Luiz Carlos Mendonça de Barros - Olhando com otimismo para 2021
Segunda-feira, 27 de Abril de 2020 - 00:18
Estamos entrando em uma segunda fase da crise mundial provocada pela covid-19, com os efeitos da quarentena social chegando de forma agressiva às economias nacionais. O primeiro impacto, provocado pelo pânico que atingiu investidores e instituições financeiras no mundo todo, está controlado pela ação conjunta dos bancos centrais. A lição de 2008 foi aprendida e desta vez o protocolo definido após 2008 não foi só rapidamente aplicado, como expandido por outras medidas ainda mais heterodoxas.
Para o enfrentamento desta segunda fase as lições do passado não foram suficientes pela natureza diferente do choque negativo que atingiu simultaneamente a operação de empresas e a renda dos salários de trabalhadores e arrecadação de impostos dos governos. Felizmente a leitura deste choque feito por economistas e governos nacionais foi rápida e correta ao identificar o verdadeiro apagão de renda que iria ocorrer nas economias de mercado pelo tempo em que o afastamento social durasse. Em pouco tempo construía-se um protocolo de natureza keynesiana para enfrentar a recessão que se seguiria.
As aprovações das medidas deste protocolo estão ainda em andamento na maioria das democracias, mas será uma questão de tempo para que seja mitigado o impacto deflacionário que vamos sofrer nos próximos meses evitando uma verdadeira depressão econômica. Os primeiros dados já conhecidos na Europa e Estados Unidos não deixam dúvidas sobre a intensidade da queda da atividade que vamos viver pelo menos até o terceiro trimestre deste ano. Queda de mais de 6% do PIB, em muitas das maiores democracias, não parece ser previsão muito pessimista.
Mesmo com uma visão otimista quanto ao controle da covid-19 — o que ocorreu na China e já está sendo visto nas maiores economias nos permite assim proceder — apenas na virada do ano é que teremos sinais mais claros de uma retomada da atividade econômica de caráter mundial. Mas ela vai ocorrer em cenário com um grande hiato do produto e com um quadro deflacionário preocupante. A China será uma exceção pelo sucesso obtido no controle da doença, e pela rapidez com que a atividade econômica está se normalizando. O FMI prevê um crescimento de 1,5% em 2020 seguido de uma expansão de 9% em 2021 em função de um programa de estímulos fiscais e monetários -— que certamente virá — como ocorreu em 2010.
Nos Estados Unidos, outro pilar da economia mundial, também chegaremos ao quarto trimestre deste ano com uma economia em recessão, mas com um hiato elevado do produto e um mercado de trabalho com bastante folga também. Mesmo com as incertezas de um novo presidente, podemos afirmar que haverá no Congresso um segundo grande esforço de estímulos fiscais para colocar a economia em uma rota mais clara de recuperação e uma redução do desemprego. Se estiver certo, teremos na virada do ano e durante 2021 as duas maiores economias do mundo lado a lado com uma volta do crescimento econômico.
Mesmo a Europa — sempre atrasada pela heterogeneidade política de seus membros—está para finalizar a implantação de uma ajuda fiscal via o chamado “multiannual financial framework (MFF)” com mais de US$ 1 trilhão de recursos como afirmou recentemente Úrsula von der Leyen, presidente atual da Comissão Europeia. Estes recursos vão certamente acelerar a recuperação econômica dos países em maior dificuldade como Espanha, Itália, Grécia e do Leste europeu. Desta forma as três maiores economias do mundo devem—ao longo do quarto trimestre — entrar em um ciclo de crescimento positivo garantindo para o mundo emergente uma condição de — embora mais lentamente—sair da armadilha da recessão ao qual estão hoje destinados.
Neste cenário de crescimento com políticas monetárias extremamente expansionistas — e, portanto, com juros reais muito baixos — lentamente parte dos capitais internacionais que fugiram para os EUA ao longo dos últimos meses voltarão a se posicionar, como sempre aconteceu no passado, no mundo emergente. Neste cenário o Brasil deve receber um empuxo externo via as exportações de commodities e a volta do investimento estrangeiro principalmente no setor de infraestrutura, viabilizando novamente o ambicioso processo de privatizações atualmente em stand by no governo Bolsonaro. Os dados da conta corrente e da entrada de investimento estrangeiro de março último já mostram o início deste processo.
Sei que serei chamado de otimista com este meu modelo para a evolução da economia mundial e brasileira em 2021, mas apenas repliquei nesta coluna o que acompanhei no passado quando acontece um alinhamento de dimensão mundial do início de um ciclo econômico de crescimento. Mercado de trabalho sem tensões, preços das principais commodities também em seu ciclo de baixa — o que garante um mundo sem inflação — combinados com uma imensa liquidez ao nível mundial serão incentivos suficientes para que os traumas e efeitos colaterais sofridos por empresas e consumidores sejam substituídos por expectativas mais favoráveis.
Ficará apenas — para ser tratado mais a frente com a volta do crescimento econômico — um aumento generalizado do endividamento dos governos centrais, a começar pelos Estados Unidos. Neste sentido serão os países emergentes como o Brasil que vão precisar de um programa do estilo defendido por Keynes em 1940 em seu extraordinário texto chamado “ How to pay for the War”.
