing político que sobrou no partido, enaltece o espírito jovem dos profissionais que trabalham com a produção do PT neste ano. “É como em um time de futebol. É importante ter o novo para ter energia. O cara que é novo quer crescer, quer fazer.” Ele não tem envolvimento com a equipe paulista,
já que está trabalhando na campanha de Rui Costa para o governo da Bahia. É das mais baratas que já fez, disse o publicitário. Em entrevista por telefone, Palmeira falou, em tom exaltado, contra superproduções de TV e candidatos que usam TelePrompTer. “Deixa o cara falar emocionalmente, p..., deixa o cara falar naturalmente, de forma coloquial, aí costura em torno disso.”
A nova forma de trabalhar é melhor que “aquela onda de marqueteiro” que havia antes, afirmou Palmeira. Ele ainda não sabe se vai trabalhar na campanha presidencial se Rui Costa vencer no primeiro turno, como indicam as pesquisas. “O povo que diz que é marqueteiro quer aparecer mais que o candidato. Não é só o PT que deveria fazer campanha barata, são todos os partidos. Não dá para passar a ideia com menos dinheiro? Claro que dá. O povo não consegue entender? Precisa ter aquele Império Romano, um nome, um marqueteiro? Não. As pessoas têm de trabalhar em conjunto para valorizar o candidato.”
Hoje, pensar dessa maneira é uma opção conveniente, já que João Santana e Duda Mendonça, nomes associados às produções milionárias do partido, foram condenados criminalmente. No caso de Santana, as irregularidades começaram na mesma mansão brasiliense usada, neste ano, por Henrique Meirelles. Quando gravava lá os programas para a campanha de reeleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006, Santana se queixou duas vezes ao presidente de que não estava recebendo os pagamentos — pelo menos foi o que ele disse em acordo de delação premiada, em março de 2017. Naquela época, o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci o instruiu a receber caixa dois por meio de uma conta no exterior, contou.
Com as novas regras de financiamento eleitoral, muitos candidatos contrataram equipes de vídeo reduzidas ou apelaram para gravações com celular
Com a delação, João Santana e sua mulher, Mônica, tornaram-se criminosos. Foram condenados a uma multa de R$ 3 milhões cada um e a prisão domiciliar por um ano e meio em um condomínio luxuoso a beira da praia, em Camaçari, na Bahia. O casal foi transferido para lá em outubro do ano passado. Eles devem se recolher a sua residência à noite e aos sábados, domingos e feriados, mas podem viajar a trabalho durante a semana, desde que não deixem o país. Também devem prestar 22 horas mensais de serviços comunitários. Findo esse período, deverão cumprir um ano de regime aberto, com exigências ainda menores — poderão sair de casa de madrugada e realizar viagens internacionais.
Antes de trabalhar com marketing político, Santana foi jornalista, uma diferença em relação a seu mentor, Duda Mendonça, que também fez delação à Operação Lava Jato em 2017. Publicitário, Mendonça enveredou pelo marketing político graças ao sucesso de sua agência, a DM9. Suas peças mais famosas de 2002 apelavam para a emoção, como as “grávidas do Lula”, em que mulheres grávidas pediam voto no PT pelo futuro do Brasil ao som do Bolero de Ravel e com locução de Chico Buarque; e outra em que um adolescente, João, dizia que estava entrando na faculdade e gritava, no fim do vídeo, “viva Luiz Inácio Lula da Silva”. O último filme fez tanto sucesso que foi reciclado pela campanha petista neste ano. Um estudante chamado Matheus discursa sobre sua formação e, no fim, saúda, novamente, o nome completo de Lula.
Para Santana, mais pragmático, a prioridade era a vitória na guerra de informação. O exemplo mais emblemático é a propaganda que mostrava comida desaparecendo de um jantar de família como consequência da independência do Banco Central, defendida por Marina Silva em 2014. Em outro anúncio, uma mãe fazia compras na farmácia segurando um bebê e via, através da vidraça, uma versão pobre de si mesma. O tema eram os “fantasmas do passado”, uma alusão aos governos dos tucanos — na propaganda de Santana, se Aécio vencesse, eles voltariam. Antes do auge da crise econômica, a propaganda ainda podia ser vista sem ser considerada estelionato eleitoral.
“Houve uma mistificação dos marqueteiros”, afirmou José Crispiniano, coordenador de comunicação da campanha petista. “Eles também são publicitários de si mesmos. Agora estamos trabalhando um pouco diferente. Os recursos digitais permitem fazer mais com menos recursos.” A estimativa é que os gastos da campanha petista não cheguem a R$ 50 milhões. Para um grupo do núcleo duro petista, os tempos áureos de João Santana são lembrados com lamento. “Saímos do João para o terceiro do Sidônio. É difícil”, disse um petista paulista a ÉPOCA.
