quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

Banco já se prepara para ser alvo de auditorias no próximo governo (Valor Econômico)


VALOR
19out18

Banco já se prepara para ser alvo de auditorias no próximo governo
Por Francisco Góes | Do Rio

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) vem se preparando, internamente, para a transição de governo em um cenário em que a instituição deverá ser alvo, novamente, de investigações e de auditorias. A promessa de devassa no BNDES em um eventual governo de Jair Bolsonaro, conforme publicado nesta semana pelo Valor, não inquieta os técnicos do banco, que, desde 2015, vêm sendo submetidos a um escrutínio público permanente. Na coordenação de campanha de Bolsonaro, porém, há o entendimento de que a sociedade brasileira ainda não está satisfeita com as apurações realizadas envolvendo o banco.

Técnicos da instituição dizem que há reconhecimento, por parte de órgãos de controle externo e da área econômica do governo, de que o banco evoluiu em termos de transparência e foco de atuação. O BNDES argumenta que tem níveis de transparência elevados na comparação com outras instituições de fomento, casos do Nafin (México), BDC (Canadá), KfW (Alemanha), ICO (Espanha) e JFC (Japão).

O BNDES afirma que disponibiliza relatórios anuais na internet, tem Portal de Transparência com requisição de informação e possui estatísticas detalhadas on-line com identificação do cliente. Na área de mercado de capitais, o banco divulga uma série de informações e pretende ampliar esse conteúdo com dados sobre valores investidos, retorno geral da carteira e desinvestimentos feitos.

No caso do apoio à produtora de proteínas JBS, o banco instaurou uma comissão de apuração interna e não identificou nenhum fato relevante. Para aprofundar as investigações e dar maior segurança às informações financeiras do banco, auditadas pela KPMG e pela Grant Thornton, o BNDES contratou uma auditoria internacional independente, que está sendo conduzida pelos escritórios Cleary Gottlieb Steen & Hamilton LLP, dos EUA, e o brasileiro Levy & Salomão. Há informações de que essa auditoria possa estar concluída no mês que vem.

Na visão de integrantes da coordenação de campanha de Bolsonaro, o que se espera no BNDES, no próximo governo, é uma "investigação isenta". "Tem que fazer uma análise do que foi investigado e, se houver lacunas, aprofundar a investigação. Se não houver lacunas, se tudo foi coberto, é preciso dar maior transparência às informações", disse uma fonte. Para o interlocutor, as investigações feitas até agora não são suficientes. "As CPIs [sobre o BNDES] têm tom político, e as ações do TCU [Tribunal de Contas da União] e do Ministério Público trabalham com informações selecionadas [sem ver o quadro geral do banco]", disse a fonte.

Desde 2015, o BNDES foi objeto de três Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) no Congresso; tornou-se alvo da Operação Bullish, da Polícia Federal, relacionada às relações do banco com a JBS; e enfrenta 88 processos administrativos no TCU que analisam operações do banco nas áreas de mercado de capitais, exportações, benefícios de recursos humanos e o relacionamento da instituição com o Tesouro, no âmbito das chamadas "pedaladas" fiscais.

Todo esse conjunto de investigações não resultou, no entanto, até o momento em funcionários do banco denunciados pela Justiça. No caso da JBS, houve o indiciamento, pela PF, do ex-presidente do banco Luciano Coutinho e de um ex-superintendente, Caio Melo, que está licenciado. Isso não impede, porém, que seus servidores continuem com medo de tomar decisões, sob risco de serem posteriormente responsabilizados pelo TCU. "Vive-se uma situação em que o gestor público [do BNDES] prefere não assinar nada", disse um técnico. Há, por outra parte, demandas para que o banco assuma riscos em projetos e atue nas "falhas de mercado".

No TCU, está a fonte maior de preocupação dos técnicos do BNDES. O receio deve-se ao fato de que os processos administrativos podem responsabilizar os servidores na pessoa física caso as decisões do tribunal concluam por dolo ao erário, por exemplo. Em casos em que o processo se transforma em Tomada de Contas Especial (TCE), há risco de bloqueio de bens pessoais dos funcionários. Dos 88 processos administrativos envolvendo o BNDES no TCU, 12 se transformaram em TCEs. Ao todo, mais de 200 empregados foram envolvidos nesses processos e 120 estão sendo responsabilizados em tomadas de contas individualizadas. Há ainda 66 pessoas respondendo por danos ao erário nos processos do TCU. Mesmo com a abertura de TCEs, cabe recurso antes de uma decisão final do tribunal. Os técnicos do banco entendem que é preciso criar um marco regulatório que dê segurança para o servidor tomar decisões e não ser posteriormente punido, mesmo que tenha atuado dentro da lei e das regras.

Na transição de governo, o banco também trabalha na produção de um "kit BNDES", formado por 23 documentos com resumos dos diferentes setores atendidos pela instituição. O "kit BNDES" busca dar visibilidade sobre três pilares: financeiro e crédito, planejamento estratégico e medidas para setores e para o país.

