SÉRGIO CIMERMAN - Corrida pela vacina
Quarta-feira, 1 de Julho de 2020
O Estado de S. Paulo / Metrópole
SÉRGIO CIMERMAN
Vacinas são, por definição, uma suspensão de microrganismos vivos atenuados ou mortos (bactérias e vírus) ou fração deles, administradas para induzir imunidade e assim prevenir doenças infecciosas. A maioria das vacinas tem seu desenvolvimento entre 5 e 20 anos para aplicabilidade em humanos e, assim, alcançar os resultados esperados. Isso foi evidenciado no caso de HPV, sarampo, poliomielite, dentre tantas outras. Mas há uma quantidade enorme de tentativas em descobrir uma vacina para HIV desde sua descoberta na década de 1980. Ainda esperamos e até agora há apenas drogas terapêuticas, que têm se mostrado efetivas.
Atentem para as dificuldades. Nosso Programa Nacional de Imunização (PNI) é um dos mais respeitados em nível mundial e oferta, gratuitamente, inúmeras vacinas. Com isso, diminuímos muitas infecções entre nós desde o nascimento. Mas, neste momento de pandemia, vivenciamos mortes em números expressivos e sem dispor de tratamentos eficazes, o que leva o pânico a parte da população que dispõe só das medidas de distanciamento social, máscaras e higienização das mãos para combater o novo vírus.
Há uma luz no horizonte: em junho houve coletiva de imprensa do governo de São Paulo sobre o acordo da vacina do laboratório chinês Sinovac-Biotech e o Instituto Butantã. Isso ocorrerá na fase 3, a mais importante do ponto de vista de eficácia e segurança. Não podemos inferir a certeza de sucesso, mas vemos a necessidade de se testes em voluntários sadios para que se possa alcançar índices superiores a 85% de eficácia e, assim, imunizar boa parte da população mundial.
Os critérios de inclusão estão sendo definidos junto aos centros investigadores, mas antes há processos, como aprovação junto à Anvisa e à Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) para que todas as formalidades sejam concretizadas e iniciemos a busca pelos 9 mil voluntários. Podemos adiantar que a administração deverá ser em duas doses, com intervalo de 14 dias, se levar em conta as duas fases prévias feitas na China. Nessas fases, os índices superaram 90% de eficácia. Se foram espelhados na fase 3 teremos sucesso em tempo recorde.
Há mais de cem estudos clínicos de vacinas de covid-19 em desenvolvimento, diz a Organização Mundial de Saúde (OMS). Esta vacina é uma das dez no mundo com chances reais de dar certo. Em fase 3, só esta e a da Universidade de Oxford em parceria com a Federal de São Paulo, que já inicia o recrutamento de 2 mil voluntários. Dentre os voluntários, deverão ser escolhidos prioritariamente profissionais da saúde na linha de frente da covid-19 em São Paulo e Rio.
Há diferenças de tecnologia: a do Butantã será de vírus inativado (modificado com partículas químicas ou calor, de tal modo que se torna incapaz de causar infecção) e terá investimento em torno de R$ 85 milhões. A outra vacina, que tem apoio da Fundação Lemann e teve anunciados também pelo governo federal investimentos dias atrás, considera no caso o uso de vetor viral não replicante (vírus como adenovírus é geneticamente modificado para produzir proteínas do coronavírus sendo enfraquecido e não causando doença). A semelhança é o término previsto para o primeiro semestre de 2021.
Temos de apoiar esses estudos e não criar conflitos políticos de qual será melhor ou pior. Temos de pensar na população, a despeito de vontades partidárias. Não podemos misturar política com saúde. Enquanto os resultados não são publicados, não devemos baixar a guarda e sim intensificar medidas preventivas. Vamos aguardar com ansiedade os resultados e, assim, colocar o Brasil no cenário mundial de pesquisa e desenvolvimento da ciência e o melhor de tudo: salvar vidas e retorno ao nosso cotidiano com segurança. Que a corrida da vacina seja promissora, efetiva e coroada de êxitos.