O jornalista Manoel Canabarro, escolhido por Ciro Gomes nesta disputa presidencial, também é pupilo de Mendonça. Mais do que isso, é uma solução caseira, já que aconselha Ciro e seu irmão, Cid Gomes, há uma década. Com pouco tempo de televisão, Ciro Gomes apelou para as mídias sociais, onde tem fãs cativos. Assim como outros candidatos com muitos seguidores, não precisa pagar para ter o impulsionamento nas redes sociais — basta usar sua equipe para produzir vídeos mais curtos e diretos para a web e falar diretamente com seu público.
A reportagem perguntou ao cineasta Fernando Meirelles, voluntário na campanha de Marina Silva, qual é sua opinião sobre os valores inflacionados cobrados pelos marqueteiros das eleições anteriores. São necessários R$ 70 milhões para produzir vídeos para uma campanha presidencial, como João Santana recebeu de Dilma em 2014? “‘Inflacionado’ é de uma delicadeza ímpar”, respondeu Meirelles, por e-mail. “Aquilo lá foi crime mesmo, com condenação e prisão. Com o salário do Santana, dava para produzir todas as campanhas de todos os partidos este ano.”
Segundo Fernando Meirelles, a ideia de que um publicitário possa mudar o resultado de uma eleição é parcialmente falsa. “Alguém que sabe lidar com imagem, reforçar pontos positivos e jogar para baixo do tapete os negativos pode ajudar, mas o carisma do candidato parece ser o que decide.” Não à toa, afirmou, Lula é um “superstar” e Henrique Meirelles e Alckmin não decolam. “Independentemente de (os dois últimos) serem competentes ou não, para o eleitor são sem graça. Não vieram com o software do carisma, e aí não há publicitário que resolva. Fatalidade.”
A campanha de Alckmin tem sofrido, de fato, para dar os golpes de marketing político usuais. O marqueteiro encarregado da campanha é Lula Guimarães, responsável pela campanha de João Doria à prefeitura de São Paulo. Na pré-campanha, Alckmin se uniu com os partidos do centrão — PP, PR, PRB, DEM e Solidariedade — para ganhar tempo de televisão. Com cinco minutos e 32 segundos, mais que o dobro do que dispõe Fernando Haddad, do PT, o segundo em tempo, e R$ 44 milhões de Fundo Eleitoral, acreditava-se que o tucano cresceria e tomaria o lugar de Bolsonaro nas pesquisas. A previsão, repetida com confiança por diversos marqueteiros ouvidos para esta reportagem, provou-se jurássica. Mesmo sem TV e internado em um leito de hospital, Bolsonaro manteve seu eleitorado cativo com suas redes sociais e cresceu ainda mais.
O resultado foi uma progressão de agressividade. A primeira propaganda de Alckmin, conceitual, dizia que os problemas do país não se resolvem na bala, ao som de música clássica (soube-se depois que a peça era uma cópia despudorada de uma propaganda inglesa). Em seguida, Bolsonaro foi acusado de agredir mulheres, de ter algo “contra pobre” e, por fim, de ser o Hugo Chávez brasileiro. No começo, Alckmin não dava as caras para detonar o concorrente. Isso mudou ao longo do tempo. Em programa que foi ao ar na semana passada, o tucano disse que o capitão é “um despreparado, que representa um verdadeiro salto no escuro”, “já mostrou simpatia por ditadores” e “já defendeu o uso da tortura”, e que o PT, por outro lado, é “radical e extremista” e “foi envolvido no maior esquema de corrupção do mundo”.
O resultado dessa pancadaria diária tem sido inócuo para o tucano, embora ela esteja ajudando a manter Bolsonaro no topo dos candidatos mais rejeitados pelos eleitores. Por causa dessa propaganda negativa, Lula Guimarães foi comparado a João Santana, mas sua estratégia não afetou o adversário de Alckmin como Santana atingiu Marina Silva em 2014. Provou-se que já não faz mais sentido convencer o eleitor só com a TV. A aposta de Alckmin em outras mídias foi tão modesta que sua equipe de redes sociais tem 50 pessoas. Em 2014, numa campanha menos digital, Aécio tinha 250 pessoas.
