quinta-feira, 3 de junho de 2021

Mais Estado, menos barris(Décio Oddone, O Globo, 3 6 21)

 

Mais Estado, menos barris

COLUNISTAS

quinta-feira, 3 de junho de 2021 

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DÉCIO ODDONE

Intervenções fazem parte da história do petróleo na América Latina. Em 1922, o General Mosconi assumiu a argentina YPF. Defendia o monopólio e influenciou outros países.

O México logo estatizou. Agora, a produção vem caindo. Baixou de 3,5 milhões de barris por dia para 1,7 milhão. Mesmo assim, a abertura da década passada está sendo revertida. A Bolívia criou a YPFB. Décadas depois nacionalizou a Gulf. Em 2006, renegociou contratos de empresas como a Petrobras. As medidas não produziram bons resultados. As reservas despencaram, e há dificuldade em manter as exportações. A Colômbia fundou a Ecopetrol e reverteu concessões. Em 1970, a produção era de 200 mil barris. Subiu para 1 milhão com a criação do órgão regulador e a abertura do capital da estatal. O Equador estabeleceu a Cepe, depois Petroecuador. Chegou a fazer parte da Opep, mas a produção estagnou. A Venezuela nacionalizou em 1976. A extração caiu de 3,5 milhões para 1,5 milhão de barris. Voltou a crescer quando atraiu empresas para investir. Veio a intervenção bolivariana. A produção despencou para menos de meio milhão. A Argentina abriu nos anos 1990. AYPF foi privatizada. A produção dobrou, chegando a 900 mil barris. A partir de 2001, o ambiente mudou. A empresa acabou reestatizada. A extração caiu para 450 mil barris.

A Petrobras e o monopólio resultaram da campanha "o petróleo é nosso". Em 1979, a produção não batia 200 mil barris. A internacionalização da estatal e os contratos de risco possibilitaram a modernização e as descobertas que levaram o volume a 1milhão de barris. O fim do monopólio e os leilões abriram caminho para a entrada de capitais e para o advento do pré-sal. As políticas adotadas em seguida conduziram à crise, quando o preço caiu. Investimentos e a extração nas bacias maduras despencaram. Novas medidas permitiram a retomada. A produção superou 3 milhões de barris em 2020.

Os exemplos mostram que intervenções estatais geralmente causaram queda na produção. Quando as atividades se davam em poços rasos, em terra, os efeitos eram mais tênues ou lentos. O quadro se alterou quando as operações passaram a demandar mais capital e tecnologia.

A Agência Internacional de Energia divulgou um cenário segundo o qual não haveria necessidade de novos projetos de óleo e gás. E mais um indício de que a disputa por investimentos será cada vez mais acirrada. Como há quem continue defendendo o domínio estatal no setor, é preciso recordar que a politização do petróleo gerou mais perdas que benefícios. Raramente trouxe os resultados prometidos. Além de privilégios, produziu dividendos políticos efêmeros e duvidosos, seguidos de desajustes estruturais, jamais soluções duradouras.

Com a transição energética, os hidrocarbonetos perderão relevância. Para se beneficiar da janela de oportunidade e extraí-los, o país deve superar essa discussão e atrair mais investimentos. Logo, ou o petróleo, como no antigo slogan, continuará eternamente nosso, abandonado nas entranhas do subsolo.

Politização do petróleo gerou mais perdas que benefícios. Raramente trouxe os resultados prometidos

Décio Oddone, engenheiro, é CEO da Enauta e foi diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo

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