Na crise, fundos imobiliários de logística e residenciais ganham apelo
Investimentos Segmento de shopping tende a ser um dos mais prejudicados pós-covid-19
Segunda-feira, 25 de Maio de 2020
Sérgio Tauhata
Entender o rumo dos mercados após a pandemia é a pergunta do bilhão para grande parte dos setores. No caso do imobiliário, um dos mais impactados pelas transformações no comportamento de investidores e consumidores, saber separar as tendências das situações pontuais vai definir o sucesso das futuras apostas, ressaltam gestores ouvidos pelo Valor.
Sob a ótica dos fundos imobiliários, no curto e médio prazos, já é possível identificar vencedores e perdedores. Especialistas do setor veem algumas das estrelas do ano passado caírem por terra por conta das medidas de contenção da covid-19, caso de shopping e hotelaria.
O segmento de shoppings, por exemplo, que brilhava nos portfólios até o começo do ano diante da perspectiva de retomada da atividade econômica, perdeu as asas no período de isolamento forçado.
Sem circulação de pessoas, os centros comerciais amargam queda repentina e profunda de receitas de locação e ainda enfrentam um processo de renegociação dos valores de aluguéis para evitar uma quebradeira generalizada de lojas.
Mesmo após o fim da crise, os gestores se mostram cautelosos.
“No caso dos shoppings, a recuperação vai ser mais lenta porque tem muito lojista que não vai ter fôlego para bancar o aluguel e a vacância vai aumentar”, diz a diretora de fundos imobiliários da Rio Bravo, Anita Seal.
Além de aumento de espaços vazios nos centros comerciais, os próprios consumidores tendem a visitar menos os locais. “A circulação nos shoppings deve se reduzir [após a pandemia] porque as pessoas vão ter um certo receio de frequentar”, diz o CEO da Habitat, Eduardo Malheiros.
Outro segmento muito atingido pela covid-19, os hotéis também sofrerão com recuperação lenta após o fim da crise de saúde. “Acho que um dos maiores perdedores da pandemia é o segmento de hotelaria”, diz o sócio e diretor de risco e relações com investidores da Hectare, André Catrocchio. “Não há muita certeza como vai funcionar a volta do turismo e a ocupação dos estabelecimentos é um ponto de interrogação.”
Já entre os vencedores, dois segmentos despontam como os mais promissores: logística e residencial. O primeiro vinha em uma tendência de crescimento impulsionado pelo comércio eletrônico. Na era do isolamento social, a demanda por compras pela internet se acelerou e trouxe a reboque o interesse pelos fundos com carteira de galpões e outros ativos de logística.
Nesse cenário, muitas redes de varejo passaram a acelerar o investimento no e-commerce e até os pequenos negócios veem o “delivery” como solução para parte da queda de receitas. Com isso a necessidade de empreendimentos logísticos para armazenagem e distribuição tem subido.
Para Anita, da Rio Bravo, a perspectiva mais promissora é verdade especialmente para fundos com propriedades logísticas dentro dos grandes centros ou nas proximidades das vias de acesso dos maiores mercados. “Os fundos que tiverem ativos no ‘last rnile’ [centros de distribuição perto das cidades para entregas rápidas] estão se beneficiando do aumento do e-com-merce e tendem a manter os rendimentos estáveis ou aumentá-los.”
Após a crise, um segmento que até o momento reúne pouquíssimos portfólios, o residencial, pode se tornar uma estrela em ascensão, por conta do déficit habitacional, e que agora ficou viável por causa do nível da taxa de juros, afirma o gestor dos fundos imobiliários da Mauá Capital, Brunno Bagnariolli.
“Para o residencial funcionar a taxa de remuneração do aluguel tem de ser maior do que a taxa de juros da economia e isso no Brasil até pouco tempo não era verdade”, diz. Com a queda da Selic para o menor nível histórico e a perspectiva de se manter em um dígito no longo prazo, o investimento em fundos residenciais, com objetivo de renda, se torna possível.
O residencial ainda vai se beneficiar nos próximos anos de outros dois fatores: a pressão demográfica e o descasamento de oferta e procura. De acordo com o CEO da TG Core, Diego Siqueira, o crescimento natural da população brasileira cria uma necessidade de 1,5 milhão de novas residências por ano. “Mas produzimos em torno de 500 mil a 600 mil por ano, ou seja, temos um déficit habitacional crescente.”