BNDES tem R$ 50 bi para infraestrutura
Por Claudia Safatle

Depois de chegar ao fundo do poço, o BNDES está preparado para dobrar e liderar os investimentos em infraestrutura no próximo ano, assegurou o diretor de Infraestrutura e Saneamento do banco, Marcos Ferrari. O pico da atuação na infraestrutura foi em 2014, quando os desembolsos chegaram a R$ 69 bilhões. O "cavalo de pau" foi dado em 2016, com a queda para R$ 26 bilhões. Em 2017 e 2018 a cifra se estabilizou em R$ 27 bilhões.

A instituição, agora, está pronta para retomar, nos próximos três anos, a média histórica de 2% do PIB - cerca de R$ 130 bilhões - de desembolsos anuais, sendo que desses, R$ 50 bilhões podem ser destinados à expansão da infraestrutura no país a partir de 2019, disse o diretor.

Ferrari explicou que, quando fala em liderança, está se referindo não aos desembolsos de operações tradicionais, mas à estruturação de projetos e ao fomento do mercado de capitais com garantias e fianças, dentre outros recursos, que o banco está ofertando.

Tomando como ótimo o estoque de infraestrutura de 60% do PIB que o país registrava nos anos de 1980, a situação hoje beira a calamidade. O estoque é de pouco mais de 30% do PIB. Entre os anos de 1970 e 1980, o país investia o equivalente a 5,4% do PIB. Hoje o investimento na expansão de rodovias, energia, telecomunicações, saneamento, dentre outras áreas, não passa de 2% do PIB.

Para o país voltar a ter um estoque de 60% do PIB até 2035, a taxa de investimento necessária varia de 4,5% do PIB a 5,3% do PIB, dependendo do crescimento econômico médio do período, de 1% a 3%, respectivamente.

Traduzindo em miúdos, o Brasil precisa aumentar o investimento em infraestrutura em cerca de R$ 150 bilhões por ano, conforme exposição recente do diretor do BNDES na Abdib (Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústria de Base).

Há espaço, portanto, para o BNDES atuar em duas frentes: no mercado de dívida e no mercado de capitais, retomando o crescimento do crédito tradicional e, ao mesmo tempo, estimulando as operações no mercado de capitais, salientou Ferrari.

O banco voltou a operar com fiança, que havia parado de oferecer há 20 anos. A fiança pode chegar a 100% do valor do financiamento ou da emissão de debêntures. Outra alternativa é o fundo de crédito em infraestrutura, pelo qual o BNDES participa da ancoragem de emissões privadas mediante proposta firme de compra de 50%, por exemplo, de uma emissão. Assim, o banco viabiliza a participação dos fundos de pensão, já que esses investidores não podem comprar debêntures diretamente do emissor.

Tudo indica que não faltarão recursos para a expansão das obras de infraestrutura no país, desde que haja regras claras e uma regulação de boa qualidade. Hoje o caixa da instituição é de R$ 140 bilhões que não foram emprestados por absoluta falta de demanda.

Um problema que aparece no radar é de outra natureza. Há dinheiro, mas não há uma lista de novos e bons projetos na carteira do banco. Esse é um drama que já se coloca para 2019 e para o qual o presidente da instituição, Dyogo de Oliveira, tem chamado a atenção.

O diretor de Infraestrutura e Saneamento foi encarregado de preparar a transição no BNDES e já está listando as medidas que deveriam ter sido tomadas pelo atual governo e que, por razões diversas, não foram, para que a próxima administração as adote.

Dentre elas, ele destaca a sugestão para que se reduza os dividendos que o BNDES repassa anualmente ao Tesouro Nacional dos atuais 60% do resultado do banco para 25%. Sem isso não será possível retomar a média histórica de 2% do PIB de desembolsos da instituição de fomento.

Outra iniciativa que ele chama a atenção para que seja adotada é a assinatura do decreto de relicitação das concessões que não deram certo. Um exemplo clássico é a do aeroporto de Viracopos, cujas condições objetivas previstas no contrato não aconteceram. Em 2016 o consórcio pediu o reequilíbrio do contrato, mas, por alguma razão desconhecida, a agência reguladora não decidiu, restringindo-se a aplicação de multas. Situação esdrúxula que levou os investidores a entrarem em recuperação judicial.

Uma terceira sugestão para o próximo governo é a de que ele retire as empresas estatais estaduais e municipais "não dependentes" do limite estabelecido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) de crédito bancário ao setor público sem garantia da União. Os bancos federais podem emprestar aos entes públicos até R$ 24 bilhões, sendo que desses, R$ 17 bilhões têm garantias da União e os R$ 7 bilhões restantes não têm tais garantias. Ocorre que as estatais estaduais não raro têm rating melhor do que os Estados.

Após jorrar dinheiro público caro para emprestar barato às campeãs nacionais nos governos do PT, o BNDES se reestruturou, devolveu uma montanha de dinheiro para o Tesouro Nacional e, ao que parece, está arrumado para começar um novo capítulo na história do desenvolvimento econômico do país.

@BNDES @BRASIL @ECONOMIA

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