“A estrutura era muito maior que o necessário”, afirmou Antonio Risério, escritor que trabalhou na campanha de Lula em 2002 e 2006 e, depois, com Eduardo Campos e Marina Silva em 2014. “O marketing político foi o casamento do alto nível tecnológico com o baixo nível ético. Os salários eram astronômicos. O ideal seria que a gente voltasse a ter políticos se dirigindo à população, dizendo suas propostas, mas continuamos com os mesmos cacoetes e vícios daquela época, só que sem dinheiro e sem aparatos tecnológicos. Os mesmos princípios, mas sem talento e sem dinheiro.”
Lula Guimarães, segundo Risério, é “louco” por Duda Mendonça. Os dois se conheceram na campanha de Campos e Marina Silva, em 2014. “Eu o chamo de Lula Mendonça, ele me odeia por causa disso. Uma vez tivemos uma reunião e ele citou umas dez vezes o livro de Duda (Casos e coisas), eu tive de interromper e dizer: ‘Lula, pare de citar isso para mim, quem escreveu esse livro fui eu’. O Duda é um analfabeto, só assinou.” Apesar disso, Duda Mendonça “tem um grande talento”, ressalva Risério, que hoje saiu do ramo do marketing. “Duda é excepcionalmente criativo, muito mais do que o João Santana. Mas o João é um cara muito mais sólido, lê, pesquisa.”
O consultor político Bruno Hoffmann lamenta que os grandes marqueteiros “não estejam por aí dando aulas, escrevendo sobre suas técnicas”. Para se opor ao que ele chama de “demonização” de sua profissão, Hoffmann criou o Clube Associativo dos Profissionais de Marketing Político (Camp). “Durante o horário político, é preciso de estrutura para dar respostas muito rápidas. Colocar os marqueteiros como vilões é falacioso. Não são R$ 10 milhões que vão para o bolso de alguém porque teve uma ideia brilhante. Esse dinheiro está pagando um exército de pessoas necessárias para a democracia. Se não fosse pelo nosso trabalho criativo, as pessoas se relacionariam muito menos com política.”
Com a nova regra de financiamento eleitoral, quem trabalha em campanhas para candidatos com menos verbas sofreu para conseguir aprovar orçamentos nestas eleições. Muitos candidatos contrataram soluções baratas de vídeo, com equipes reduzidas, ou até fizeram gravações com o celular, como Paulo Skaf (MDB), candidato a governador de São Paulo. Um marqueteiro ouvido pela reportagem orçou a coordenação digital para uma campanha a governador de estado em R$ 300 mil. Perdeu para um concorrente que ofereceu o mesmo serviço por 10% do valor.
A reforma do financiamento eleitoral que proibiu doações empresariais e estabeleceu limites para gastos partiu do pressuposto de que política é algo ruim, disse Darlan Campos, publicitário do Espírito Santo. “Agora temos de ser mais criativos, com menos dinheiro. Antes, era como matar uma barata com uma bazuca”, comparou. Para Fernando Tembra, que trabalha na tesouraria da campanha de Meirelles, no entanto, as campanhas eleitorais, antes das novas regras, pareciam com o mercado de casamentos. “Vai comprar um bolo? Custa R$ 1.000. É para eleição? Custa R$ 5 mil.”
O publicitário Paulo de Tarso, marqueteiro de Lula em 1989 e 1994, conhecido pelo jingle “Lula lá”, foi uma das vítimas das vacas magras. Ele teve de abandonar a campanha à reeleição de Márcio França (PSB), governador de São Paulo, quando se constatou que seu serviço era mais caro do que o candidato poderia pagar. Antes de o PSB se declarar neutro na eleição presidencial, havia uma perspectiva de aliança com o PSDB que poderia render uma verba extra para a campanha de França. Mas, como a aliança não ocorreu, o marqueteiro teve de sair da campanha. As despesas de França são de, até agora, R$ 2,2 milhões.
O atraso na distribuição do Fundo Eleitoral fez com que muitos candidatos não pudessem imprimir material e começassem a produzir programas de TV só às vésperas do início da campanha. “Muitos começaram a gravar apenas uma semana antes da estreia dos programas”, afirmou Tarso. A essa altura, em eleições anteriores, os candidatos já estavam com as equipes na rua, fazendo pesquisas. “Agora não são mais equipes, é equipe. Pela minha experiência, o que está acontecendo agora é o caos. Boa parte das campanhas não soube quanto podia investir até a última hora, está atrasada com os profissionais que já estão trabalhando.” Após se retirar da campanha de França — que, frisa, foi “legal comigo” —, Tarso passou a trabalhar só na campanha do ex-juiz federal Odilon Oliveira (PDT) a governador em Mato Grosso do Sul e na do ex-governador Marconi Perillo (PSDB) ao Senado em Goiás.