A pandemia paralisou os lançamentos imobiliários, além das obras de projetos em andamento. Essa parada vai acentuar ainda mais o descompasso entre o aumento orgânico da demanda após a crise e a falta de imóveis entregues pelas incorporadoras, apontam os gestores.
“O mercado imobiliário está paralisado e, embora a perspectiva seja de que o país vá enfrenta ruma recessão fortíssima, a oferta de imóveis em São Paulo, por exemplo, já está baixa”, diz o CEO da RBR, Ricardo Almendra. “Tanto para residencial, escritórios e galpões hoje tem muito menos oferta do que tinha em 2014 e 2016. E isso tira pressão de queda sobre os preços durante a crise. Nos próximos anos, em meio à retomada, o mercado imobiliário não terá tempo para entregar todos os imóveis que os consumidores vão demandar."
O residencial também tem a tendência de passar por transformações devido à mudança de hábitos, em que muita gente vai passar mais tempo em casa, seja a trabalho ou devido a uma cautela em relação a aglomerações. Ele conta que a RBR tem um fundo que investe em prédios residenciais em Nova York, nos EUA, em que compra propriedades e reforma. “Em um dos nossos projetos, houve demanda para transformar os depósitos que cada unidade têm em escritórios. Foi a primeira adaptação no meio da pandemia com a ideia que a pessoa possa ter opção de trabalhar em casa, seja de maneira definitiva ou temporária.”
O CEO da Vitacon, Alexandre Frankel, vai além e enxerga um potencial para uma transformação radical no mercado,acelerada pela pandemia. Em sua visão, grande parte das moradias vai pertencera fundos ou investidores e as pessoas vão consumir a residência como um serviço, de modo semelhante ao que ocorreu após o surgimento dos aplicativos de transporte.
Assim como um número crescente de motoristas passou a deixar os carros na garagem ou nem mesmo ter um veículo, uma “uberização" das residências pode ganhar tração no pós-pandemia. “Esse conceito de moradia como serviço era uma tendência recente e está sendo acelerada pela covid-19, porque as pessoas tenderão a evitar se comprometer com financiamentos longos”, diz.
Nessa nova era de hábitos mais reclusos, os projetos da incorporadora vão acrescentar facilidades para o “honre Office”. “Todos os nosso prédios já tinham espaços de co-working, mas agora a tendência é ter salas de trabalho individuais em lugar de espaços compartilhados”, diz Frankel.
“O mesmo conceito vale para academias, que podem se transformar em estúdios de treinamento individual. Já temos projetos novos saindo com dez estúdios de fitness usados de forma individual. Além disso, haverá muitas tendências com foco em praticidade, como no caso de delivery, por exemplo, os prédios vão ter aeroporto de ‘drones’, para entregas de compras por veículos não tripulados, e armários de deliveiy para não ter contato com o entregador.”
A tendência de crescimento do “honre Office” após a pande-mia, porém, não significa um esvaziamento de escritórios, acreditam os gestores. “Acho que será um movimento não tão relevante quanto muita gente pensa a ponto de mudar o mercado”, diz Malheiros, da Habitat.
Para Bagnariolli, da Mauá Capital, a taxa natural de absorção da capital paulista compensaria uma eventual migração de escritórios para as residências. Segundo o especialista, em dois anos a demanda natural da cidade de São Paulo seria capaz de neutralizar o movimento. Nos cálculos dele, a absorção líquida de espaços comerciais na capital paulista tem sido da ordem de 400 mil metros quadrados anuais na média recente. Se um contingente de 20% dos profissionais na cidade de São Paulo adotar o trabalho remoto, haveria uma liberação de cerca de 700 mil m² em escritórios, que pode ser absorvido em menos de dois anos.
Na avaliação de Almendra, da RBR, o segmento de lajes corporativas de padrão triplo “A”, especialmente, mostra-se resiliente à crise e às mudanças comporta-mentais. Para o gestor, os prédios de padrão mais elevado tendem a manter os inquilinos, em sua maioria, grandes empresas, que vão conseguir passar pela turbulência com danos controlados.