"Temos de pensar na população a despeito de vontades partidárias"
COORDENADOR CIENTÍFICO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE INFECTOLOGIA
Quarta-feira, 1 de Julho de 2020
O Estado de S. Paulo / Metrópole
SÉRGIO CIMERMAN
Vacinas são, por definição, uma suspensão de microrganismos vivos atenuados ou mortos (bactérias e vírus) ou fração deles, administradas para induzir imunidade e assim prevenir doenças infecciosas. A maioria das vacinas tem seu desenvolvimento entre 5 e 20 anos para aplicabilidade em humanos e, assim, alcançar os resultados esperados. Isso foi evidenciado no caso de HPV, sarampo, poliomielite, dentre tantas outras. Mas há uma quantidade enorme de tentativas em descobrir uma vacina para HIV desde sua descoberta na década de 1980. Ainda esperamos e até agora há apenas drogas terapêuticas, que têm se mostrado efetivas.
Atentem para as dificuldades. Nosso Programa Nacional de Imunização (PNI) é um dos mais respeitados em nível mundial e oferta, gratuitamente, inúmeras vacinas. Com isso, diminuímos muitas infecções entre nós desde o nascimento. Mas, neste momento de pandemia, vivenciamos mortes em números expressivos e sem dispor de tratamentos eficazes, o que leva o pânico a parte da população que dispõe só das medidas de distanciamento social, máscaras e higienização das mãos para combater o novo vírus.
Há uma luz no horizonte: em junho houve coletiva de imprensa do governo de São Paulo sobre o acordo da vacina do laboratório chinês Sinovac-Biotech e o Instituto Butantã. Isso ocorrerá na fase 3, a mais importante do ponto de vista de eficácia e segurança. Não podemos inferir a certeza de sucesso, mas vemos a necessidade de se testes em voluntários sadios para que se possa alcançar índices superiores a 85% de eficácia e, assim, imunizar boa parte da população mundial.
Os critérios de inclusão estão sendo definidos junto aos centros investigadores, mas antes há processos, como aprovação junto à Anvisa e à Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) para que todas as formalidades sejam concretizadas e iniciemos a busca pelos 9 mil voluntários. Podemos adiantar que a administração deverá ser em duas doses, com intervalo de 14 dias, se levar em conta as duas fases prévias feitas na China. Nessas fases, os índices superaram 90% de eficácia. Se foram espelhados na fase 3 teremos sucesso em tempo recorde.
Há mais de cem estudos clínicos de vacinas de covid-19 em desenvolvimento, diz a Organização Mundial de Saúde (OMS). Esta vacina é uma das dez no mundo com chances reais de dar certo. Em fase 3, só esta e a da Universidade de Oxford em parceria com a Federal de São Paulo, que já inicia o recrutamento de 2 mil voluntários. Dentre os voluntários, deverão ser escolhidos prioritariamente profissionais da saúde na linha de frente da covid-19 em São Paulo e Rio.
Há diferenças de tecnologia: a do Butantã será de vírus inativado (modificado com partículas químicas ou calor, de tal modo que se torna incapaz de causar infecção) e terá investimento em torno de R$ 85 milhões. A outra vacina, que tem apoio da Fundação Lemann e teve anunciados também pelo governo federal investimentos dias atrás, considera no caso o uso de vetor viral não replicante (vírus como adenovírus é geneticamente modificado para produzir proteínas do coronavírus sendo enfraquecido e não causando doença). A semelhança é o término previsto para o primeiro semestre de 2021.
Temos de apoiar esses estudos e não criar conflitos políticos de qual será melhor ou pior. Temos de pensar na população, a despeito de vontades partidárias. Não podemos misturar política com saúde. Enquanto os resultados não são publicados, não devemos baixar a guarda e sim intensificar medidas preventivas. Vamos aguardar com ansiedade os resultados e, assim, colocar o Brasil no cenário mundial de pesquisa e desenvolvimento da ciência e o melhor de tudo: salvar vidas e retorno ao nosso cotidiano com segurança. Que a corrida da vacina seja promissora, efetiva e coroada de êxitos.
"Temos de pensar na população a despeito de vontades partidárias"
COORDENADOR CIENTÍFICO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE INFECTOLOGIA
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