De todos os presidenciáveis, o que mais se prejudicou com a falta de verba foi Marina Silva. “Fizemos todos os programas em um dia só, um domingo”, disse o coordenador de comunicação da campanha da candidata, Claudio Angelo. “Ficamos das 3 da tarde à meia-noite em um estúdio em São Paulo gravando 14 comerciais. Tivemos de fazer essa maratona porque não temos dinheiro para pagar as diárias do estúdio”, afirmou. Marina Silva recebeu R$ 5,3 milhões de Fundo Público Eleitoral, mas havia gasto menos do que isso até a última semana.
Apesar da aversão a marqueteiros, a campanha da candidata da Rede recorreu a alguns truques de gestão de imagem, que, pelos últimos resultados das pesquisas de intenção de voto, parecem não ter funcionado. A ex-senadora mudou o penteado, usou roupas mais despojadas e tentou assumir uma postura mais agressiva nos debates. Quase sem tempo de televisão, apelou para transmissões nas redes sociais. Ao contrário de candidatos que usam as redes o ano todo, como Ciro Gomes e Bolsonaro, o engajamento conseguido por Marina Silva é pífio. O jogo mudou e, para ganhar seguidores, é preciso aumentar o volume da gritaria não só nos debates, mas também no Facebook, no Twitter e no WhatsApp. Quem precisa de marqueteiro para isso?
Para conquistar hoje o eleitor, é preciso fazer barulho não apenas nos debates, mas também no Facebook, no Twitter e no WhatsApp
Por volta do meio-dia de uma sexta-feira recente, o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles chegou a uma casa espaçosa no Lago Sul, bairro nobre de Brasília, para gravar programas de televisão para sua campanha à Presidência pelo MDB. Sorridente, com um elegante terno azul-marinho, cumprimentou todos os presentes com um aperto de mão e se enclausurou com seus dois marqueteiros em uma sala no segundo andar. Criadores do slogan “Chama o Meirelles”, os marqueteiros são Chico Mendez, que se tornou conhecido pelo trabalho bem-sucedido na eleição do petista Fernando Pimentel para o governo de Minas Gerais em 2014, e Paulo Vasconcelos, que trabalhou nas campanhas presidenciais de Lula, em 2002, e de Aécio Neves, em 2014.
Por três horas e meia, Meirelles revisou o texto para a gravação do dia, sempre interrompido por ligações e mensagens. Nesse intervalo, dezenas de funcionários aproveitaram para almoçar panqueca, salada e peixe frito. Era um time de cerca de 70 pessoas, entre assessores, publicitários, fotógrafos, editores de imagem, cinegrafistas, designers e músicos. “Hoje não tem mais agenda, então o Henrique aproveita, fica conversando com o pessoal o dia inteiro”, disse um deles. Alguns tocavam guitarra para passar o tempo. Um militante do MDB lamentou não poder usar como piscina o espelho d’água que ocupa boa parte do quintal da casa alugada.
Meirelles ainda respondia a mensagens quando, já no estúdio, recebeu várias camadas de pó para evitar o brilho na careca e nas bochechas. Com uma camisa recémpassada, corretivo nos olhos e os pequenos tufos de cabelo escovados para não aparecerem no filme, leu a fala no TelePrompTer com uma pronúncia espaçada, diferentemente de quando anunciava o aumento da Selic. “Conhece aquele ditado ‘falar é fácil, difícil é fazer’? A eleição é um momento perfeito para as pessoas se lembrarem dele porque, de uma hora para outra, surge solução para tudo”, disse encarando a câmera.
Foi alertado para não franzir a testa — logo antes de receber mais pó entre as sobrancelhas — e incentivado a gesticular para ganhar ênfase. O mérito da dicção mais escorreita é da fonoaudióloga Leny Kyrillos, que também atende Marina Silva. Ainda há deslizes, porém. Meirelles pronunciou uma pergunta como afirmação e trocou “mundos e fundos” por “muitos e fundos”. Paciente, repetiu as falas a pedido dos diretores e reclamou, brincando, por não poder falar com sotaque goiano.
O candidato ainda teve tempo para chamar Mendez de lado e cochichar os últimos palpites no texto. “Não gosto desta referência aos Estados Unidos. Lá é uma coisa, aqui é outra. Vamos tirar?” Seu tom foi calmo e discreto. Disse que só fala no programa o que “realmente acredita”. “É apaixonante trabalhar com ele”, comentou Paulo Vasconcelos. “Ele nunca te repreende em público. Quando discorda de algo, te chama numa sala para conversar. Nunca trabalhamos com ninguém assim.”
