quarta-feira, 24 de junho de 2020

Riscos na exploração de petróleo (Décio Oddone, 24 6 2020)



Décio Oddone: os riscos na exploração de petróleo e os regimes de contratação 


 Ao mesmo tempo em que voltam a surgir notícias sobre possíveis mudanças no sistema de oferta de áreas para exploração e produção, começam a ficar mais claros os desafios trazidos pela pandemia para a aprovação de novos projetos de petróleo e gás natural. Por isso, é importante considerar, nos debates, as características dos regimes de concessão e partilha da produção, como, por exemplo, a forma com que cada um trata as incertezas exploratórias, tema deste texto. As primeiras perfurações no pré-sal ajudaram a criar a expectativa de que não haveria risco geológico e que todos os poços na província seriam exitosos. A realidade é distinta. Possibilidades de fracasso, em maior ou menor grau, estão sempre presentes quando se busca hidrocarbonetos. Por mais promissora que seja a expectativa de descoberta, a presença de petróleo e gás em volumes comerciais em um reservatório só é confirmada através da perfuração de um poço, que custa milhões de reais. Antes disso, quantias elevadas também são despendidas em pesquisas geológicas e atividades de geofísica. Sem falar nos custos para adquirir o direito de explorar o bloco e em todos os outros gastos assumidos. Normalmente, somente entre 15 e 30% dos poços pioneiros (os primeiros perfurados em uma área) são bem sucedidos. No pré-sal, os percentuais têm sido bem maiores, mas, mesmo assim, houve alguns insucessos. A perfuração de um poço seco (sem hidrocarbonetos) não condena um bloco inteiro. Pode trazer informações que ajudem a melhorar a interpretação dos dados disponíveis e levar a outra perfuração exitosa. Como incertezas estão sempre associadas à exploração, é natural que as áreas mais promissoras sejam estudadas e recebam investimentos prioritariamente. E que, à medida que o número de perfurações pioneiras aumente, a possibilidade de haver poços secos cresça também. A indústria funciona dessa forma, independente do regime de contratação, se em concessão ou partilha. A diferença está nos riscos assumidos pelo poder concedente em cada regime. Na disputa por um contrato de concessão, a competição se dá no valor do bônus de assinatura e no compromisso mínimo de investimentos. O consórcio que oferecer a melhor combinação desses dois fatores, tipicamente a que apresenta o maior bônus, será o vencedor. Em caso de descoberta comercial, pagará royalties, participação especial, quando for o caso, e imposto de renda. Quanto mais eficientes forem as suas operações, maiores serão o lucro e o imposto de renda. Se um bloco não for produtivo, todos os investimentos, inclusive a quantia paga na assinatura, serão perdidos. O consórcio e os governos não terão receitas, mas a União terá maximizado o montante recebido antecipadamente pelo direito de exploração. Os contratos de partilha introduzem o conceito do lucro em óleo, que representa o volume em petróleo depois de descontados todos os investimentos e custos. Em um certame, o bônus de assinatura é fixo, de pagamento obrigatório, da mesma forma que o compromisso exploratório. Será declarado ganhador o participante que propuser o maior porcentual de lucro em óleo para o Estado. Havendo êxito, o consórcio operador também pagará royalties e imposto de renda. Não se busca maximizar os recursos recebidos antecipadamente, mas a parcela de participação na produção futura. Na hipótese de fracasso, não haverá os ingressos esperados. A União, além dos royalties e do imposto de renda, não receberá a sua parte em petróleo. Restará apenas a quantia paga para adquirir o bloco. Assim, nas rodadas de concessão, um possível ágio ocorre no bônus de assinatura, que pode estar acompanhado de uma oferta de maiores investimentos, antes de qualquer atividade exploratória. Quanto mais alto o valor ofertado, maior o risco assumido pelo consórcio. Nos certames de partilha, o ágio pode aparecer no porcentual de óleo lucro, que só será distribuído se houver volume a compartilhar. Nesses casos, o Estado assume um risco adicional, associado ao desenlace do projeto. Em resumo, nos leilões de concessão são maximizados o bônus de assinatura, principalmente, e os investimentos exploratórios na área, seja o projeto exitoso ou não. As licitações de partilha buscam incrementar a parcela de petróleo entregue à União, que só existirá em caso de sucesso. No entanto, a forma como o êxito exploratório afeta um contrato é apenas uma das características de cada um dos regimes adotados no Brasil. Há muitas outras, que devem ser avaliadas para definir qual o melhor caminho a seguir. Adicionalmente, é importante levar em consideração o grau de conhecimento dos blocos a serem ofertados e as condições que deverão estar presentes no mercado global no momento da oferta e da aprovação dos empreendimentos. E, principalmente, a carga fiscal esperada, que pode ser estabelecida no nível desejado e no grau de progressividade escolhido, qualquer que seja o modelo selecionado. Carga fiscal e progressividade na tributação que são mais importantes para manter a competitividade relativa do país que o próprio regime de contratação. Décio Fabrício Oddone da Costa é engenheiro. Trabalhou na Petrobras e no setor privado. Foi Diretor-Geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

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