As corporações, no geral, manteriam os espaços atuais, mas com menos pessoas. “Com a pandemia, tem uma tendência de um menor adensamento do escritório, ou seja, haverá menos profissionais nos espaços por metro quadrado do que antes e isso faz com que o efeito do honre office seja compensado.”
Sob a ótica dos fundos imobiliários, no curto e médio prazos, já é possível identificar vencedores e perdedores. Especialistas do setor veem algumas das estrelas do ano passado caírem por terra por conta das medidas de contenção da covid-19, caso de shopping e hotelaria.
O segmento de shoppings, por exemplo, que brilhava nos portfólios até o começo do ano diante da perspectiva de retomada da atividade econômica, perdeu as asas no período de isolamento forçado.
Sem circulação de pessoas, os centros comerciais amargam queda repentina e profunda de receitas de locação e ainda enfrentam um processo de renegociação dos valores de aluguéis para evitar uma quebradeira generalizada de lojas.
Mesmo após o fim da crise, os gestores se mostram cautelosos.
“No caso dos shoppings, a recuperação vai ser mais lenta porque tem muito lojista que não vai ter fôlego para bancar o aluguel e a vacância vai aumentar”, diz a diretora de fundos imobiliários da Rio Bravo, Anita Seal.
Além de aumento de espaços vazios nos centros comerciais, os próprios consumidores tendem a visitar menos os locais. “A circulação nos shoppings deve se reduzir [após a pandemia] porque as pessoas vão ter um certo receio de frequentar”, diz o CEO da Habitat, Eduardo Malheiros.
Outro segmento muito atingido pela covid-19, os hotéis também sofrerão com recuperação lenta após o fim da crise de saúde. “Acho que um dos maiores perdedores da pandemia é o segmento de hotelaria”, diz o sócio e diretor de risco e relações com investidores da Hectare, André Catrocchio. “Não há muita certeza como vai funcionar a volta do turismo e a ocupação dos estabelecimentos é um ponto de interrogação.”
Já entre os vencedores, dois segmentos despontam como os mais promissores: logística e residencial. O primeiro vinha em uma tendência de crescimento impulsionado pelo comércio eletrônico. Na era do isolamento social, a demanda por compras pela internet se acelerou e trouxe a reboque o interesse pelos fundos com carteira de galpões e outros ativos de logística.
Nesse cenário, muitas redes de varejo passaram a acelerar o investimento no e-commerce e até os pequenos negócios veem o “delivery” como solução para parte da queda de receitas. Com isso a necessidade de empreendimentos logísticos para armazenagem e distribuição tem subido.
Para Anita, da Rio Bravo, a perspectiva mais promissora é verdade especialmente para fundos com propriedades logísticas dentro dos grandes centros ou nas proximidades das vias de acesso dos maiores mercados. “Os fundos que tiverem ativos no ‘last rnile’ [centros de distribuição perto das cidades para entregas rápidas] estão se beneficiando do aumento do e-com-merce e tendem a manter os rendimentos estáveis ou aumentá-los.”
Após a crise, um segmento que até o momento reúne pouquíssimos portfólios, o residencial, pode se tornar uma estrela em ascensão, por conta do déficit habitacional, e que agora ficou viável por causa do nível da taxa de juros, afirma o gestor dos fundos imobiliários da Mauá Capital, Brunno Bagnariolli.
“Para o residencial funcionar a taxa de remuneração do aluguel tem de ser maior do que a taxa de juros da economia e isso no Brasil até pouco tempo não era verdade”, diz. Com a queda da Selic para o menor nível histórico e a perspectiva de se manter em um dígito no longo prazo, o investimento em fundos residenciais, com objetivo de renda, se torna possível.
O residencial ainda vai se beneficiar nos próximos anos de outros dois fatores: a pressão demográfica e o descasamento de oferta e procura. De acordo com o CEO da TG Core, Diego Siqueira, o crescimento natural da população brasileira cria uma necessidade de 1,5 milhão de novas residências por ano. “Mas produzimos em torno de 500 mil a 600 mil por ano, ou seja, temos um déficit habitacional crescente.”