Meirelles já tirou do bolso mais de R$ 40 milhões para propaganda, produção de TV e comunicação. Ainda assim, tem 2% de intenções de voto do eleitorado, apesar de contar com o terceiro maior tempo de televisão entre os candidatos: um minuto e 55 segundos. É o maior investimento entre todos os candidatos à Presidência. Cada um deles poderá gastar no primeiro turno, no máximo, R$ 70 milhões. Quando foi criado o fundo especial para financiamento eleitoral, em 2017, a lei previa também um teto para o autofinanciamento, que foi vetado pelo presidente Michel Temer. A nova regra “permite independência”, na opinião de Meirelles. “Posso fazer uma campanha sem assumir compromisso com ninguém, só com o eleitor. É resultado de minha carreira, de fazer as coisas bem feitas, ter tido sucesso, trabalhado duro a vida inteira. Optei por investir no que eu considero ser um benefício para o povo brasileiro.”
Com doações empresariais proibidas desde 2015, agora os candidatos dependem do Fundo Eleitoral, mais graúdo quanto maior for a bancada da coligação no Congresso Nacional, e de doações de pessoas físicas. O novo cenário levou a uma queda generalizada nas receitas dos marqueteiros. Se, em 2014, o gasto total dos presidenciáveis foi de R$ 652 milhões — sendo que R$ 350 milhões foram gastos por Dilma Rousseff, e R$ 227 milhões por Aécio —, neste ano fo-
Os gastos com marketing somam, até agora, R$ 123 milhões — um quinto das despesas de eleições presidenciais anteriores ram contratados até agora R$ 123 milhões, apenas 20% do valor das eleições anteriores, considerando o reajuste da inflação.
Na campanha petista de 2018, financiada quase integralmente com R$ 20 milhões do Fundo Público Eleitoral, os programas são gravados em uma produtora de São Paulo, a M. Romano Comunicações. Com 200 funcionários para fazer peças para a internet e a televisão, foi contratada por R$ 7,4 milhões, um décimo do que se cobrou nas eleições passadas. À frente dos programas estão os publicitários Raul Rabelo, que já trabalhou com Sidônio Palmeira, marqueteiro baiano, e Otávio Antunes, coordenador de marketing da campanha. São os autores do jingle-forró “Chama, chama que o homem dá jeito”, adaptado depois para “O 13 dá jeito” e, finalmente, “O Haddad dá jeito”. O slogan “É o Brasil feliz de novo” tenta embalar a campanha com a nostalgia pelos tempos de crescimento econômico do governo Lula. A estratégia foi associar Haddad a Lula o máximo possível.
Apesar de a campanha ser tocada quase inteiramente por militantes, no início de setembro um atraso nos pagamentos de cerca de 30 pessoas levou alguns funcionários da produtora a cruzarem os braços por dois dias. A campanha teve de mudar de CNPJ para transferir a prestação de contas de Lula para Haddad, o que causou uma confusão nas transferências. As alterações constantes nos programas devido às restrições impostas pela Justiça eleitoral à figura de Lula imprimiram um ritmo frenético de trabalho nas primeiras semanas. “Mas a gente é muito militante, então faz com muito amor”, disse-me um integrante da equipe.
O baiano Sidônio Palmeira, último nome conhecido do marketing político que sobrou no partido, enaltece o espírito jovem dos profissionais que trabalham com a produção do PT neste ano. “É como em um time de futebol. É importante ter o novo para ter energia. O cara que é novo quer crescer, quer fazer.” Ele não tem envolvimento com a equipe paulista,
já que está trabalhando na campanha de Rui Costa para o governo da Bahia. É das mais baratas que já fez, disse o publicitário. Em entrevista por telefone, Palmeira falou, em tom exaltado, contra superproduções de TV e candidatos que usam TelePrompTer. “Deixa o cara falar emocionalmente, p..., deixa o cara falar naturalmente, de forma coloquial, aí costura em torno disso.”
A nova forma de trabalhar é melhor que “aquela onda de marqueteiro” que havia antes, afirmou Palmeira. Ele ainda não sabe se vai trabalhar na campanha presidencial se Rui Costa vencer no primeiro turno, como indicam as pesquisas. “O povo que diz que é marqueteiro quer aparecer mais que o candidato. Não é só o PT que deveria fazer campanha barata, são todos os partidos. Não dá para passar a ideia com menos dinheiro? Claro que dá. O povo não consegue entender? Precisa ter aquele Império Romano, um nome, um marqueteiro? Não. As pessoas têm de trabalhar em conjunto para valorizar o candidato.”