"As três maiores economias entrarão em ciclo de crescimento, e garantindo a emergentes a saída da recessão"
Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é presidente do Conselho da Foton Brasil. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações.
Escreve mensalmente às segundas
Para o enfrentamento desta segunda fase as lições do passado não foram suficientes pela natureza diferente do choque negativo que atingiu simultaneamente a operação de empresas e a renda dos salários de trabalhadores e arrecadação de impostos dos governos. Felizmente a leitura deste choque feito por economistas e governos nacionais foi rápida e correta ao identificar o verdadeiro apagão de renda que iria ocorrer nas economias de mercado pelo tempo em que o afastamento social durasse. Em pouco tempo construía-se um protocolo de natureza keynesiana para enfrentar a recessão que se seguiria.
As aprovações das medidas deste protocolo estão ainda em andamento na maioria das democracias, mas será uma questão de tempo para que seja mitigado o impacto deflacionário que vamos sofrer nos próximos meses evitando uma verdadeira depressão econômica. Os primeiros dados já conhecidos na Europa e Estados Unidos não deixam dúvidas sobre a intensidade da queda da atividade que vamos viver pelo menos até o terceiro trimestre deste ano. Queda de mais de 6% do PIB, em muitas das maiores democracias, não parece ser previsão muito pessimista.
Mesmo com uma visão otimista quanto ao controle da covid-19 — o que ocorreu na China e já está sendo visto nas maiores economias nos permite assim proceder — apenas na virada do ano é que teremos sinais mais claros de uma retomada da atividade econômica de caráter mundial. Mas ela vai ocorrer em cenário com um grande hiato do produto e com um quadro deflacionário preocupante. A China será uma exceção pelo sucesso obtido no controle da doença, e pela rapidez com que a atividade econômica está se normalizando. O FMI prevê um crescimento de 1,5% em 2020 seguido de uma expansão de 9% em 2021 em função de um programa de estímulos fiscais e monetários -— que certamente virá — como ocorreu em 2010.
Nos Estados Unidos, outro pilar da economia mundial, também chegaremos ao quarto trimestre deste ano com uma economia em recessão, mas com um hiato elevado do produto e um mercado de trabalho com bastante folga também. Mesmo com as incertezas de um novo presidente, podemos afirmar que haverá no Congresso um segundo grande esforço de estímulos fiscais para colocar a economia em uma rota mais clara de recuperação e uma redução do desemprego. Se estiver certo, teremos na virada do ano e durante 2021 as duas maiores economias do mundo lado a lado com uma volta do crescimento econômico.
Mesmo a Europa — sempre atrasada pela heterogeneidade política de seus membros—está para finalizar a implantação de uma ajuda fiscal via o chamado “multiannual financial framework (MFF)” com mais de US$ 1 trilhão de recursos como afirmou recentemente Úrsula von der Leyen, presidente atual da Comissão Europeia. Estes recursos vão certamente acelerar a recuperação econômica dos países em maior dificuldade como Espanha, Itália, Grécia e do Leste europeu. Desta forma as três maiores economias do mundo devem—ao longo do quarto trimestre — entrar em um ciclo de crescimento positivo garantindo para o mundo emergente uma condição de — embora mais lentamente—sair da armadilha da recessão ao qual estão hoje destinados.
Neste cenário de crescimento com políticas monetárias extremamente expansionistas — e, portanto, com juros reais muito baixos — lentamente parte dos capitais internacionais que fugiram para os EUA ao longo dos últimos meses voltarão a se posicionar, como sempre aconteceu no passado, no mundo emergente. Neste cenário o Brasil deve receber um empuxo externo via as exportações de commodities e a volta do investimento estrangeiro principalmente no setor de infraestrutura, viabilizando novamente o ambicioso processo de privatizações atualmente em stand by no governo Bolsonaro. Os dados da conta corrente e da entrada de investimento estrangeiro de março último já mostram o início deste processo.
Sei que serei chamado de otimista com este meu modelo para a evolução da economia mundial e brasileira em 2021, mas apenas repliquei nesta coluna o que acompanhei no passado quando acontece um alinhamento de dimensão mundial do início de um ciclo econômico de crescimento. Mercado de trabalho sem tensões, preços das principais commodities também em seu ciclo de baixa — o que garante um mundo sem inflação — combinados com uma imensa liquidez ao nível mundial serão incentivos suficientes para que os traumas e efeitos colaterais sofridos por empresas e consumidores sejam substituídos por expectativas mais favoráveis.
Ficará apenas — para ser tratado mais a frente com a volta do crescimento econômico — um aumento generalizado do endividamento dos governos centrais, a começar pelos Estados Unidos. Neste sentido serão os países emergentes como o Brasil que vão precisar de um programa do estilo defendido por Keynes em 1940 em seu extraordinário texto chamado “ How to pay for the War”.
"As três maiores economias entrarão em ciclo de crescimento, e garantindo a emergentes a saída da recessão"
Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é presidente do Conselho da Foton Brasil. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações.
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