domingo, 17 de setembro de 2017

Merkel no centro da Europa (Paula Bezerra, Isto É)

 16/9/17


A chanceler alemã pega carona nos resquícios do Brexit para aumentar a influência do país, transformar Frankfurt no centro financeiro europeu
No comando da Alemanha desde 2005, a cientista política Angela Merkel, nascida em Hamburgo, segunda maior cidade alemã, busca mais que a reeleição ao cargo de chanceler nas eleições marcadas para 24 de setembro. Com a saída do Reino Unido do bloco de integração regional, o chamado Brexit, Londres deixará de ser o hub financeiro do mercado europeu.
O Velho Continente está em busca de um novo endereço para receber o selo de “Autoridade Bancária Europeia”. Merkel quer grudá-lo em seu país para aumentar a influência política e econômica da Alemanha. “Estou altamente convencido de que Frankfurt tem um conjunto de combinações-chave para ser a melhor opção para sediar e deter a Autoridade Bancária Europeia”, afirmou, em nota, Wolfgang Schäuble, ministro das Finanças da Alemanha, após o país oficializar a candidatura junto ao Banco Central Europeu.
A cidade de Frankfurt como novo centro financeiro oficial do Continente é uma das apostas da campanha de Merkel, que lidera com folga as pesquisas de intenção de voto das eleições do país. O título do Banco Central Europeu pertence a Londres. A escolha será feita em meados de outubro pelo Banco Central Europeu e a cidade disputa o título com Paris (França), Amsterdã (Holanda), Dublin (Irlanda) e Luxemburgo. Mas o processo de escolha parece pender para os alemães. Frankfurt detém mais de 150 bancos internacionais e está entre as 10 maiores bolsas de valores do mundo. A cidade é responsável por movimentar mais de 90% do volume de negócios do mercado alemão, assim como a de grande parte do mercado europeu. Outro ponto que faz com que a cidade desponte como a preferida é o fato de ter a vida e aluguéis mais baratos do que a principal concorrente, Paris.
Além disso, ela abriga o terceiro maior aeroporto da Europa e conta com uma ampla infraestrutura de transporte. “Mesmo que os negociadores da UE procurem uma saída não prejudicial para o Reino Unido, o título do Banco Central Europeu terá de ir para outra cidade. No médio prazo, Frankfurt pode ser um contraponto a Londres”, diz Steve Priddy, diretor acadêmico e professor de MBA na GISMA Business School em Berlim. Desde o anúncio do Brexit pelos britânicos, em 2016, fundos imobiliários com volumes de aproximadamente 18 bilhões de libras esterlinas ficaram congelados à espera da decisão sobre o novo centro financeiro.
Além disso, empresas sediadas no distrito londrino The City anunciaram que se recolocariam em locais alternativos fora do Reino Unido. De lá para cá, cerca de dez bancos, como Morgan Stanley, Goldman Sachs, Standard Chartered, Daiwa, Sumitomo Mitsui and Nomura of Japan, VTB of Russia e Woori Bank of South Korea, escolheram a cidade alemã como a nova sede oficial de operação na União Europeia.
O americano Morgan Stanley, por exemplo, enviou um comunicado à imprensa afirmando que escolheu Frankfurt pois “em 2019, talvez não pudesse servir os negócios da UE fora de Londres. Para fazer isso, precisamos de um hub europeu, uma entidade regulada com capital e gerenciamento de riscos”. Desde julho, o banco solicita uma licença com a entidade regulatória alemã para que consiga comercializar na UE quando o Reino Unido deixar oficialmente o bloco. Antes dele, o Goldman Sachs iniciou a procura por escritórios em Frankfurt em junho, para servir como seu novo centro comercial dentro da UE. “Começamos a transferir recursos para Frankfurt e outras cidades europeias”, informou Richard Gnodde, presidente regional do banco. “A expectativa é que dobremos o número da equipe, onde atualmente empregamos 200 pessoas.” Na promessa de campanha, Merkel afirma querer entregar o pleno emprego no país até 2025, cortar impostos e trabalhar pela segurança, interna e externa.
Para alcançar esses objetivos, é fundamental para a Alemanha receber o selo oficial do mercado financeiro europeu. Um recente estudo elaborado pela Associação dos Bancos Estrangeiros na Alemanha mostra que o número de postos de trabalho adicionais no mercado financeiro da cidade seja de 3 mil a 5 mil, nos próximos três anos. Já um levantamento da instituição Otto Beisheim School of Management, em parceria com a Frankfurt Main Finance, publicado em agosto deste ano, indica que o número de vagas adicionais apenas nesse setor pode chegar a 10 mil nos próximos cinco anos, levando em consideração a migração das instituições americanas e japonesas. “Torna-se evidente que Frankfurt ganhará essa corrida, principalmente se olharmos em termos de novos empregos. Um dia após o anúncio do Brexit, as estimativas de novas vagas no mercado financeiro alemão eram altas”, explicaram os professores Lutz Johanning e Moritz C. Noll, da Otto Beisheim School of Management, no estudo.
Considerada umas das principais líderes globais da atualidade e a única capaz de se contrapor aos desmandos do americano Donald Trump, Merkel é aclamada pelos alemães, mesmo após 12 anos no poder. Cerca de 60% da população considera-se satisfeita com sua gestão segundo a última pesquisa divulgada no país. Já em intenção de voto, a candidata da União Democrata-Cristã (CDU, na sigla em alemão) permanece bem à frente de seus opositores, com quase 37% da preferência dos eleitores. Enquanto isso, seu principal opositor, Martin Schulz, do partido de centro-esquerda Social-Democrata, angariou 23% nas pesquisas, mesmo apontado como queridinho dos jovens e considerado a nova figura política da Alemanha “Angela Merkel ainda é a grande expressão política a se contrapor à figura de Trump”, diz Lilian Furquim de Campos Andrade, professora de economia internacional da Escola de Economia FGV. “A própria Europa busca por uma liderança firme assim.”

A Europa parece estar se recuperando do choque do Brexit, que irá se concretizar em 2019 e redesenhar a estrutura de integração da União Europeia. Um ano após a decisão dos britânicos, a sombra e o receio de que o nacionalismo e o protecionismo poderiam aprofundar a crise européia tem se dissipado. Embora partidos e líderes nacionalistas, como o de extrema direita Alternativa a Alemanha, que voltou ao cenário político do país depois de 60 anos adormecido, e figuras públicas como Marine Le Pen, do Frente Nacional, da França, e Geert Wilders, do Partido para Liberdade, da Holanda, tenham se fortalecido nos últimos tempos, partidos de centro e pró-União Europeia continuam no poder, acalmando, assim, o mercado financeiro e as projeções econômicas da região. Peça-chave para a estabilidade socioeconômica da integração é a líder alemã Angela Merkel, que tem como legado o aumento da influência e potência econômica da Alemanha. Atualmente, o PIB alemão soma U$ 3,5 trilhões, bem acima do da Grã-Bretanha, que totaliza US$ 2,6 trilhões e do da França, de US$ 2,5 trilhões.

@economia @Europa

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