Hoje, pensar dessa maneira é uma opção conveniente, já que João Santana e Duda Mendonça, nomes associados às produções milionárias do partido, foram condenados criminalmente. No caso de Santana, as irregularidades começaram na mesma mansão brasiliense usada, neste ano, por Henrique Meirelles. Quando gravava lá os programas para a campanha de reeleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006, Santana se queixou duas vezes ao presidente de que não estava recebendo os pagamentos — pelo menos foi o que ele disse em acordo de delação premiada, em março de 2017. Naquela época, o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci o instruiu a receber caixa dois por meio de uma conta no exterior, contou.
Com as novas regras de financiamento eleitoral, muitos candidatos contrataram equipes de vídeo reduzidas ou apelaram para gravações com celular
Com a delação, João Santana e sua mulher, Mônica, tornaram-se criminosos. Foram condenados a uma multa de R$ 3 milhões cada um e a prisão domiciliar por um ano e meio em um condomínio luxuoso a beira da praia, em Camaçari, na Bahia. O casal foi transferido para lá em outubro do ano passado. Eles devem se recolher a sua residência à noite e aos sábados, domingos e feriados, mas podem viajar a trabalho durante a semana, desde que não deixem o país. Também devem prestar 22 horas mensais de serviços comunitários. Findo esse período, deverão cumprir um ano de regime aberto, com exigências ainda menores — poderão sair de casa de madrugada e realizar viagens internacionais.
Antes de trabalhar com marketing político, Santana foi jornalista, uma diferença em relação a seu mentor, Duda Mendonça, que também fez delação à Operação Lava Jato em 2017. Publicitário, Mendonça enveredou pelo marketing político graças ao sucesso de sua agência, a DM9. Suas peças mais famosas de 2002 apelavam para a emoção, como as “grávidas do Lula”, em que mulheres grávidas pediam voto no PT pelo futuro do Brasil ao som do Bolero de Ravel e com locução de Chico Buarque; e outra em que um adolescente, João, dizia que estava entrando na faculdade e gritava, no fim do vídeo, “viva Luiz Inácio Lula da Silva”. O último filme fez tanto sucesso que foi reciclado pela campanha petista neste ano. Um estudante chamado Matheus discursa sobre sua formação e, no fim, saúda, novamente, o nome completo de Lula.
Para Santana, mais pragmático, a prioridade era a vitória na guerra de informação. O exemplo mais emblemático é a propaganda que mostrava comida desaparecendo de um jantar de família como consequência da independência do Banco Central, defendida por Marina Silva em 2014. Em outro anúncio, uma mãe fazia compras na farmácia segurando um bebê e via, através da vidraça, uma versão pobre de si mesma. O tema eram os “fantasmas do passado”, uma alusão aos governos dos tucanos — na propaganda de Santana, se Aécio vencesse, eles voltariam. Antes do auge da crise econômica, a propaganda ainda podia ser vista sem ser considerada estelionato eleitoral.
“Houve uma mistificação dos marqueteiros”, afirmou José Crispiniano, coordenador de comunicação da campanha petista. “Eles também são publicitários de si mesmos. Agora estamos trabalhando um pouco diferente. Os recursos digitais permitem fazer mais com menos recursos.” A estimativa é que os gastos da campanha petista não cheguem a R$ 50 milhões. Para um grupo do núcleo duro petista, os tempos áureos de João Santana são lembrados com lamento. “Saímos do João para o terceiro do Sidônio. É difícil”, disse um petista paulista a ÉPOCA.
O jornalista Manoel Canabarro, escolhido por Ciro Gomes nesta disputa presidencial, também é pupilo de Mendonça. Mais do que isso, é uma solução caseira, já que aconselha Ciro e seu irmão, Cid Gomes, há uma década. Com pouco tempo de televisão, Ciro Gomes apelou para as mídias sociais, onde tem fãs cativos. Assim como outros candidatos com muitos seguidores, não precisa pagar para ter o impulsionamento nas redes sociais — basta usar sua equipe para produzir vídeos mais curtos e diretos para a web e falar diretamente com seu público.
A reportagem perguntou ao cineasta Fernando Meirelles, voluntário na campanha de Marina Silva, qual é sua opinião sobre os valores inflacionados cobrados pelos marqueteiros das eleições anteriores. São necessários R$ 70 milhões para produzir vídeos para uma campanha presidencial, como João Santana recebeu de Dilma em 2014? “‘Inflacionado’ é de uma delicadeza ímpar”, respondeu Meirelles, por e-mail. “Aquilo lá foi crime mesmo, com condenação e prisão. Com o salário do Santana, dava para produzir todas as campanhas de todos os partidos este ano.”
