BroadcastEnergia
20:15 25/08/2021
Décio Oddone: O impacto das inovações no planejamento de longo prazo
Na semana passada ocorreu a edição de 2021 da Offshore Technology Conference - OTC, a maior feira da indústria do petróleo, realizada em Houston, nos EUA. Após ser cancelado em 2020, por causa da pandemia, o evento foi híbrido, com parte dos participantes entrando de forma virtual.
A realização de um encontro desse porte indica que, apesar das complicações trazidas pelas variantes do coronavírus, com o progresso da vacinação, a normalidade começa a aparecer no horizonte.
Como sempre, os avanços tecnológicos ocuparam boa parte da agenda. Impressionam o desenvolvimento alcançado na produção de petróleo offshore e a redução nos custos. A Petrobras recebeu o prêmio, que seria entregue em 2020, pelas inovações aplicadas ao campo de Búzios. Foi a quarta vez que a empresa foi escolhida para receber o maior reconhecimento da indústria. Já tinha ocorrido em 1992 por Marlim, em 2001 por Roncador e em 2015 pelo conjunto dos projetos no pré-sal da Bacia de Santos.
Os desenvolvimentos tecnológicos permitiram a produção de petróleo no mar e a tornaram cada vez mais competitiva. Há dez anos se calculava que o custo de produção no pré-sal estaria acima de US$ 50 por barril. Com o avanço dos trabalhos, esse valor foi caindo. Na mesma OTC, em 2017, se falava em custos na casa dos US$ 30. Hoje há projetos em que os valores podem ser menores.
Mas a tecnologia e as inovações não reduziram somente os custos da produção offshore. Vêm produzindo uma revolução na indústria como um todo. O gás natural liquefeito (GNL) transformou os mercados de gás. O crescimento da produção no shale (petróleo não convencional) nos Estados Unidos é um exemplo típico da aplicação de tecnologias, algumas delas em uso há anos, de forma inovadora.
Durante décadas os ciclos de preço de petróleo foram longos, favorecendo o planejamento das empresas e a aprovação de projetos de elevado prazo de maturação, como os de produção de petróleo em águas profundas em províncias como o pré-sal das Bacias de Campos e Santos e de exploração em regiões de fronteira, como a margem equatorial brasileira. A partir do surgimento do fenômeno do shale, os ciclos de preço têm ficado mais curtos. A covid-19 e a aceleração da transição energética tendem a reforçar essa tendência, dificultando o planejamento de empresas e governos.
O uso de tecnologias e inovações, das mais complexas às mais simples, dos desenvolvimentos de materiais às práticas de gestão e administração, é a principal razão para a diminuição dos custos de produção. Não só de petróleo e gás natural. É conhecida a redução dos gastos com instalações de painéis fotovoltaicos e aerogeradores, que permitiram um avanço extraordinário na penetração da energia solar e eólica nos últimos anos. Por isso, as inovações e os ganhos de eficiência também acabam afetando o planejamento de companhias e países.
No final dos anos 1980, a perfuração de um poço vertical em águas profundas levava mais de dois meses. O desenvolvimento dos campos demandava poços direcionais, que nunca tinham sido feitos. As estimativas iniciais de duração não se concretizaram. As operações tomaram menos tempo que o programado.
Algo similar, em escala muito maior, vem ocorrendo no pré-sal. A duração e a produtividade dos poços têm sido uma surpresa positiva. Hoje são perfurados e completados em uma fração do tempo originalmente estimado. A produção tem sido muito superior à esperada inicialmente. Como resultado, uma plataforma que poderia operar com 10 ou 15 poços está recebendo três ou quatro. Isso foi excelente para as empresas de petróleo, que investem menos e têm melhor rentabilidade, e para os governos, que arrecadam mais. Mas foi uma má notícia para a cadeia de fornecedores. É necessário um número menor de equipamentos e serviços, como árvores de natal, válvulas, umbilicais, sondas de perfuração e barcos de lançamento de linhas.
Se a Petrobras tivesse contratado mais de 20 sondas para perfurar no pré-sal, como pensou no início da década passada, possivelmente teria equipamentos ociosos agora. Fornecedores que executaram um planejamento estático, sem antecipar potenciais impactos de avanços tecnológicos e ganhos de produtividade, se frustraram.
A transição para uma economia de mais baixo carbono, para ser bem sucedida e melhorar o acesso à eletricidade e a qualidade de vida das populações, precisa se dar com maior oferta de energia. O impacto já produzido pelas inovações e pelo aumento da produtividade na indústria do petróleo e gás natural e nas fontes renováveis é um exemplo do que está por vir. As principais contribuições para a redução da presença de CO² na atmosfera devem vir de inovações disruptivas, novas tecnologias e ganhos de escala e eficiência. Países e empresas devem levar isso em conta ao executar seu planejamento de longo prazo.
*Décio Fabrício Oddone da Costa é engenheiro e CEO da Enauta S.A. Escreve mensalmente para o Broadcast Energia.
Broadcast Energia
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