Vinte e sete enunciados sobre a oportunidade de desmontar o
mecanismo de exploração da sociedade brasileira
1) Na base do sistema político brasileiro opera um mecanismo
de exploração da sociedade por quadrilhas formadas por fornecedores do estado e
grandes partidos políticos. (Em meu ultimo artigo, intitulado Desobediência
Civil, descrevi como este mecanismo exploratório opera. A diante me refiro a
ele apenas como “o mecanismo”.)
2) O mecanismo opera em todas as esferas do setor público:
no legislativo, no executivo, no governo federal, nos estados e nos municípios.
3) No executivo ele opera via o superfaturamento de obras e
de serviços prestados ao estado e as empresas estatais.
4) No legislativo ele opera via a formulação de legislações
que dão vantagens indevidas a grupos empresariais dispostos a pagar por elas.
5) O mecanismo existe a revelia da ideologia.
6) O mecanismo viabilizou a eleição de todos os governos
brasileiros desde a retomada das eleições diretas, sejam eles de esquerda ou de
direita.
7) Foi o mecanismo quem elegeu o PMDB, o DEM, o PSDB e o PT.
Foi o mecanismo quem elegeu José Sarney, Fernando Collor de Mello, Itamar
Franco, Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff e
Michel Temer.
8) No sistema político brasileiro a ideologia está limitada
pelo mecanismo: ela pode balizar politicas públicas, mas somente quando estas
políticas não interferem com o funcionamento do mecanismo.
9) O mecanismo opera uma seleção: políticos que não aderem a
ele tem poucos recursos para fazer campanhas eleitorais e raramente são
eleitos.
10) A seleção operada pelo mecanismo é ética e moral: políticos
que tem valores incompatíveis com a corrupção tendem a serem eliminados do
sistema politico brasileiro pelo mecanismo.
11) O mecanismo impõe uma barreira para a entrada de pessoas
inteligentes e honestas na política nacional, posto que as pessoas inteligentes
entendem como ele funciona e as pessoas honestas não o aceitam.
12) A maioria dos políticos brasileiros tem baixos padrões
morais e éticos. (Não se sabe se isto decorre do mecanismo, ou se o mecanismo
decorre disto. Sabe-se, todavia, que na vigência do mecanismo este sempre será
o caso.)
13) A administração pública brasileira se constitui a partir
de acordos relativos a repartição dos recursos desviados pelo mecanismo.
14) Um político que chega ao poder pode fazer mudanças
administrativas no país, mas somente quando estas mudanças não colocam em
cheque o funcionamento do mecanismo.
15) Um político honesto que porventura chegue ao poder e
tente fazer mudanças administrativas e legais que vão contra o mecanismo terá
contra ele a maioria dos membros da sua classe.
16) A eficiência e a transparência estão em contradição com
o mecanismo.
17) Resulta daí que na vigência do mecanismo o estado
brasileiro jamais poderá ser eficiente no controle dos gastos públicos.
18) As políticas econômicas e as práticas administrativas
que levam ao crescimento econômico sustentável são, portanto, incompatíveis com
o mecanismo, que tende a gerar um estado cronicamente deficitário.
19) Embora o mecanismo não possa conviver com um estado
eficiente, ele também não pode deixar o estado falir. Se o estado falir o
mecanismo morre.
20) A combinação destes dois fatores faz com que a economia
brasileira tenha períodos de crescimento baixos, seguidos de crise fiscal,
seguidos ajustes que visam conter os gastos públicos, seguidos de novos
períodos de crescimento baixo, seguidos de nova crise fiscal...
21) Como as leis são feitas por congressistas corruptos, e
os magistrados das cortes superiores são indicados por políticos eleitos pelo
mecanismo, é natural que tanto a lei quanto os magistrados das instâncias
superiores tendam a ser lenientes com a corrupção. (Pense no foro privilegiado.
Pense no fato de que apesar de mais de 500 parlamentares terem sido
investigados pelo STF desde 1998,
a primeira condenação só tenha ocorrido em 2010.)
22) A operação Lava-Jato só foi possível por causa de uma
conjunção improvável de fatores: um governo extremamente incompetente e
fragilizado diante da derrocada econômica que causou, uma bobeada do parlamento
que não percebeu que a legislação que operacionalizou a delação premiada era
incompatível com o mecanismo, e o fato de que uma investigação potencialmente
explosiva caiu nas mãos de uma equipe de investigadores, procuradores e de
juízes rígida, competente e com bastante sorte.
23) Não é certo que a Lava-Jato vai promover o desmonte do
mecanismo. As forças politicas e jurídicas contrárias são significativas.
24) O Brasil atual esta sendo administrado por um grupo de
políticos especializados em operar o mecanismo, e que quer mantê-lo
funcionando.
25) O desmonte definitivo do mecanismo é mais importante
para o Brasil do que a estabilidade econômica de curto prazo.
26) Sem forte mobilização popular é improvável que a
Lava-Jato promova o desmonte do mecanismo.
27) Se o desmonte do mecanismo não decorrer da Lava-Jato, os
políticos vão alterar a lei, e o Brasil terá que conviver com o mecanismo por
um longo tempo.
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