Segundo Fernando Meirelles, a ideia de que um publicitário possa mudar o resultado de uma eleição é parcialmente falsa. “Alguém que sabe lidar com imagem, reforçar pontos positivos e jogar para baixo do tapete os negativos pode ajudar, mas o carisma do candidato parece ser o que decide.” Não à toa, afirmou, Lula é um “superstar” e Henrique Meirelles e Alckmin não decolam. “Independentemente de (os dois últimos) serem competentes ou não, para o eleitor são sem graça. Não vieram com o software do carisma, e aí não há publicitário que resolva. Fatalidade.”
A campanha de Alckmin tem sofrido, de fato, para dar os golpes de marketing político usuais. O marqueteiro encarregado da campanha é Lula Guimarães, responsável pela campanha de João Doria à prefeitura de São Paulo. Na pré-campanha, Alckmin se uniu com os partidos do centrão — PP, PR, PRB, DEM e Solidariedade — para ganhar tempo de televisão. Com cinco minutos e 32 segundos, mais que o dobro do que dispõe Fernando Haddad, do PT, o segundo em tempo, e R$ 44 milhões de Fundo Eleitoral, acreditava-se que o tucano cresceria e tomaria o lugar de Bolsonaro nas pesquisas. A previsão, repetida com confiança por diversos marqueteiros ouvidos para esta reportagem, provou-se jurássica. Mesmo sem TV e internado em um leito de hospital, Bolsonaro manteve seu eleitorado cativo com suas redes sociais e cresceu ainda mais.
O resultado foi uma progressão de agressividade. A primeira propaganda de Alckmin, conceitual, dizia que os problemas do país não se resolvem na bala, ao som de música clássica (soube-se depois que a peça era uma cópia despudorada de uma propaganda inglesa). Em seguida, Bolsonaro foi acusado de agredir mulheres, de ter algo “contra pobre” e, por fim, de ser o Hugo Chávez brasileiro. No começo, Alckmin não dava as caras para detonar o concorrente. Isso mudou ao longo do tempo. Em programa que foi ao ar na semana passada, o tucano disse que o capitão é “um despreparado, que representa um verdadeiro salto no escuro”, “já mostrou simpatia por ditadores” e “já defendeu o uso da tortura”, e que o PT, por outro lado, é “radical e extremista” e “foi envolvido no maior esquema de corrupção do mundo”.
O resultado dessa pancadaria diária tem sido inócuo para o tucano, embora ela esteja ajudando a manter Bolsonaro no topo dos candidatos mais rejeitados pelos eleitores. Por causa dessa propaganda negativa, Lula Guimarães foi comparado a João Santana, mas sua estratégia não afetou o adversário de Alckmin como Santana atingiu Marina Silva em 2014. Provou-se que já não faz mais sentido convencer o eleitor só com a TV. A aposta de Alckmin em outras mídias foi tão modesta que sua equipe de redes sociais tem 50 pessoas. Em 2014, numa campanha menos digital, Aécio tinha 250 pessoas.
“A estrutura era muito maior que o necessário”, afirmou Antonio Risério, escritor que trabalhou na campanha de Lula em 2002 e 2006 e, depois, com Eduardo Campos e Marina Silva em 2014. “O marketing político foi o casamento do alto nível tecnológico com o baixo nível ético. Os salários eram astronômicos. O ideal seria que a gente voltasse a ter políticos se dirigindo à população, dizendo suas propostas, mas continuamos com os mesmos cacoetes e vícios daquela época, só que sem dinheiro e sem aparatos tecnológicos. Os mesmos princípios, mas sem talento e sem dinheiro.”
Lula Guimarães, segundo Risério, é “louco” por Duda Mendonça. Os dois se conheceram na campanha de Campos e Marina Silva, em 2014. “Eu o chamo de Lula Mendonça, ele me odeia por causa disso. Uma vez tivemos uma reunião e ele citou umas dez vezes o livro de Duda (Casos e coisas), eu tive de interromper e dizer: ‘Lula, pare de citar isso para mim, quem escreveu esse livro fui eu’. O Duda é um analfabeto, só assinou.” Apesar disso, Duda Mendonça “tem um grande talento”, ressalva Risério, que hoje saiu do ramo do marketing. “Duda é excepcionalmente criativo, muito mais do que o João Santana. Mas o João é um cara muito mais sólido, lê, pesquisa.”