A pandemia paralisou os lançamentos imobiliários, além das obras de projetos em andamento. Essa parada vai acentuar ainda mais o descompasso entre o aumento orgânico da demanda após a crise e a falta de imóveis entregues pelas incorporadoras, apontam os gestores.
“O mercado imobiliário está paralisado e, embora a perspectiva seja de que o país vá enfrenta ruma recessão fortíssima, a oferta de imóveis em São Paulo, por exemplo, já está baixa”, diz o CEO da RBR, Ricardo Almendra. “Tanto para residencial, escritórios e galpões hoje tem muito menos oferta do que tinha em 2014 e 2016. E isso tira pressão de queda sobre os preços durante a crise. Nos próximos anos, em meio à retomada, o mercado imobiliário não terá tempo para entregar todos os imóveis que os consumidores vão demandar."
O residencial também tem a tendência de passar por transformações devido à mudança de hábitos, em que muita gente vai passar mais tempo em casa, seja a trabalho ou devido a uma cautela em relação a aglomerações. Ele conta que a RBR tem um fundo que investe em prédios residenciais em Nova York, nos EUA, em que compra propriedades e reforma. “Em um dos nossos projetos, houve demanda para transformar os depósitos que cada unidade têm em escritórios. Foi a primeira adaptação no meio da pandemia com a ideia que a pessoa possa ter opção de trabalhar em casa, seja de maneira definitiva ou temporária.”
O CEO da Vitacon, Alexandre Frankel, vai além e enxerga um potencial para uma transformação radical no mercado,acelerada pela pandemia. Em sua visão, grande parte das moradias vai pertencera fundos ou investidores e as pessoas vão consumir a residência como um serviço, de modo semelhante ao que ocorreu após o surgimento dos aplicativos de transporte.
Assim como um número crescente de motoristas passou a deixar os carros na garagem ou nem mesmo ter um veículo, uma “uberização" das residências pode ganhar tração no pós-pandemia. “Esse conceito de moradia como serviço era uma tendência recente e está sendo acelerada pela covid-19, porque as pessoas tenderão a evitar se comprometer com financiamentos longos”, diz.
Nessa nova era de hábitos mais reclusos, os projetos da incorporadora vão acrescentar facilidades para o “honre Office”. “Todos os nosso prédios já tinham espaços de co-working, mas agora a tendência é ter salas de trabalho individuais em lugar de espaços compartilhados”, diz Frankel.
“O mesmo conceito vale para academias, que podem se transformar em estúdios de treinamento individual. Já temos projetos novos saindo com dez estúdios de fitness usados de forma individual. Além disso, haverá muitas tendências com foco em praticidade, como no caso de delivery, por exemplo, os prédios vão ter aeroporto de ‘drones’, para entregas de compras por veículos não tripulados, e armários de deliveiy para não ter contato com o entregador.”
A tendência de crescimento do “honre Office” após a pande-mia, porém, não significa um esvaziamento de escritórios, acreditam os gestores. “Acho que será um movimento não tão relevante quanto muita gente pensa a ponto de mudar o mercado”, diz Malheiros, da Habitat.
Para Bagnariolli, da Mauá Capital, a taxa natural de absorção da capital paulista compensaria uma eventual migração de escritórios para as residências. Segundo o especialista, em dois anos a demanda natural da cidade de São Paulo seria capaz de neutralizar o movimento. Nos cálculos dele, a absorção líquida de espaços comerciais na capital paulista tem sido da ordem de 400 mil metros quadrados anuais na média recente. Se um contingente de 20% dos profissionais na cidade de São Paulo adotar o trabalho remoto, haveria uma liberação de cerca de 700 mil m² em escritórios, que pode ser absorvido em menos de dois anos.
Na avaliação de Almendra, da RBR, o segmento de lajes corporativas de padrão triplo “A”, especialmente, mostra-se resiliente à crise e às mudanças comporta-mentais. Para o gestor, os prédios de padrão mais elevado tendem a manter os inquilinos, em sua maioria, grandes empresas, que vão conseguir passar pela turbulência com danos controlados.
As corporações, no geral, manteriam os espaços atuais, mas com menos pessoas. “Com a pandemia, tem uma tendência de um menor adensamento do escritório, ou seja, haverá menos profissionais nos espaços por metro quadrado do que antes e isso faz com que o efeito do honre office seja compensado.”
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