O consultor político Bruno Hoffmann lamenta que os grandes marqueteiros “não estejam por aí dando aulas, escrevendo sobre suas técnicas”. Para se opor ao que ele chama de “demonização” de sua profissão, Hoffmann criou o Clube Associativo dos Profissionais de Marketing Político (Camp). “Durante o horário político, é preciso de estrutura para dar respostas muito rápidas. Colocar os marqueteiros como vilões é falacioso. Não são R$ 10 milhões que vão para o bolso de alguém porque teve uma ideia brilhante. Esse dinheiro está pagando um exército de pessoas necessárias para a democracia. Se não fosse pelo nosso trabalho criativo, as pessoas se relacionariam muito menos com política.”
Com a nova regra de financiamento eleitoral, quem trabalha em campanhas para candidatos com menos verbas sofreu para conseguir aprovar orçamentos nestas eleições. Muitos candidatos contrataram soluções baratas de vídeo, com equipes reduzidas, ou até fizeram gravações com o celular, como Paulo Skaf (MDB), candidato a governador de São Paulo. Um marqueteiro ouvido pela reportagem orçou a coordenação digital para uma campanha a governador de estado em R$ 300 mil. Perdeu para um concorrente que ofereceu o mesmo serviço por 10% do valor.
A reforma do financiamento eleitoral que proibiu doações empresariais e estabeleceu limites para gastos partiu do pressuposto de que política é algo ruim, disse Darlan Campos, publicitário do Espírito Santo. “Agora temos de ser mais criativos, com menos dinheiro. Antes, era como matar uma barata com uma bazuca”, comparou. Para Fernando Tembra, que trabalha na tesouraria da campanha de Meirelles, no entanto, as campanhas eleitorais, antes das novas regras, pareciam com o mercado de casamentos. “Vai comprar um bolo? Custa R$ 1.000. É para eleição? Custa R$ 5 mil.”
O publicitário Paulo de Tarso, marqueteiro de Lula em 1989 e 1994, conhecido pelo jingle “Lula lá”, foi uma das vítimas das vacas magras. Ele teve de abandonar a campanha à reeleição de Márcio França (PSB), governador de São Paulo, quando se constatou que seu serviço era mais caro do que o candidato poderia pagar. Antes de o PSB se declarar neutro na eleição presidencial, havia uma perspectiva de aliança com o PSDB que poderia render uma verba extra para a campanha de França. Mas, como a aliança não ocorreu, o marqueteiro teve de sair da campanha. As despesas de França são de, até agora, R$ 2,2 milhões.
O atraso na distribuição do Fundo Eleitoral fez com que muitos candidatos não pudessem imprimir material e começassem a produzir programas de TV só às vésperas do início da campanha. “Muitos começaram a gravar apenas uma semana antes da estreia dos programas”, afirmou Tarso. A essa altura, em eleições anteriores, os candidatos já estavam com as equipes na rua, fazendo pesquisas. “Agora não são mais equipes, é equipe. Pela minha experiência, o que está acontecendo agora é o caos. Boa parte das campanhas não soube quanto podia investir até a última hora, está atrasada com os profissionais que já estão trabalhando.” Após se retirar da campanha de França — que, frisa, foi “legal comigo” —, Tarso passou a trabalhar só na campanha do ex-juiz federal Odilon Oliveira (PDT) a governador em Mato Grosso do Sul e na do ex-governador Marconi Perillo (PSDB) ao Senado em Goiás.
De todos os presidenciáveis, o que mais se prejudicou com a falta de verba foi Marina Silva. “Fizemos todos os programas em um dia só, um domingo”, disse o coordenador de comunicação da campanha da candidata, Claudio Angelo. “Ficamos das 3 da tarde à meia-noite em um estúdio em São Paulo gravando 14 comerciais. Tivemos de fazer essa maratona porque não temos dinheiro para pagar as diárias do estúdio”, afirmou. Marina Silva recebeu R$ 5,3 milhões de Fundo Público Eleitoral, mas havia gasto menos do que isso até a última semana.
Apesar da aversão a marqueteiros, a campanha da candidata da Rede recorreu a alguns truques de gestão de imagem, que, pelos últimos resultados das pesquisas de intenção de voto, parecem não ter funcionado. A ex-senadora mudou o penteado, usou roupas mais despojadas e tentou assumir uma postura mais agressiva nos debates. Quase sem tempo de televisão, apelou para transmissões nas redes sociais. Ao contrário de candidatos que usam as redes o ano todo, como Ciro Gomes e Bolsonaro, o engajamento conseguido por Marina Silva é pífio. O jogo mudou e, para ganhar seguidores, é preciso aumentar o volume da gritaria não só nos debates, mas também no Facebook, no Twitter e no WhatsApp. Quem precisa de marqueteiro para isso?
Para conquistar hoje o eleitor, é preciso fazer barulho não apenas nos debates, mas também no Facebook, no Twitter e no WhatsApp
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